Como priorizar áreas para a restauração de ecossistemas?
Prioridade internacional, a restauração de ecossistemas e paisagens nos trópicos é essencial para a mitigação da emergência climática. Conheça as ferramentas para a priorização de territórios e articulação de atores locais que já estão disponíveis para auxiliar a ampliar a eficiência, a sustentabilidade e dar escala às iniciativas.
Nos próximos anos será preciso avançar rapidamente para impedir um colapso completo dos ecossistemas. A espécie humana, causadora da emergência climática, tem na restauração ecológica uma chance de neutralizar gases de efeito estufa (GEE) emitidos nas diversas atividades humanas, ao mesmo passo que recupera paisagens naturais degradadas, promovendo benefícios em nível local com retorno imediato.
É impossível quantificar todos os benefícios da restauração ecológica, que promove melhorias desde os elementos da Natureza, com a proteção do solo e dos cursos de água, por exemplo. Com a recomposição do habitat e conexão dos fragmentos de paisagens naturais do território, fauna, flora e funga podem se desenvolver e manter populações em índices naturais, afastando o risco de extinção de espécies. Já as Contribuições da Natureza para as Pessoas (CNP), como a água para o abastecimento, polinização de culturas agrícolas e o extrativismo sustentável das florestas são exemplos de benefícios diretos para as comunidades humanas.
Para que os amplos esforços previstos em acordos globais de conservação e desenvolvimento sustentável como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e as Contribuições Determinadas Nacionalmente (NDC) para o Acordo Climático de Paris produzam benefícios nessas diferentes dimensões, é preciso considerar, dentre todas as regiões da Terra, quais as áreas com maior potencial para iniciativas de restauração ecológica. Para tanto, é necessário promover uma análise do contexto local, dos recursos disponíveis e da projeção de retorno dos investimentos, considerando inclusive resultados econômicos.
Atendendo a essa demanda urgente, o Instituto Internacional para a Sustentabilidade (ISS) desenvolveu a plataforma PLANGEA. Fruto de dez anos de trabalho, a ferramenta permite a visualização de áreas prioritárias para ações de restauração e conservação de ecossistemas, estimando os benefícios e os custos para diferentes cenários. Atualmente, a visualização das áreas prioritárias pode ser realizada a partir de três filtros: conservação da biodiversidade, mitigação das mudanças climáticas e minimização de custos. Também é possível selecionar a escala espacial (global ou nacional) a ser considerada, que define se a meta percentual de áreas a serem restauradas ou conservadas é aplicada à área global total ou à área de cada país.
A priorização das áreas é realizada a partir de uma abordagem multicritério, aplicável a todos os biomas terrestres e capaz de estimar seus benefícios e custos. Detalhada em um artigo publicado na revista Nature, a metodologia permite afirmar que a restauração de 15% das terras convertidas em áreas prioritárias poderia evitar 60% das extinções esperadas, além da neutralização de 299 gigatoneladas de CO2, o que corresponde a 14% das emissões totais desde a Revolução Industrial.
Os principais fatores observados para definir as áreas prioritárias são:
・Conservação da biodiversidade (flora, fauna e funga);
・Mitigação das mudanças climáticas (sequestro de GEE);
・Minimização de custos de execução da restauração.
“As áreas prioritárias conjuntas para biodiversidade e clima estão concentradas em zonas úmidas e florestas tropicais e subtropicais com altos estoques de carbono, alta diversidade e perda acentuada de habitat natural, e geralmente estão localizadas em hotspots de biodiversidade”
O artigo que fornece o referencial teórico da PLANGEA também apresenta as duas principais limitações do modelo de análise: dados limitados sobre indicadores de biodiversidade e uso do solo. Isso evidencia a demanda pela produção e ampliação de pesquisas e atividades de monitoramento, através de políticas públicas, investimentos nas pesquisas desenvolvidas em universidades e a previsão dessa demanda em projetos de restauração executados pela sociedade civil.
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Outra pesquisa, liderada pelo professor e pesquisador Pedro Brancalion (ESALQ/USP) e publicada em 2019 na revista Science Advances concluiu que o estabelecimento de hubs (regiões prioritárias) de restauração pode permitir uma melhor otimização da infraestrutura de restauração e das cadeias de suprimentos de restauração, com a instalação de viveiros, capacitação e treinamento de profissionais para as atividades e desenvolvimento de produtos para atender a demanda, que deverá ser crescente. Também é destacado o potencial de redução de custos fixos, logística mais eficiente e promoção de governança eficaz para as iniciativas. O artigo também discute a importância de analisar a escala e contexto regional.
Esse último aspecto é elemento inegociável para a execução das ações. Não apenas para o planejamento de intervenções antrópicas no meio ambiente, como a conexão de fragmentos através da implementação de corredores ecológicos; mas também para que as comunidades humanas presentes no território sejam participantes ativas e tenham suas demandas e interesses considerados, sempre de acordo com os princípios do desenvolvimento sustentável.
Tendo apenas 28% de sua área original remanescente e reconhecida como hotspot de biodiversidade, a Mata Atlântica atualmente é um dos biomas prioritários para as atividades de recuperação de áreas degradadas. Na Década da Restauração de Ecossistemas da ONU, a Apremavi está dedicada em ampliar esforços e atuar em rede para restaurar florestas e desenvolver atividades econômicas sustentáveis a partir das demandas dos projetos
Os dados de áreas prioritárias apontam o melhor caminho para restaurar, mas é preciso de pessoas para fazer o trabalho. Por isso, é necessário promover a participação ativa da sociedade nos projetos de recuperação da biodiversidade, buscando apresentar os benefícios da recuperação ecológica, mas também observar e atender os interesses das comunidades locais de onde a restauração deve ocorrer.
A Apremavi procura incorporar objetivos visando benefícios sociais em seus projetos, como a difusão de metodologias para a implementação de atividades econômicas sustentáveis utilizando espécies nativas, promoção de redes de governança e tomada de decisão participativa e valorização dos conhecimentos e da cultura de cada território.
O Viveiro Jardim das Florestas produz mudas nativas para projetos de restauração da Apremavi e de outras organizações. Foto: Vitor L. Zanelatto.
Mapeamento de atores brasileiros
Desenvolvida pela Sociedade Brasileira de Restauração Ecológica (SOBRE) em parceria com o Pacto pela Mata Atlântica e Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, a plataforma “Vitrine da Restauração” disponibiliza informações de contato institucional organizadas por biomas, estados, municípios e papel desempenhado na cadeia da restauração. As buscas apresentam todos os atores que atuam na cadeia da restauração ecológica, como Organizações da Sociedade Civil que executam projetos, viveiros de mudas, institutos de pesquisa e universidades.
A SOBRE mantém um chamado permanente para que profissionais e organizações envolvidas em atividades de restauração no Brasil se cadastrem na plataforma, promovendo visibilidade e produção de dados diagnósticos sobre o progresso das atividades no país.
Essa ação está relacionada com os ODS:
Referências Bibliográficas
BRANCALION, Pedro H. S.; NIAMIR, Aidin; BROADBENT, Eben; CROUZEILLES, Renato; BARROS, Felipe S. M.; ZAMBRANO, Angelica M. Almeyda; BACCINI, Alessandro; ARONSON, James; GOETZ, Scott; REID, J. Leighton. Global restoration opportunities in tropical rainforest landscapes. Science Advances, [S.L.], v. 5, n. 7, 5 jul. 2019. American Association for the Advancement of Science (AAAS). http://dx.doi.org/10.1126/sciadv.aav3223.
INSTITUTO INTERNACIONAL PARA A SUSTENTABILIDADE (IIS). PLANGEA. 2023. Disponível em: https://map.plangea.earth/?abordagem=Restauração&country=all&escala=Global&meta=100&objetos=Minimização%20de%20custos&objetos=Mitigação%20de%20mudanças%20climáticas&objetos=Biodiversidade#. Acesso em: 25 abr. 2023.
MALHI, Yadvinder; GARDNER, Toby A.; GOLDSMITH, Gregory R.; SILMAN, Miles R.; ZELAZOWSKI, Przemyslaw. Tropical Forests in the Anthropocene. Annual Review Of Environment And Resources, [S.L.], v. 39, n. 1, p. 125-159, 17 out. 2014. Annual Reviews. http://dx.doi.org/10.1146/annurev-environ-030713-155141.
Autor: Vitor Lauro Zanelatto
Revisão: Carolina Schäffer e Thamara Santos de Almeida