Tecendo, criando e plantando mudanças: redes e artivismo de Nara Guichon
“Não existe lixo, existe mau encaminhamento dos resíduos. Tudo provém de uma matéria-prima, da ação da Natureza, e nós estamos tratando como lixo”
Mudar a condição de um material através do olhar, antes mesmo do toque, da dedicação e do trabalho. A artista e ativista Nara Guichon já enxerga nas redes de pesca descartadas possibilidades de expressão através do fazer artístico, percebe o que alguém julgou como inútil antes de realizar o descarte inadequado no oceano como possibilidades de criação. Faz tricô com o material e concebe peças que, mesmo sem palavras, expressam um manifesto de negação ao lixo e ao uso único dos materiais.
Nara é gaúcha, mas mora há décadas no sul de Florianópolis. A vida cotidiana numa cidade onde a pesca e a maricultura são atividades econômicas significativas – em diferentes escalas – tornou inescapável o encontro da então artesã dedicada aos tecidos com as redes deixadas diretamente nas praias, ou que nelas chegaram após o abandono no oceano.
O descontentamento com a poluição por esse material e todos os impactos à fauna, flora e aos ecossistemas costeiros e marinhos provocou a artista à ação. Desde a década de 1990 Nara coleta, lava, tinge com pigmentos naturais e costura manualmente as redes, dando ao material sentido novo e provocando através de suas obras a conscientização sobre a poluição dos oceanos. A artista busca mudanças no mundo e nas formas de viver o mundo, tece para sensibilizar as pessoas sobre a finitude dos recursos naturais e demandar mudanças na forma com que sua espécie explora a Terra.
Do desejo de ver um futuro mais sustentável surgem obras esculturais que superam o tamanho da artista. As redes também são utilizadas para criações em dimensões menores, proporcional às mãos, como as esponjas para lavar louças e sacolas para compras no hortifruti. Inspira com a arte, mantendo o compromisso com a realidade e com um dos seus grandes anseios: que os produtos sejam mais duráveis, acessíveis e distantes da lógica do uso único do material e envio ao aterro sanitário.
Seu tempo no ateliê é dividido com sua floresta, em contínua expansão e mutação. Em 1988, Nara Guichon tornou-se associada da Apremavi, colaborando de modo contínuo e ativo. Muitas das que agora são árvores na sua terra já foram mudas no Viveiro Jardim das Florestas, além das milhares que foram plantadas em Santa Catarina através da doação de uma parcela dos lucros auferidos com as vendas no seu ateliê. Caminhando entre florestas e restingas, Nara semeia o futuro.
Nara em sua casa, ateliê, jardim e floresta. Fotos: Vitor Lauro Zanelatto.
Sementes de Futuro
Em busca de inspiração, a Apremavi apresenta nesta nova série de vídeos diversas formas de viver de forma ativista. Pessoas que se dedicam a contribuir com um mundo mais sustentável e biodiverso, criando soluções e buscando promover mudanças nos desafios locais e globais do nosso presente.
Autor: Vitor L. Zanelatto
Revisão: Thamara Santos de Almeida
Foto de capa: Vitor L. Zanelatto