FBOMS celebra 30 anos de ativismo socioambiental
O Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (FBOMS) acaba de completar 30 anos e celebrou a data no evento virtual “Diálogos intergeracionais: presente e futuro da cidadania e do ativismo socioambiental”, realizado no dia 06 de julho de 2020. Confira o vídeo aqui.
Foi um momento de muitas emoções, com falas inspiradoras diante dos grandes desafios que temos pela frente e também por conta das homenagens prestadas a ativistas que já se foram. A Apremavi é uma das fundadoras do FBOMS e participou de inúmeras atividades ao longo destes 30 anos. Para Miriam Prochnow, que fez umas das falas no evento, foi um momento não só de relembrar a história, mas de acordar os passos para o futuro e esses passos terão que ser feitos a base de muito ativismo.
Na ocasião foi lançada a nota FBOMS 30 anos de construção coletiva para a sustentabilidade e dignidade de Vida: Resiliência, Democracia, Justiça e Sustentabilidade Socioambiental no Brasil. O texto aponta o que precisa ser feito, diante da atual conjuntura, para que tenhamos um mundo com justiça social e ambiental, que garanta os direitos da natureza e da sociedade como um todo. Confira a nota aqui.
Reunião de representantes do Movimento Ambientalista, Brasília – 1996. Foto: Miriam Prochnow.
Conheça a história do FBOMS
O FBOMS foi criado em 18 de junho de 1990 (então denominado Fórum de ONGs brasileiras preparatório para a Conferência da Sociedade Civil sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento ) com o objetivo principal de articular perspectivas e posições de distintos movimentos e grupos da sociedade brasileira no tocante aos desafios da transição para o desenvolvimento sustentável, tendo como pilares a democracia, a equidade e justiça, a inclusão social e a integridade ambiental, no âmbito dos processos nacional e internacional, governamental, intergovernamental e da sociedade para a Rio-92.
Nasceu com objetivo de garantir e facilitar a participação da sociedade civil na Rio 92, disso resultou ter sido o proponente e coorganizador do Fórum Global 92, realizado no Parque do Flamengo, Rio de Janeiro, simultaneamente à realização da Cúpula da Terra. Entre os mais de 400 eventos destacam-se o Fórum Internacional de ONGs e Movimentos Sociais, no qual foram elaborados mais de trinta tratados alternativos (por ex: de educação ambiental, muito difundido), e encontros em diversas tendas temáticas e setoriais. Foi um marco histórico que inspirou, anos depois, a realização do Fórum Social Mundial e de outros eventos paralelos às Conferências da ONU (como a de Joanesburgo e mais recentemente a Cúpula dos Povos, paralela à Rio+20).
Após a Conferência Rio-92 e o Fórum Global 92, os membros do FBOMS decidiram por sua continuidade na perspectiva de consolidação do espaço de articulação intersetorial existente no campo da sociedade civil que atua em prol de direitos, de inclusão social e de integridade ambiental. Desse espaço de diálogos, embora a existência de múltiplas perspectivas sobre a realidade e seus desafios, fortaleceram-se iniciativas de seus integrantes e valorizou-se as capacidades de interlocução com governos e com organismos internacionais, bem como construídas alianças com redes congêneres em outros países e regiões.
Cabe destacar que o FBOMS desde a sua criação sempre conseguiu agregar tanto as organizações não-governamentais, na sua grande maioria de pequeno e médio porte, como também os movimentos sociais populares, entre outros, e contar ainda com a participação de ONGs de maior visibilidade pública que atuam em questões sociais, ambientais, de defesa de direitos, de defesa dos consumidores, de articulação de trabalhadores, etc.
Do espaço propiciado pelas atividades do FBOMS também surgiram outras redes e alianças para tratar de temas específicos, como por exemplo, a Rede de ONGs da Mata Atlântica, a Rede Cerrados, a Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais, a Rede Brasileira de Agendas 21 Locais (Rebal), além de ter propiciado a cooperação de seus membros por intermédio de grupos de trabalho para acompanhar e participar da implementação dos acordos da Rio 92 e de políticas públicas ou desafios especiais (por exemplo, florestas, educação ambiental, recursos hídricos, turismo, juventude, etc.)
Ao longo de sua existência o FBOMS ofereceu contribuições importantes à sociedade brasileira tornando-se reconhecido por sucessivos governos e organismos multilaterais como entidade representativa de importantes segmentos da sociedade civil organizada. Foi chamado a participar e ou indicar interlocutores de mais de duas dezenas de instâncias colegiadas e processos de abrangência nacional, tais como:
- Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e Agenda 21 Brasileira – CPDS
- CIMA – Comissão Interministerial para a Rio-92
- Comissão Nacional para a Rio+20
- Conselho Nacional de Biodiversidade – CONABIO
- Comitê Gestor do Fundo Nacional de Mudanças de Clima
- Fórum Brasileiro de Mudanças de Clima
- Conferências Nacionais de Meio Ambiente , de Juventude, de Cidades, etc.
Também designou representantes do FBOMS junto à Delegação do Brasil em eventos e negociações internacionais além da Rio-92, WSSD (Cúpula de Joanesburgo) e UNCSD (Rio+20), como por exemplo em diversas conferências das partes (CoP) das convenções da ONU sobre mudanças de clima (UNFCCC), biodiversidade (CBD), combate à desertificação, substâncias químicas perigosas, e junto à Comissão de Desenvolvimento Sustentável da ONU (UNCSD).
Em 2002 deflagrou uma série de reuniões dos GTs do FBOMS, de cujo processo resultou em contribuições desse Fórum junto ao Governo Brasileiro e junto a ONU, respectivamente, para o debate de demandas de políticas para o desenvolvimento sustentável (livro e cartilha síntese Brasil 2002: a sustentabilidade que queremos) e em propostas para a Cúpula Mundial da ONU de Desenvolvimento Sustentável (Joanesburgo, 2007, ou aqui conhecida como Rio+10).
Em 2006 organizou diversas iniciativas e fórum paralelo à Sexta Conferência das Partes (CoP-6) da Convenção de Diversidade Biológica, ocorrida em Curitiba. Anos antes, em 1998, por meio da ASPAN, de forma análoga, articulou eventos paralelos da sociedade civil em Recife durante CoP da Convenção de Desertificação. Em 2006, por iniciativa de seus integrantes, e sob a coordenação executiva do Instituto Vitae Civilis, realizou o processo de consultas e estudos regionalizados para a criação da REBAL – rede Brasileira de Agendas 21 Locais, cujo estabelecimento havia sido proposto em 2005 durante o II Encontro Nacional de Agendas 21 Locais, ocorrido durante o FSM – Fórum Social Mundial, no qual FBOMS foi uma das organizações parceiras.
Foi proponente e articulador da formação em 2010 do Comitê Facilitador da Sociedade Civil para a Rio+20, responsável pela organização da Cúpula dos Povos (paralela à Rio+20), e , para tanto, articulou a participação de redes e alianças tais como GTA, REBEA, Rede Cerrado, Rebal, Rede Mata Atlântica, Rede Meros, etc.
Nesse processo realizou diversos eventos no Fórum Social Mundial Temático de 2012, e consultas posteriores, em processos participativos para a elaboração de dois documentos como subsídios para debates por ocasião da Cúpula dos Povos e para a Rio+20:
- Convivência Digna e Sustentabilidade nos territórios (biomas & cidades): perspectivas de redes e organizações da sociedade civil.
- Governança do desenvolvimento sustentável, integridade ambiental e justiça social No processo da Rio+20 e Cúpula dos Povos, o FBOMS logrou contribuir para a desfragmentação e convergência de diversas redes, temáticas e regionais, que lidam com desafios socioambientais, de justiça e de cidadania na transformação do desenvolvimento nacional e global.
Como desdobramento de uma das diretrizes acordadas em seu XX Encontro Nacional (Junho de 2011, Brasília), quando da posse de um novo colegiado de coordenação, o FBOMS tem buscado reconhecer e valorizar a contribuição de cada rede e aliança, respeitando assim a diversidade de iniciativas, e mediante diálogos periódicos, servir de espaço para compartilhar estratégias e criar sinergia nas ações. Assim foi, por exemplo, com a participação de representantes junto ao Fundo Clima, Comitê pela Defesa das Florestas, e outras áreas que demandam maior coordenação no campo da sociedade civil. Assim, entre outras históricas contribuições e funções do FBOMS, destacam-se:
- Servir de espaço democrático de diálogo entre diversos movimentos e grupos da sociedade civil brasileira, que atuam no campo da cidadania, da justiça, da defesa de direitos e da sustentabilidade, não comprometidos com interesses econômicos, sob o marco da transição para o desenvolvimento sustentável e governança de políticas públicas;
- Democratizar o acesso e a interlocução de grupos da sociedade civil com os Poderes Executivo e Legislativo do Estado Brasileiro bem como junto às Nações Unidas;
- Manter acesa a “chama da sustentabilidade, notadamente nas questões socioambientais” frente aos desafios e iniciativas do governo e da sociedade;
- Buscar a evolução de mecanismos e condições de governança para a sustentabilidade do desenvolvimento humano;
- Defender a justa e digna convivência de agrupamentos humanos nos distintos territórios, rurais e urbanos, sobretudo com a valorização de iniciativas que partem de organizações da sociedade civil, com vistas às transformações na economia, na política, na cultura, enfim na sociedade.
Desafios recentes e atuais
O enfrentamento de questões nacionais e ou transversais, inclusive aquelas associadas aos retrocessos e ameaças de “flexibilização legislativa” de deveres, retrocessos em direitos e procedimentos para a tutela ambiental, contribuíram para retomar debates sobre desafios de superação da fragmentação na atuação de organizações da sociedade civil, ainda que essa atuação tenha logrado realizar iniciativas focadas por meio de coletivos diversos – alianças regionais, movimentos e “observatórios” temáticos etc. – como, por exemplo, Observatório do Código Florestal, movimento “Resista”.
Em recente assembleia extraordinária (março de 2018), integrantes do FBOMS , após importante debate sobre funções, dinâmicas operativas e limitações de “espaços de articulação e sinergia” como o do FBOMS frente aos desafios atuais no Brasil, deliberaram por buscar novas formas e papéis para a sua atuação, a fim de fortalecer a cidadania, o ativismo e a governança socioambiental, valorizando as alianças existentes e organizações da sociedade, tanto as com atuação em esferas locais como na esfera nacional.
Persistem, ainda, questões presentes nos debates internos do FBOMS ao longo da segunda década deste Século XXI, entre as quais, as condições e funções de atuação de atores realmente comprometidos com a sustentabilidade do País e do Planeta, da necessidade de se criar uma espiral de mobilização progressiva em todos os segmentos em prol da democracia, da sustentabilidade e da redução da desigualdade, valendo-se de algumas questões chaves, tais como:
- Quais os desafios mais importantes e urgentes para a sustentabilidade socioambiental no Brasil, em contexto de ameaças à democracia participativa? Como integrar em nossas estratégias as diversas ênfases no social, no ambiental, no modelo econômico, etc.?
- No atual contexto, que tendências corroboram contra e a favor da sustentabilidade socioambiental nos meios rurais e urbanos? Temos oportunidades para reverter o jogo? Com quem? Como avaliar o panorama?
- Por onde vamos? Como podemos fazer uma discussão mais politizada? Com quem nos aliarmos? Como chegar à sociedade?
- Onde estão nossas convergências? E nossas divergências? Como e em que desafios poderemos encontrar unidade? Podemos estar juntos com base na diversidade e multiplicidade de perspectivas de OSC?
- Quais funções e formas de atuação as diversas redes com temáticas múltiplas , enfoques integrados e articulações em distintas esferas e segmentos (como o FBOMS) devem ter na promoção de diálogos, convergências e estratégias para lidar com a diversidade de perspectivas?
- Como articular entre diversas redes, alianças, grupos as possíveis estratégias compartilhadas para ações frente aos desafios de incidência política, defesa de direitos e governança democrática?
Autora: Miriam Prochnow.