Março de 2021, um mês pra lá de simbólico
Imersa em uma desafiadora realidade, a humanidade enfrenta não apenas a crise da pandemia, mas também a climática, da exclusão social e dos preconceitos. Em pleno 2021, o mês de março, com tantos dias internacionais de luta, como o Dia Internacional da Mulher, Dia Internacional das Florestas e Dia Mundial da Água, não pode ser encarado apenas como um mês simbólico. Deve servir de fato para ressaltar a importância dessas pautas na busca da transformação da sociedade. É momento de lançar e fortalecer redes, coalizões, movimentos e iniciativas a fim de mitigar o preconceito de gênero, combater a violência e estimular as ações de proteção e restauração das florestas e da água.
Países liderados por mulheres tiveram desempenho destacado no combate à pandemia, e estão vendo relativamente menos mortes pela covid-19. De igual modo, são elas que lideram pesquisas e produções na academia, grande parte das lutas por políticas públicas inclusivas, pelos direitos humanos e também protagonizam o combate à crise climática, a maior ameaça ao futuro das espécies; sobretudo, a humana. Queremos aqui também dar destaque ao papel das mulheres na agenda da restauração, começando pelo time de casa. Vejam só quantos depoimentos importantes. A Apremavi está prestes a lançar uma série de histórias chamada “Mulheres que Restauram”. Será uma das formas também de participação das atividades da Década da Restauração.
A Apremavi esteve presente também num debate internacional sobre a importância da atuação das mulheres na defesa da vida. No dia 17 de março de 2021, Miriam Prochnow participou do evento paralelo “Protegendo o planeta e as pessoas – Vozes de Mulheres Ambientalistas, Defensoras dos Direitos Humanos“, organizado pela delegação da União Européia junto à ONU, por ocasião da 65ª sessão da Comissão sobre o Status da Mulher (CSW65). Foi um evento com cinco mulheres cujo trabalho, em diferentes partes do mundo e abordando problemas ambientais muito diferentes, está fazendo a diferença para a proteção do planeta e das pessoas. O painel de discussão proporcionou oportunidades de ouvir sobre suas experiências e os desafios específicos das mulheres defensoras dos direitos humanos ambientais em todos os continentes. O objetivo foi contribuir para o tema prioritário da 65ª Sessão, trazendo recomendações sobre como promover a participação e a tomada de decisões de mulheres defensoras dos direitos humanos ambientais na vida pública e para garantir sua proteção. O evento teve o apoio da Missão Permanente dos Estados Unidos, Front Line Defenders e FRIDA Young.
Para quem não teve a oportunidade de acompanhar o evento ao vivo, segue abaixo a fala principal feita por Miriam e também o vídeo com todo painel.
“Nós só sobreviveremos como espécie se a natureza puder viver. Eu ainda acredito num futuro sustentável, mas ele só será possível com equidade de gênero, solidariedade, justiça climática e muito ativismo” – Miriam Prochnow para o evento da ONU Mulheres.
Mulheres conectadas, como árvores na floresta
“Cumprimento todas e todos e agradeço a oportunidade de compartilhar um pouco das minhas vivências e sentimentos, nesse momento tão difícil para o planeta e especialmente difícil para o Brasil. Aqui temos defensoras ambientais e de direitos humanos e da natureza. É triste constatar que atualmente tanto as defensoras, quanto a natureza e os direitos humanos estão sob constante ameaça.
O Brasil, infelizmente, está colapsando. Detém recordes mundiais de ataques a ativistas e estamos vivenciando retrocessos enormes na agenda socioambiental, com altos índices de desmatamentos e queimadas em praticamente todos os biomas brasileiros e desmonte da legislação e das instituições responsáveis. Nossa democracia está em perigo e parece que o uso de fakenews e do negacionismo viraram uma forma de governar. A falta de coordenação nacional da pandemia só piora esse quadro e já passamos do triste número de 280 mil mortos pela Covid 19. A situação para as mulheres é grave, os índices de violência doméstica aumentaram e foram as mulheres que mais perderam postos de trabalho nesse período.
Esse é um pequeno resumo. Diante disso aonde vamos achar a esperança? A educação, inclusive a educação ambiental, é uma resposta óbvia e é uma das ferramentas mais efetivas de empoderamento. A questão é como fazer com que todos tenham acesso a uma educação de qualidade? Precisamos pensar e investir em processos educativos para além da educação formal. É preciso apoiar cada vez mais as redes e comunidades de aprendizagem, promovendo a inclusão e garantindo a participação efetiva. Não adianta fornecer uma ótima capacitação online, se as pessoas não tem nem computador ou internet. Eu acredito muito nessas redes de integração. São espaços de aprendizagem, mas também de acolhimento e de proteção. Eu já fui ameaçada várias vezes, inclusive de morte, e sei da importância de ter informações sobre como enfrentar essa situação, bem como ter apoio para garantir a segurança. Essas são estratégias que merecem atenção e investimento, inclusive em se tratando de acordos e parcerias internacionais.
Essas redes também podem ajudar na reconstrução pós covid e no enfrentamento da crise climática. Nós temos muitas soluções disponíveis e elas podem e devem ser utilizadas para a implantação de uma economia mundial que seja sustentável, verde e inclusiva. Por exemplo, envolver as mulheres nas atividades de desenvolvimento e instalação de energias sustentáveis como a solar e também nas atividades da cadeia produtiva da restauração, será decisivo para o empoderamento e transformação. Eu falo de restauração porque é uma das minhas frentes de trabalho. Sou uma ativista boca no trombone e mão na massa. Na Apremavi, organização da qual sou fundadora, ajudei a implantar um viveiro de mudas de árvores nativas, que começou com 18 mudinhas no fundo do quintal e hoje tem capacidade para produzir mais de 1 milhão de mudas da Mata Atlântica por ano. Temos milhares de parceiros, muitas mulheres, que já estão engajadas na agenda da restauração e por isso eu entendo a força e o potencial dessa agenda.
Como dizemos na comunidade de aprendizagem de gênero e clima, no âmbito do Observatório do Clima, da qual eu faço parte: “Nós mulheres não somos nem salvadoras do planeta, e nem naturalmente vulneráveis. Vivenciamos a crise climática de formas diferentes: depende da cor, classe, sexualidade, faixa etária e tantas outras questões. Nossa relação com a preservação da vida e da natureza não é uma inclinação biológica. É uma questão existencial e política”.
Eu quero de fato encorajar cada vez mais as redes de aprendizagem, de convivência e de proteção. E sim, nós precisamos de apoio para avançar. Precisamos de oportunidades de falar (como esse evento está fazendo) para que mulheres compartilhem as suas histórias; de projetos nos quais as mulheres tenham protagonismo no planejamento das propriedades e paisagens; ações que incentivem jovens mulheres a ocuparem cargos públicos; que criem campanhas e ações para reaproximar as mulheres da natureza e de suas soluções; que ajudem a cuidar dos espaços democráticos, inclusivos e de diálogo.
Como seria interessante, por exemplo, termos um aplicativo de celular que conecte mundialmente todas as defensoras e ativistas pelo planeta, possibilitando que as mulheres estejam conectadas, como as árvores numa floresta. Mulheres indígenas, quilombolas, extrativistas, agricultoras, professoras, estudantes, enfim…todas. Precisamos dessa conexão mundial para a defesa dos direitos das pessoas e do planeta.”
Vídeo transmissão do evento “Protegendo o planeta e as pessoas – Vozes de Mulheres Ambientalistas, Defensoras dos Direitos Humanos“, organizado pela delegação da União Européia junto à ONU.
Autora: Miriam Prochnow.