Jovem usa a goiaba-serrana para desenvolver pomada fitoterápica
Em uma escola pública de Água Doce (SC), estudantes e professores encontraram na goiaba-serrana, espécie da Mata Atlântica, inspiração para produzir um projeto de pesquisa e desenvolver uma pomada anti-inflamatória.
A iniciativa surgiu com a integração de alguns componentes curriculares da escola, como metodologia científica, química, matemática, sociologia e projeto de conservação ambiental. Dessa forma, a professora Janete Rodrigues e seus colegas buscam exercitar os princípios para a produção de ciência, ainda na escola pública.
O projeto “Uso sustentável de propriedades medicinais da goiaba-serrana (Acca sellowiana) na produção de uma tintura fitoterápica e pomada cicatrizante” iniciou com uma pesquisa bibliográfica da literatura sobre a espécie; seguida de pesquisa de campo nas áreas onde a espécie se desenvolve. Os estudantes puderam descobrir as várias propriedades medicinais importantes que a espécie apresenta, segundo dados da literatura, como propriedades anti-inflamatórias. Depois disso, experimentos foram desenvolvidos na escola para produzir os insumos e desenvolver a formulação ideal.
A falta de estrutura para a pesquisa e desenvolvimento de experimentos foi o principal desafio para desenvolver o projeto, conforme explica Janete Rodrigues, professora orientadora do projeto: “Nós temos um laboratório na escola, mas faltam insumos e equipamentos. Utilizamos aparelhos de universidades da região, que também auxiliaram na realização dos testes com o protótipo da pomada. Produzir ciência na escola pública é uma prática de resistência”.
“Os principais conhecimentos que buscamos apresentar no projeto são as propriedades da goiabeira-serrana, que podem ter uso sustentável e serem utilizadas na área medicinal, de forma fitoterápica e em aplicações cicatrizantes“, destaca Eloise Antunes de Lima, estudante autora da pesquisa.
Registros das apresentações de Eloise nas feiras em que participou. Fotos: Divulgação/Janete Rodrigues.
O resultado do projeto é uma pomada cicatrizante sustentável e natural, que tem como compostos principais a tintura obtida das folhas da goiabeira-serrana, óleo de coco, óleo de amêndoas, cera de abelha e goma xantana. As descobertas foram apresentadas na feira Infomatrix, em Blumenau (SC), onde conquistou uma vaga para participar da Mostra Internacional de Ciência e Tecnologia (MOSTRATEC), realizada em outubro de 2023 em Novo Hamburgo (RS).
Nesse segundo evento, o projeto de Eloise foi um dos 12 selecionados entre mais de mil projetos de pesquisa para representar o Brasil na maior feira pré-universitária de ciência e engenharia do mundo, a Regeneron ISEF (Regeneron International Science and Engineering Fair) que será realizada de 11 a 17 de maio de 2024, em Los Angeles, nos Estados Unidos.
A professora Janete compartilhou o que planejam para a participação no evento internacional: “A expectativa em relação à Feira na Califórnia é mostrar a biodiversidade do nosso estado e os potenciais do uso sustentável, que respeita o meio ambiente e promove a ciência. É a primeira vez que uma estudante de Santa Catarina participa desse evento; e será uma grande honra representar o Brasil e a nossa região na maior feira pré-universitária de ciência e engenharia do mundo”.
Conhecer a biodiversidade local é uma etapa fundamental para a proteção da natureza e para o uso sustentável dos recursos, por isso o tema é trabalhado com constância na escola Escola Estadual Ruth Lebarbechon. Em algumas dessas ocasiões, a pedido da escola, a Apremavi realizou a doação de mudas nativas da Mata Atlântica, como a goiaba-serrana, que são utilizadas em plantios na comunidade escolar e em atividades de educação ambiental.
Valorização da biodiversidade
A pesquisa também está conectada com a realidade do território da escola, e busca divulgar as possibilidades para promover o desenvolvimento sustentável, voltada à realidade dos pequenos proprietários rurais da região. Além das folhas e frutos de goiaba-serrana, outros insumos naturais são utilizados na composição da pomada, como a cera de abelha residual da apicultura, que também pode ser comercializada.
Novos produtos para a áreas da saúde já estão no horizonte da equipe que desenvolveu o projeto premiado. Um deles é uma membrana curativa, que também tem como princípio ativo a goiaba-serrana; a ideia é utilizar a farinha do mesocarpo do fruto, resíduo produzido na extração do óleo essencial, para a composição de um curativo anti-inflamatório para aplicação em queimaduras. Essa nova ideia também já está em fase de testes de eficácia da composição, em parceria com universidades, como o Instituto Federal Catarinense e a Universidade Alto Vale do Rio do Peixe (UNIARP).
A professora Janete destaca a importância de valorizar e de promover suporte a iniciativas como essa, para que as comunidades escolares tenham condições de avançar na educação científica: “Outro desafio é a cobertura de custos para o desenvolvimento da pesquisa e apresentação dos resultados, em feiras e mostras. Por isso, a estruturação de escolas públicas e a valorização de estudantes e professores empenhados em produzir ciência é essencial”.
Para ajudar Eloise a participar da feira que acontecerá em maio na Califórnia e apresentar sua pesquisa, a escola está organizando uma vakinha online, com o objetivo de cobrir os custos da participação, como a emissão do visto de viagem e passagens aéreas.
* Os dados sobre usos medicinais das espécies nativas são apenas para informação geral. O uso de medicamentos fitoterápicos deve ser seguido de orientações de profissionais habilitados.
Autor: Vitor Lauro Zanelatto
Revisão: Thamara Santos de Almeida e Carolina Schäffer
Foto de capa: Vitor Lauro Zanelatto