Presidência do IBAMA ratifica desdobramentos da “Operação Araxá”, na Coxilha Rica

28 fev, 2023 | Notícias

Em despacho, Jair Schmitt, Presidente Substituto do IBAMA, nega a hipótese de conciliação com a legislação catarinense, utilizada por desmatadores como argumento de defesa. 

A decisão é um desdobramento da Operação Araxá, realizada em julho de 2022 na região da Coxilha Rica, município de Lages (SC), que fiscalizou e autuou propriedades rurais que promoverem mudança no uso do solo, convertendo áreas naturais dos Campos de Altitude para a realização de atividades agrossilvipastoris. 

Em 2018 o IBAMA havia realizado uma fase da Operação Campereada na região, visando investigar ilícitos da mesma natureza. A Lei da Mata Atlântica prevê que toda vez que houver supressão ou conversão de áreas com vegetação nativa, a exemplo dos Campos de Altitude e de áreas de florestas, maiores que 50 hectares, é necessário solicitar o licenciamento ambiental junto ao órgão estadual e este tem que ouvir o Ibama. Na ocasião, cerca de 30 proprietários rurais foram notificados pela destruição completa de áreas entre  50 e 700 hectares na região da Coxilha Rica no município de Lages (SC), e autuações por infrações ambientais foram lavradas.  

Contando com a defesa incansável de deputados federais catarinenses e após um encontro em janeiro de 2019 na sede do IBAMA, o então Presidente do órgão, Eduardo Bim, arquivou todas as multas em uma única canetada, segundo publicou a Agência Pública

O Ministério Público Federal de Santa Catarina (MPF-SC) abriu um processo de investigação sobre a decisão de Bim, partindo de um dossiê que aponta irregularidades no questionável processo de advocacia que culminou na anulação das autuações da Operação Campereada. Através de documentos que constam do dossiê, os proprietários que promoveram supressão de vegetação buscaram defesa diretamente ao então ministro Ricardo Salles (MMA) e do Ibama, invocando a promessa feita por Jair Bolsonaro na campanha de 2018,  de acabar com o que chamava de “indústria de multas” ambientais. 

Além disso, na  época servidores do IBAMA relataram intimidações vindas dos produtores autuados, sobretudo por ligações telefônicas, que buscavam exaltar o apoio e defesa que estavam recebendo de congressistas brasileiros. “A situação da ligação [telefônica] ofensiva e até ameaçadora coloca em risco não apenas o trabalho do Ibama, mas do próprio servidor público no exercício das suas funções”, escreveu a fiscal que registrou formalmente o acontecido. O episódio demonstra que a Operação Campereada, pela pressão das bancadas ruralistas gaúcha e catarinense, acabou desmontada pelo próprio Ibama.

Agora o IBAMA dá sinais de que os tempos de impunidade a desmatadores estão no passado, tendo sido findadas junto com o término do governo de Jair Bolsonaro. Em ofício publicado em nove de fevereiro, o atual presidente substituto do órgão, Jair Schmitt, apresenta oito considerações sobre o caso para decidir sobre a continuidade dos processos da operação, sem considerar a hipótese de Mediação junto à Procuradoria Federal Especializada. 

O texto também é claro quanto à inconstitucionalidade da legislação catarinense, em desacordo completo com a regras federais sobre o licenciamento ambiental de atividades agrícolas em áreas naturais. Schmitt citou o precedente jurídico produzido no estado do Tocantins para ilustrar a inquestionável soberania da Lei da Mata Atlântica (Lei 11.428/2006) para regulamentar o tema em questão: “A Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5312/TO, que  foi julgada procedente pelo Supremo Tribunal Federal e  declarou inválidos trechos da Lei Estadual nº 2.713/13, que visava dispensa de licenciamento ambiental as atividades agrossilvipastoris (DJ 11/02/19), revela entendimento da Suprema Corte contrário ao dispositivo da lei catarinense que objetivou o mesmo propósito”



Coxilha Rica

Imagem aérea na região de Coxilha Rica, Lages (SC). Foto: Wigold B. Schaffer.

Apremavi atuou na elaboração do Plano da Mata Atlântica de Lages

Após quase dois anos de trabalho, especialistas em conservação, restauração e planejamento territorial da Apremavi apresentaram em 2018 uma proposta de Plano Municipal da Mata Atlântica do município. O documento foi apresentado ao Executivo Municipal de Lages (SC), contemplando um diagnóstico completo da situação da Mata Atlântica no município, uma avaliação da capacidade de gestão ambiental do município, integra ações do Plano Diretor Municipal e dos Planos Setoriais, indicações de áreas e ações prioritárias para conservação da biodiversidade, apresenta um Mapa de Áreas Prioritárias para Conservação e Recuperação da Vegetação Nativa e sugestão de um Plano de Ação.

Na oportunidade, Antonio Ceron, Prefeito de Lages, chegou a parabenizar a equipe responsável pela robustez da proposta: “Sabemos que o plano é importante e foi elaborado dentro das normas e leis ambientais, daí a necessidade de uma consciência municipal diante do documento a ser aprovado”, destacou Ceron.

Curiosamente, o mesmo político integrou a comitiva à Brasília dos produtores autuados na Operação Araxá, buscando a revogação de autuações por infrações ambientais e a liberação de áreas embargadas junto a congressistas ruralistas. Neste mês, o político foi um dos presos numa operação que investiga corrupção e lavagem de dinheiro em contratos de coleta de lixo.

A proposta do Plano Municipal de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica do município de Lages, que deveria ter seguido na época para aprovação pelo Conselho Municipal de Meio Ambiente, não teve avanços na tramitação até a data de publicação dessa matéria (28/02/2023).

Miriam Prochnow, então Presidente e demais integrantes da equipe Apremavi entregam em mãos o PMMA de Lages (03/2018). Foto: Arquivo Apremavi.

Autores:  Vitor Lauro Zanelatto e Wigold B. Schaffer

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