Compromissos brasileiros para 2035: sugestões do Observatório do Clima para a segunda NDC do Acordo de Paris
As Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) são compromissos climáticos assumidos voluntariamente pelos países que aderiram ao Acordo de Paris. Cada país define suas metas de redução de emissões de gases de efeito estufa com base em suas capacidades e circunstâncias nacionais, para contribuir para o objetivo global de limitar o aumento da temperatura da Terra.
Esses compromissos são essenciais para o sucesso do acordo. Os países devem revisá-los e atualizá-los periodicamente, em ciclos de cinco ou dez anos, para aumentar a ambição e garantir o alinhamento com as metas climáticas globais. As NDCs funcionam como métricas para que todas os países colaborem com esse esforço global e, por esse motivo, os países vêm apresentando os seus planos nacionais para implementação das suas NDCs.
O Brasil, que ocupa a posição de sexto maior emissor de gases de efeito estufa globalmente, e que estará à frente da COP30 no próximo ano, tem a responsabilidade de submeter à ONU, até fevereiro, um plano climático nacional (NDC) robusto. Dentro dessa perspectiva, o Observatório do Clima, a partir da atuação das suas diversas organizações, preparou uma nova proposta para a Segunda Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do Brasil no âmbito do Acordo de Paris (2030-2035).
O documento aborda de forma abrangente e integrada os desafios climáticos. A seção de mitigação detalha as contribuições, a trajetória de emissões e o orçamento de carbono. Já o item “Respondendo aos impactos” abrange adaptação, resiliência, perdas e danos. O documento também explora os meios de implementação, justiça climática e transição justa, e questões relacionadas ao oceano e à zona costeira.
No âmbito da mitigação, o OC indica que o Brasil deve limitar suas emissões líquidas de gases de efeito estufa a 200 milhões de toneladas de CO2 equivalente em 2035, promovendo uma redução de 92% em relação aos níveis de emissão líquida de 2005, estimados em 2.440 milhões de toneladas pelo Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), do Observatório do Clima.
Para isso, o documento apresenta as metas que devem ser cumpridas por setor, muitas delas relacionadas a restauração e ao cumprimento do Código Florestal:
- Desmatamento: eliminar praticamente todo o desmatamento nos biomas até 2030, com uma taxa máxima de 100.000 hectares anuais.
- Restauração: restaurar 21 milhões de hectares de áreas degradadas até 2035, cumprindo o passivo do Código Florestal.
- Destinação de terras: Destinar 100% das terras públicas não-destinadas até 2035, transformando-as em áreas protegidas, terras indígenas, territórios quilombolas ou assentamentos de reforma agrária.
- Regularização fundiária: Concluir a análise e regularização das propriedades rurais no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e no Programa de Regularização Ambiental (PRA) até 2035.
As sugestões para adaptação e resiliência na NDC incluem o Plano Clima Adaptação, que servirá como base para as ações de adaptação no Brasil. O plano deve respeitar a legislação ambiental e de direitos humanos, com foco em combater o racismo ambiental e promover a equidade racial e de gênero. O Brasil se compromete a desenvolver cenários de avaliação de risco climático para infraestrutura, agropecuária e ecossistemas, e alinhar políticas públicas a esses objetivos, incluindo a modernização das infraestruturas industriais e investimentos em transporte público sustentável. O governo também garantirá o apoio técnico e financeiro para a implementação dessas estratégias em nível local, com ênfase na participação comunitária e na inclusão.
Adicionalmente, o país deve se comprometer em promover a preservação das áreas verdes urbanas, o desenvolvimento de sistemas de alerta precoce e a promoção de sistemas alimentares resilientes. As ações de adaptação também terão sinergia com as de mitigação, como a geração descentralizada de energia e a utilização de soluções baseadas na natureza para reduzir os impactos das mudanças climáticas.
O Brasil também priorizará o fortalecimento da defesa civil, a capacitação dos profissionais e a melhoria da infraestrutura crítica para enfrentar eventos climáticos extremos, além de garantir o atendimento integral da saúde pública diante dos efeitos adversos das mudanças climáticas.
Em relação às medidas de implementação é sugerido que o país crie um Plano Financeiro de Implementação, a ser elaborado em até 12 meses, que incluirá a análise detalhada dos custos, fontes de financiamento, e mecanismos de monitoramento. O plano não depende de apoio internacional, mas está aberto à cooperação para maximizar benefícios globais. Medidas incluem a criação de um Fundo Nacional de Adaptação, financiamento inovador para soluções baseadas em ecossistemas e linhas de crédito acessíveis para apoiar mulheres agricultoras e fomentar a pecuária sustentável. O Brasil também deverá integrar medidas de mitigação e adaptação em seus planos de desenvolvimento econômico, com foco na redução da pobreza e desigualdades sociais.
A justiça climática e a transição justa devem ser pilares fundamentais da NDC do Brasil. É sugerido que o país se comprometa a implementar salvaguardas para garantir que as iniciativas de mitigação e adaptação, incluindo a expansão das energias renováveis, não prejudiquem populações vulneráveis. Um sistema abrangente de Monitoramento, Relato e Verificação (MRV) será criado para avaliar tanto as emissões de gases de efeito estufa quanto os impactos sociais, desagregados por sexo e raça.
Além disso, a NDC prioriza a conclusão da demarcação de terras indígenas e a titulação de territórios quilombolas, fortalecendo a capacidade adaptativa e promovendo a justiça climática. Será essencial a consulta livre e informada com as populações locais, e mecanismos de financiamento devem ser direcionados para combater desigualdades sociais. Programas de capacitação para mulheres, incluindo treinamento para instalação de energia solar, e o tratamento sustentável de resíduos também serão incentivados, apoiando iniciativas econômicas lideradas por mulheres e jovens rurais para promover a sustentabilidade e reduzir as desigualdades socioeconômicas.
Além de elaborar a NDC, o OC também preparou uma matéria com perguntas e respostas sobre o documento.
“O processo de elaboração da NDC do OC foi amplamente participativo. Pela Apremavi participamos de algumas reuniões no âmbito do GT 2045 e também da sessão especial sobre esse assunto no Encontro Nacional do OC ocorrido em Brasília, em maio deste ano. É um documento muito importante, que leva propostas não somente ao governo, mas apresenta conteúdo de qualidade para o trabalho das próprias ONGs”, relata Miriam Prochnow, cofundadora e diretora da Apremavi e que representa a instituição no Observatório do Clima.
Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto.
Foto de capa: Wigold Schäffer.