Observatório do Clima realizou reunião anual em Atalanta (SC)

12 abr, 2017 | Clima Legal, Notícias

Integrantes e parceiros celebraram os 15 anos da rede e debateram a estratégia para o aumento da ambição das propostas brasileiras no Acordo de Paris.

O Observatório do Clima (OC), a maior rede de entidades da sociedade civil dedicada ao debate do clima no Brasil, reuniu suas entidades integrantes e parceiros para a sua assembleia anual, na cidade de Atalanta (SC), de 10 a 12 de abril de 2017, nas dependências do Centro Ambiental Jardim das Florestas da Apremavi. Reuniu 43 participantes, representando 21 membros e organizações observadoras.

O encontro marcou os 15 anos do OC e também os 30 anos da Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida (Apremavi), havendo oportunidade para uma celebração conjunta. A celebração incluiu um jantar com membros do Conselho da Apremavi e autoridades locais e um plantio de mudas, ampliando uma faixa de mata ciliar no local.

Edegold Schäffer, Presidente da Apremavi, mostrando o Viveiro de Mudas Jardim das Florestas. Foto: Arquivo Apremavi

O OC nasceu em 2002 para posicionar a questão florestal no debate do Protocolo de Kyoto. Em 2009, participou ativamente da Política Nacional de Mudanças Climáticas. Mais recentemente passou a gerar dados com a criação do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa, o SEEG, em 2012.

Durante os três dias de reunião houve discussões em plenária e trabalhos em grupos, tratando dos seguintes temas:

  • Adaptação e resiliência climática
  • Comunicação
  • Florestas e REDD
  • Governança
  • Monitoramento de Políticas Públicas
  • NDC de 1,5ºC
  • Ataque sistemático (governo e congresso) à governança socioambiental do Brasil

Momento do plantio de árvores durante o encontro. Foto: Arquivo Apremavi

Como resultado das discussões foi lançada a Carta de Atalanta, um documento em protesto contra o ataque coordenado do Congresso Nacional e do governo de Michel Temer à proteção ambiental e aos direitos dos povos tradicionais.

A carta lista a série de retrocessos promovidos pelo governo e por seus aliados parlamentares nos últimos meses, no que talvez seja a maior ofensiva antiambiental desde a Constituição de 1988. E alerta que o movimento põe em risco as metas climáticas do país, além da segurança de toda a sociedade.

Entre as vítimas estão as unidades de conservação – comissões especiais do Congresso reduziram a proteção de 1,1 milhão de hectares em apenas dois dias, votando propostas enviadas pelo próprio Palácio do Planalto na forma de Medidas Provisórias; as terras indígenas, com a nomeação de Osmar Serraglio (PMDB-PR), um radical da bancada ruralista, para o cargo de ministro da Justiça; as terras públicas, com a proposta da MP 759; e o licenciamento ambiental.

“Após avanços significativos na redução da taxa de desmatamento e na demarcação de terras indígenas e criação de unidades de conservação na década passada – mantendo ao mesmo tempo forte crescimento econômico, safras recorde e geração de empregos –, o Brasil parece retroceder à década de 1980, quando era um pária internacional devido à destruição acelerada de seu patrimônio natural e à violência no campo”, diz a carta.

“O país que gosta de se vender ao mundo como parte da solução da crise do clima voltou a ser um problema. A mesma agropecuária propagandeada como a mais sustentável do mundo é a responsável pela grilagem de terras públicas, pela retirada de direitos de povos e comunidades tradicionais e pequenos agricultores e por rasgar os compromissos domésticos e internacionais de redução de emissões.”

Participantes do OC em momento de reunião. Foto: Arquivo Apremavi

Acompanhe abaixo a matéria realizada pela RBA TV sobre o encontro.

http://www.rbatv.com.br/noticia-rban/acoes-serao-este-ano-22220

 

A carta de Atalanta pode ser encontrada aqui. Leia abaixo sua íntegra:

Nenhum hectare a menos!

Carta do Observatório do Clima contra os retrocessos na agenda socioambiental

Em meio à instabilidade política atual, segmentos do governo e do Congresso avançam rapidamente para desfigurar leis e políticas socioambientais consolidadas a partir da Constituição de 1988. Evidencia-se um esforço concentrado e organizado para a aprovação de um conjunto de medidas que colocam em risco o bem-estar e a segurança da sociedade e nossos compromissos contra as mudanças climáticas.

Na última terça-feira (11/4), uma comissão do Congresso Nacional retalhou um conjunto de unidades de conservação na Amazônia e na Mata Atlântica, liberando para grilagem 660 mil hectares de terras públicas que haviam sido ilegalmente ocupadas e vêm sendo desmatadas. A redução, sem precedentes, foi inicialmente pedida pelo próprio Presidente da República, Michel Temer, por meio da Medida Provisória 756. Na quarta-feira (12/4), em sete minutos, outra comissão especial do Congresso aprovou a Medida Provisória 758, que reduz outros 442 mil hectares de unidades de conservação na Amazônia – em dois dias, 1,1 milhão de hectares.

A redução de áreas protegidas por MP, proposta inicialmente pela ex-presidente Dilma Rousseff e posta em prática por Temer, é uma sinalização do governo de que o crime compensa. A prática vem animando segmentos empresariais e parlamentares a formular propostas visando extinguir, reduzir ou alterar o status de proteção de parques nacionais, reservas extrativistas e outras áreas protegidas. No exemplo mais recente, políticos do Amazonas articulam com a Casa Civil a redução de cerca de 1 milhão de hectares de unidades de conservação no sul do Estado. Tramitam no Congresso Nacional e em várias assembleias legislativas estaduais outros projetos com esses objetivos.

O presidente também editou a MP 759/2016, que, a pretexto de promover a regularização fundiária, incentiva a grilagem de áreas públicas, perenizando o caos urbano e rural, o aumento do desmatamento e a concentração de terras e de renda.

Esses movimentos ocorrem em meio à forte elevação do desmatamento da Amazônia. A devastação cresceu 60% nos últimos dois anos, pondo em risco a meta brasileira de chegar a 2020 com uma redução de 80% na taxa, lançando dúvidas sobre a seriedade do compromisso do governo brasileiro com o Acordo de Paris.

Outras áreas protegidas também estão sob ameaça. Temer nomeou um ruralista radical, Osmar Serraglio (PMDB-PR), para o Ministério da Justiça, ao qual a Funai está subordinada. Serraglio foi o relator, na Câmara, da PEC 215, que viola direitos constitucionais dos índios ao transferir do Executivo para o Congresso a prerrogativa de demarcar terras indígenas. Premiando um militante da injustiça como ministro, Temer toma partido nos conflitos que o governo deveria mediar.

Encontram-se paralisados todos os procedimentos administrativos de demarcação de terras indígenas, titulação de quilombos e criação de assentamentos da reforma agrária e unidades de conservação. O teto de gastos introduzido na Constituição projeta um longo período de arrocho orçamentário para os órgãos e políticas socioambientais – um exemplo é o corte de 43% no orçamento do Ministério do Meio Ambiente em pleno período de alta no desmatamento.

Além das ameaças diretas a áreas protegidas e territórios tradicionais, também pode ser votado na Câmara nos próximos dias o desmonte do licenciamento ambiental. A bancada ruralista, juntamente com a Confederação Nacional da Indústria, vem buscando afrouxar o licenciamento, deixando na mão de Estados e municípios a definição das atividades que precisam de licença – e isentando toda a agropecuária. A vitória dessa proposição, que atropela o diálogo entre governo, congresso e sociedade civil para o aprimoramento deste instrumento, aumentará ainda mais o potencial de tragédias como a ocorrida em Mariana em 2015, além de abrir o caminho para grandes obras, como as investigadas pela Operação Lava Jato, sem qualquer avaliação de impacto.

Nesse cenário, cresce a violência contra jovens, mulheres, trabalhadores rurais, extrativistas, quilombolas e índios. Somente em 2015 foram registrados 50 assassinatos relacionados à luta pela terra e por direitos comunitários. O Brasil é o país onde mais se mata ativistas socioambientais.

Após avanços significativos na redução da taxa de desmatamento e na demarcação de terras indígenas e criação de unidades de conservação na década passada – mantendo ao mesmo tempo forte crescimento econômico, safras recorde e geração de empregos –, o Brasil parece retroceder à década de 1980, quando era um pária internacional devido à destruição acelerada de seu patrimônio natural e à violência no campo.

O país que gosta de se vender ao mundo como parte da solução da crise do clima voltou a ser um problema. A mesma agropecuária propagandeada como a mais sustentável do mundo é a responsável pela grilagem de terras públicas, pela retirada de direitos de povos e comunidades tradicionais e pequenos agricultores e por rasgar os compromissos domésticos e internacionais de redução de emissões.

Em vista desse quadro, o Observatório do Clima: repudia os ataques ao patrimônio nacional e aos direitos da sociedade realizados pelo poder público sob influência de interesses privados; demanda ao Congresso Nacional que não aprove qualquer medida que leve à redução do status de proteção ou eliminação de áreas protegidas, como as Medidas Provisórias 756 e 758, nem qualquer outra medida que fragilize a proteção social e ambiental do país; demanda ao Presidente da República que não recorra mais a MPs para alterar áreas protegidas e vete na íntegra as alterações recentemente propostas pelo Congresso, caso aprovadas; e apoia organizações ambientais e movimentos sociais que juntam forças para fazer frente aos retrocessos, na certeza de que somente o aumento da resistência será capaz de deter e de reverter a atual conjuntura.

Atalanta (SC), 12 de abril de 2017

Assembleia Anual do Observatório do Clima

Autores: Miriam Prochnow e Cláudio Angelo

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