Estudo evidencia a atuação não violenta da sociedade civil
Concebido pela Escola de Ativismo, o Estudo “Não violência, princípios e práticas políticas da sociedade civil brasileira”, evidencia a visão e atuação da sociedade civil no combate aos diferentes tipos de violência.
A pesquisa foi planejada e executada entre os anos de 2021 e 2023, tendo ouvido 137 organizações da sociedade civil – incluindo a Apremavi – das mais diversas áreas de atuação e com presença em todas as regiões do país. Os resultados foram reunidos em uma publicação, que documenta diferentes interpretações do conceito de violência, como os tipos de violência que as organizações combatem, as formas como as OSCs reagem às violências sofridas e as diferentes noções e representações da ideia de não violência.
“53,3% das OSCs apontam “violência de gênero”, bem como 34,3% apontam ‘racismo e violência contra a população negra’. As pautas de gênero e raça estão também incorporadas quando se examina as práticas de equidade implementadas pelas OSCs e, junto com ‘respeito à natureza e justiça socioambiental’, também estão presentes no rol de valores e princípios das organizações. Embora em menor proporção, verifica-se o mesmo fenômeno quanto à luta por direitos LGBTQIAPN+” (Estudo “Não violência, princípios e práticas políticas da sociedade civil brasileira”, p. 195).
Gráfico sobre as violências praticadas contra as OSCs. Figura: adaptada do estudo “Não violência, princípios e práticas políticas da sociedade civil brasileira”.
Além disso, foram documentadas e analisadas as práticas das organizações em face do par violência/não violência, o posicionamento das OSCs diante de práticas mais ou menos “agressivas” e a não violência e o desafio do enfrentamento ao autoritarismo e à extrema-direita no Brasil. Já o último dos sete capítulos da publicação apresenta reflexões a partir do estudo, como a interseccionalidade de causas, a relevância política do debate sobre não violência e o combate da violência.
Confira algumas conclusões do estudo:
As OSCs brasileiras são não violentas – As organizações da sociedade civil brasileiras se entendem como não violentas. Do total de OSCs, 87,6% concordam em ser vistas como não violentas.
As OSCs brasileiras praticam a não violência – 73,7% das OSCs afirmam que suas práticas podem ser consideradas “totalmente” não violentas; outras 22,6%, que podem ser consideradas pelo menos “em parte” não violentas.
OSCs desaprovam táticas violentas – A tendência das OSCs é recusar as ações que podem ser lidas e enquadradas como violentas. O nível de aprovação (e adoção) de ações ou táticas de ação vai diminuindo à medida que percepção de violência associada a elas vai aumentando: quanto menos “violentas”, mais aprovação e aceitação; quanto mais “violentas”, menos aprovação e menos aceitação.
Rejeição da não violência – O Estudo registra que 6,6% das OSCs rejeitam a não violência.
OSCs atuam contra a violência – Todas as organizações e movimentos entrevistados, com apenas uma exceção, atuam contra a violência.
As organizações também sofrem violência – As OSCs não só precisam combater a violência como também são obrigadas a reagir e se defender da violência. Mais de 75% das organizações já sofreram algum tipo de violência em decorrência da sua atuação. As OSCs enfrentam e combatem a violência sofrida com práticas que não são violentas.
As duas perspectivas de não violência – Há duas perspectivas diferentes da noção e da prática da não violência entre as organizações da sociedade civil brasileira:
1. uma perspectiva empática/conciliatória – que se baseia na escuta, no diálogo e na resolução de conflitos pela via da produção de acordos; e
2. uma perspectiva pragmática/antagonista – que se orienta pela consecução dos objetivos políticos e enfrentamento dos conflitos, ainda que na impossibilidade do acordo ou na condição crítica do impasse.
A hipótese que deu origem ao estudo parece comprovada: as organizações da sociedade civil (OSCs) brasileiras se entendem como não violentas. Mas o Estudo, de caráter inédito no Brasil, aponta muitas outras questões relevantes para o ativismo brasileiro. Segundo Miriam Prochnow, os resultados mostram que a cultura da não violência é muito importante para as organizações e que elas entendem que conseguem desenvolver suas atividades dessa forma, mesmo convivendo em ambientes que muitas vezes não são nada harmoniosos: “o ativismo praticado com humor e às vezes com escracho traz resultados bem interessantes e em tempos de emergência climática essa talvez seja uma das formas mais eficientes de conscientização” complementa Miriam, que também representa a Apremavi junto a redes como o Observatório do Clima, a Rede de ONGs da Mata Atlântica e o Observatório do Código Florestal, que tem utilizado esse tipo de comunicação.
Por outro lado, o diálogo e busca pela construção de consenso também sempre foi uma estratégia utilizada pela Apremavi para promover soluções e atuar em rede pela conservação e restauração da Mata Atlântica. Iniciativas como o Diálogo Florestal brasileiro, o Pacto Pela Restauração da Mata Atlântica e a Coalizão Brasil, Clima, Florestas e Agricultura são espaços balizados por esses princípios construídos pela sociedade e que buscam catalisar iniciativas pelo desenvolvimento sustentável.
> Conheça a publicação Governança, Diálogo e Formação de Redes
Em uma realidade onde a violência se tornou disseminada e gravemente legitimada por segmentos da sociedade, o estudo é um insumo importante para organizações, movimentos e ativistas que buscam incidir politicamente na conjuntura brasileira de forma pacífica e democrática.
Lançamento do estudo
A Escola de Ativismo realizará o lançamento oficial da publicação nesta quarta-feira 14/08 às 19h no Espaço da Ação Educativa – R. General Jardim, 660, em São Paulo, SP. Durante o evento, serão apresentados os principais achados da pesquisa, seguidos por uma discussão enriquecedora com os convidados e participantes.
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Sobre a Escola de Ativismo
A Escola de Ativismo é um coletivo independente constituído em 2011 com a missão de fortalecer grupos ativistas por meio de processos de aprendizagem em estratégias e técnicas de ações não-violentas e criativas, campanhas, comunicação, mobilização e segurança e proteção integral, voltadas para a defesa da democracia e dos direitos humanos.
O coletivo é formado por um grupo multidisciplinar de ativistas, que se organiza de maneira distribuída e não hierárquica, por meio de princípios orientadores em diversas regiões do Brasil.
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Autores: Vitor L. Zanelatto, Cássio Martinho e Miriam Prochnow
Revisão: Thamara S. de Almeida
Foto de capa: Arquivo Apremavi