Nova publicação do OCF: desafios e soluções para a conservação
No último mês o Observatório do Código Florestal lançou a publicação “Código Florestal nos biomas, desafios e soluções” que aborda as complexidades e desafios de conservação enfrentados pelos seis biomas brasileiros sob a ótica do Código Florestal, a Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012.
O conteúdo busca informar a sociedade e guiar a atuação dos membros do observatório em cada um dos biomas para o avanço da implementação do Código Florestal e foi elaborado a partir de discussões de especialistas em cada um dos biomas.
No capítulo intitulado “O Código Florestal e os desafios para a conservação no bioma Mata Atlântica” são apontados alguns desafios e soluções:
Desafio 1: Implementar e salvaguardar as legislações em vigor, em especial o Código Florestal e a Lei da Mata Atlântica.
É destacado que 50% dos alertas de desmatamento na Mata Atlântica desde 2018 ocorreram em Áreas de Preservação Permanente (APPs), sendo 90% desses alertas correspondem a desmatamentos ilegais. A urgência na implementação das leis de proteção, como o Código Florestal (CF) e a Lei da Mata Atlântica, é ressaltada devido à falta de efetividade na aplicação, atribuída à falta de vontade política e ataques às normas.
O CF de 2012 anistiou parte do desmatamento em áreas rurais consolidadas em APPs até julho de 2008, enquanto a Lei da Mata Atlântica estabeleceu a proteção de vegetações primárias e secundárias. Recentemente, o Ministério do Meio Ambiente acolheu um parecer da Advocacia Geral da União (AGU) defendendo a aplicabilidade de artigos do CF nas áreas da LMA, gerando um conflito legal.
A ação da AGU pode resultar na anistia de desmatamentos entre 1990 e 2008, enfraquecendo os mecanismos de proteção e aumentando o risco de desmatamento e degradação ambiental em áreas sensíveis da Mata Atlântica.
Solução 1.1: Resolver o conflito jurídico criado entre a Lei da Mata Atlântica e o Código Florestal
・Defesa da prevalência da Lei da Mata Atlântica com base no próprio ordenamento jurídico, como defendido pelos Ministérios Públicos Federal e Estaduais e sociedade civil organizada.
・Produção de conhecimento científico sobre os impactos do reconhecimento de áreas consolidadas em APPs na Mata Atlântica para embasar decisões jurídicas e sensibilizar a população
・A mobilização social indo além e questionando junto às cortes os atos praticados pelo poder público ou atores privados que sejam prejudiciais ao direito fundamental ao ambiente ecologicamente equilibrado, citando como exemplo a mobilização que a Apremavi participou com outras ONGs
Desafio 2: Engajar os municípios na proteção e recuperação de áreas degradadas na Mata Atlântica.
Os desafios para a conservação na Mata Atlântica são heterogeneamente distribuídos, com 23% dos municípios possuindo menos de 10% de habitat remanescente. Além disso, 100 municípios concentram 70% do desmatamento entre 2018 e 2019, evidenciando a necessidade de estratégias específicas para problemas locais na conservação do bioma.
Solução 2.1: Estimular o desenvolvimento dos Planos Municipais de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica (PMMA).
A Lei da Mata Atlântica (LMA) introduziu o Plano Municipal de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica (PMMA) como um instrumento pouco explorado, permitindo que os municípios personalizem a implementação da LMA de acordo com sua realidade. O PMMA abrange prioridades locais, incluindo conservação, licenciamento ambiental, restauração da vegetação, ações preventivas e envolvimento da comunidade, proporcionando uma oportunidade para parcerias público-privadas que se alinhem às agendas nacionais e globais de mudanças climáticas, conservação e restauração.
Desafio 3: Proteger os ecossistemas vulneráveis
Os campos de altitude, restingas e manguezais da Mata Atlântica enfrentam maior vulnerabilidade devido à pressão antrópica, falta de monitoramento efetivo, inação política na proteção e ataques constantes às normativas específicas. A Mata Atlântica, rica em biodiversidade adaptada a campos naturais e de altitude, enfrenta uma conversão acelerada dessas áreas, atribuída à dificuldade de monitoramento, confusão entre campos nativos e pastagens, além da desvalorização social dessas áreas, facilitando seu uso irregular.
A perda de proteção legal dos campos naturais, com a redução em 90% da área de topos de morro protegidas pelo Código Florestal de 2012, amplia os desafios de conservação nesses ecossistemas cruciais.
Restingas e manguezais, essenciais para combater a erosão costeira e enfrentar os impactos das mudanças climáticas, estão sob intensa pressão de conversão pelo setor imobiliário. Apesar das proteções legais estabelecidas pelo Código Florestal, Lei da Mata Atlântica e Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, bem como resoluções do CONAMA que garantiam medidas protetoras foram recentemente revogadas – como a faixa protetora de 300 metros para as restingas – destacando a instabilidade jurídica enfrentada pelos instrumentos de proteção às vegetações costeiras.
A mobilização social bem-sucedida, que reverteu a decisão no STF, destaca a importância da conscientização pública na defesa desses ecossistemas cruciais para a adaptação às mudanças climáticas e a preservação da costa, mas ilustra o regime de instabilidade jurídica a que os instrumentos de proteção às vegetações costeiras estão submetidos.
Solução 3.1: Aprimorar os instrumentos de proteção aos campos de altitude.
・Capacitação dos agentes de fiscalização e aprimoramento dos sistemas de monitoramento
・Sociedade civil mobilizada, em parceria com a academia e Ministérios Públicos deve pressionar o poder público pelo cumprimento da LMA nas áreas de campos nativos remanescentes e pela restauração ecológica daqueles em uso irregular
Solução 3.2: Assegurar a implementação dos instrumentos de proteção aos ambientes de restingas e manguezais.
・Salvaguarda de todos os instrumentos de proteção complementares ao CF, bem como a contínua mobilização social embasada na ciência e no interesse público.
・Implementação dos planos de gerenciamento costeiro estaduais e municipais também pode estabelecer áreas prioritárias de conservação das restingas.
O Observatório do Código Florestal
O Observatório do Código Florestal é uma rede criada em maio de 2013 para promover o controle social da implantação da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012 (Lei de Proteção da Vegetação Nativa do Brasil) e garantir integridade ambiental, social e econômica às florestas em áreas privadas. Em 2022, 43 organizações da sociedade civil fazem parte da rede e atuam em prol do objetivo comum de proteção, restauração e uso sustentável das florestas
Autora: Thamara Santos de Almeida, com informações do Observatório do Código Florestal
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto
Foto de capa: Parque Natural Municipal Mata Atlântica, localizado em Atalanta (SC), ©️ Wigold Schäffer