Margarida-melada: espécie endêmica dos Campos de Altitude
O gênero Senecio pertence à família Asteraceae e é um dos mais diversos dentro do grupo, com aproximadamente 1000 espécies distribuídas principalmente em regiões montanhosas ao redor do mundo. Na América do Sul, a diversidade do gênero é particularmente elevada, com cerca de 500 espécies, dessas cerca de 60 ocorrem no Brasil. Essas espécies se desenvolvem predominantemente em ambientes úmidos, como os Campos de Altitude das regiões Sul e Sudeste do país.
Apesar de sua riqueza e diversidade, o conhecimento sobre a diversidade de Senecio spp. no Brasil ainda é incipiente, com alguns levantamentos botânicos realizados em Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Minas Gerais.
Senecio conyzifolius
Dentre as espécies do gênero Senecio, destaca-se Senecio conyzifolius, conhecida popularmente como arnica ou margarida-melada. Trata-se de uma erva perene que pode atingir cerca de 60 cm de altura, caracterizando-se pela presença de longos pelos roxos que secretam uma substância pegajosa ao longo do caule e das inflorescências. As flores são amarelas, e a espécie floresce entre agosto e outubro.
A distribuição da espécie ocorre principalmente em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, sendo comum nos Campos de Cima da Serra e nas regiões das Missões, Planalto Médio e Encosta Superior do Nordeste, sendo endêmica desses locais. Pode ser observada com frequência em campos abertos e ao longo das estradas.
Importância ecológica e medicinal
A polinização da espécie ocorre principalmente por borboletas e abelhas, destacando sua importância ecológica na manutenção das interações entre insetos polinizadores e a flora dos Campos de Altitude.
Além de seu papel ecológico, essa espécie é amplamente utilizada na medicina popular. Suas flores e folhas são empregadas na forma de alcoolatura para uso externo, sendo um remédio tradicional para tratar machucados e contusões. A planta é chamada pelas comunidades locais de “Arnica”.
Apesar de seu potencial cicatrizante, o uso interno da espécie não é recomendado, pois estudos apontam a presença de substâncias que podem ser tóxicas ao fígado (alcaloides pirrolizidínicos). Dessa forma, seu uso deve ser exclusivamente externo, evitando a aplicação em feridas abertas ou extensas*
*Os dados sobre usos medicinais das espécies nativas são apenas para informação geral, onde os estudos foram feitos com propriedades isoladas em uma quantidade específica. O uso de medicamentos fitoterápicos deve ser seguido de orientações médicas

Registros das flores e ramos de Senecio conyzifolius. Fotos: Carolina Schäffer, Wigold Schäffer e Maurício Mercadadante CC BY-NC-SA 2.0
Projeto de Lei ameaça a espécie
A margarida-melada, assim como toda a biodiversidade dos Campos de Altitude está ameaçada pelo Projeto de Lei (PL) 364/2019. Caso aprovado, o PL pode representar um grande retrocesso na conservação desse ecossistema sensível, pois expõe campos nativos em todos os biomas brasileiros à conversão para expansão agrícola, especulação imobiliária e atividades que comprometem a biodiversidade local.
O PL também incentiva o retrocesso a nível estadual em Santa Catarina. Em 2022, o Código Estadual do Meio Ambiente de Santa Catarina restringiu a proteção dos Campos de Altitude apenas às áreas acima de 1500 metros de altitude. Com isso, a área protegida foi reduzida para apenas 3,8% da cobertura original definida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e, dessa porção ínfima que restou, ainda flexibilizou regras para favorecer a supressão da vegetação campestre.
A perda desses habitats pode resultar na extinção dessas espécies endêmicas ainda pouco estudadas e que dependem dessas áreas para sua sobrevivência, além de comprometer serviços ecossistêmicos fundamentais.
Referências consultadas:
Araújo, F. P., Klein, P. A., Fernandes, M., Renck, M. V. K., & Rolim, R. G. (2022). Se essa rua fosse minha eu mandava semear: plantas ornamentais nativas para manutenção de polinizadores em áreas urbanas nos campos de cima da serra, Rio Grande do Sul, Brasil. Pesquisas, Botânica, (76), 193-217.
Boldrini, I. I., Bordignon, S. A. D. L., Borges, R. A. X., Vieira, M. D. S., Overbeck, G. E., & Lange, O. (2023). Guia de plantas campestres dos Aparados da Serra. Rede Campos Sulinos.
Oliveira, C. C. D., Silva, M. J. D., & Teles, A. M. (2015). Senecio L.(Asteraceae, Senecioneae) no Estado do Rio de Janeiro, Brasil. Hoehnea, 42(4), 703-724.
Silva, C. D. M. D., Bolzan, A. A., & Heinzmann, B. M. (2006). Alcalóides pirrolizidínicos em espécies do gênero Senecio. Química nova, 29, 1047-1053.
Teles, A.M.; Heiden, G.; Freitas, F.S. Senecio in Flora e Funga do Brasil. Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
Horto Didático de Plantas Medicinais do HU/CCS da Universidade Federal de Santa Catarina.
Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Carolina Schäffer e Vitor Lauro Zanelatto.
Foto de capa: Carolina Schäffer.