Incêndios criminosos agravados pelas mudanças climáticas impedem o Brasil de respirar
Os incêndios no Brasil, exacerbados por ações criminosas e mudanças climáticas, se intensificam a cada ano, trazendo consequências devastadoras para a biodiversidade, nossos biomas, saúde e economia.
O fogo que assola biomas como a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal têm duas causas principais: prática criminosa de queimar áreas para abrir espaço para pastagem e plantio e as mudanças climáticas. Essas queimadas são, muitas vezes, intencionais, realizadas para expandir as fronteiras agrícolas, com as mudanças climáticas intensificando as secas e aumentando a temperatura média, o fogo se espalha de forma descontrolada. Além disso, a situação de seca sem precedentes que o Brasil enfrenta contribui para esse cenário. Segundo uma nota técnica do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (CEMADEN) o país tem a pior seca em 70 anos.
“Estamos enfrentando a maior seca da história no Brasil e aumento drástico da temperatura. Importante salientar que não há registros de raios na região neste agosto e setembro, portanto estes incêndios são todos provocados pelo homem, sem autorização legal, já que o governo suspendeu todos os incêndios pré-autorizados. Ou seja, são incêndios criminosos. É fundamental a proibição completa do uso do fogo na agricultura brasileira”, comentam os pesquisadores Paulo Artaxo e Renato Janine Ribeiro.
Segundo a Agência Brasil, já foram instaurados 85 inquéritos para investigar o cenário sem precedentes, as apurações apontam indícios de crime ambiental. As regiões Norte e Centro-Oeste do Brasil, principais alvos de queimadas criminosas, são as mais afetadas pelas queimadas, mas os efeitos atingem também os grandes centros urbanos. Quando a fumaça chega a cidades do Sul e Sudeste, o problema ganha destaque nas manchetes, mas as populações rurais e periféricas sofrem com esse ciclo de destruição diariamente, sem a mesma visibilidade.
Em entrevista para o Estadão, o cientista e climatologista Carlos Nobre informa que nunca vivemos algo parecido: “Esse é o máximo que já experimentamos. A crise explodiu. Temos a maior temperatura que o planeta experimentou em 100 mil anos. Desde que existem civilizações, há dez mil anos, nunca chegamos nesse nível, em que todos os eventos climáticos se tornaram tão intensos e muito mais frequentes. São secas em todo o mundo, tempestades, ressacas e, agora, a explosão desses incêndios.”
O papel do agronegócio
Em um artigo para o The Intercept, Sabrina Fernandes, economista política e doutora em sociologia, aborda como o agronegócio contribui para os incêndios e como o Governo Federal precisa de medidas mais radicais. Grande parte do desmatamento ilegal que leva ao aumento dos incêndios está relacionado à expansão de áreas para monoculturas e criação de gado do agronegócio. As queimadas são uma ferramenta barata e rápida para abrir novos espaços, mas devastam a biodiversidade e destroem modos de vida tradicionais.
Conforme apontado por Sabrina, a diferença do investimento federal para o agronegócio e para a agricultura familiar é enorme: o Plano Safra da Agricultura Familiar 2024/2025 destinou 76 bilhões em créditos rurais, já para o agronegócio R$400,59 bilhões. Embora o governo destaque a importância de aumentar a produtividade da agricultura familiar na produção de alimentos, fica claro que o foco é outro.
O texto também enfatiza a importância de um “ambientalismo popular e radical” para enfrentar a normalização das catástrofes ambientais e expor o racismo ambiental, que afeta de forma desproporcional as populações mais vulneráveis. A transição justa, portanto, depende de enfrentar as causas estruturais da crise climática e redistribuir poder econômico e político no campo e nas florestas. Além disso, também é preciso apurar e cobrar os bilhões que o agronegócio deve à União, além de usar de multas por crimes ambientais para projetos e adaptação e seguros sociais para a população afetada por desastres climáticos.
Governo Federal cria comitê de combate ao fogo e aumenta a punição por incêndios
O decreto Nº 12.189, de 20 de setembro de 2024 institui o Comitê Nacional de Manejo Integrado do Fogo. O comitê terá a tarefa de compartilhar informações e propor ações de curto, médio e longo prazos para enfrentar as consequências das mudanças climáticas que geram incêndios em regiões de vegetação.
O Comitê inclui autoridades do Governo Federal, equipes operacionais, representantes de estados e municípios, entidades ambientais, pesquisadores e acadêmicos, associações de produtores rurais e movimentos sociais que atuam em territórios afetados pelos incêndios ou suscetíveis ao fogo.
Além disso, também foi publicado recentemente o Decreto Nº 12.189, de 20 de setembro de 2024 que aumenta a punição das multas por incêndios florestais.
Quem iniciar fogo em vegetação nativa será multado em R$ 10 mil por hectare ou fração, enquanto em florestas cultivadas a multa será de R$ 5 mil. Proprietários rurais que não seguirem as medidas de prevenção de incêndios florestais poderão ser penalizados com até R$ 10 milhões. O uso não autorizado de fogo em áreas agropastoris, antes punido com R$ 1 mil por hectare, agora pode resultar em multas de R$ 3 mil.
Também foram estabelecidas sanções de até R$ 50 milhões para quem não reparar ou compensar danos ambientais. Além disso, a compra, venda, transporte ou armazenamento de espécies sem autorização poderá ser multada entre R$ 100 e R$ 1 mil por quilograma, hectare ou unidade. O descumprimento de embargo ambiental ou suspensão de atividades poderá acarretar multas de até R$ 10 milhões, em vez do limite anterior de R$ 1 milhão. O decreto ainda autoriza o embargo preventivo de áreas ilegalmente queimadas e permite notificações eletrônicas, além de considerar infrações em Terras Indígenas como agravantes.
Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Wigold Schäffer e Miriam Prochnow.
Foto de capa: Wigold Schäffer.