Proteger e restaurar a Mata Atlântica é urgente
Estamos a apenas sete anos de 2030, ano que marca o fim da Década das Nações Unidas da Restauração de Ecossistemas, um apelo para a proteção, revitalização e restauração de ecossistemas do mundo todo. Os riscos envolvendo a perda da biodiversidade foram discutidos na 15ª Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade (COP 15) que ocorreu na China, em 2021 e no Canadá, em 2022. Ambas conferências mostraram que nas próximas décadas pelo menos um milhão de espécies correm risco de desaparecer para sempre devido à ação humana, que está por trás não só da crise climática, mas das crises humanitárias, econômicas e de biodiversidade. O Acordo Kunming-Montreal, aprovado por quase 200 países, estabelece uma nova meta de conservação, será necessário preservar até 30% das áreas terrestres e regiões costeiras e marinhas globais até 2030, para conter a onda de extinção de espécies em andamento. O acordo determina ainda que, neste mesmo prazo, até 30% dos ecossistemas que estão degradados – tanto terrestres quanto marinhos – devem estar restaurados ou com restauração em andamento.
O ano de 2030 também foi definido como meta para a redução em 45% das emissões dos gases de efeito estufa (GEE) em comparação com os níveis de 2010. Trata-se de um passo fundamental para limitar o aquecimento global a 1,5ºC e frear os danos causados pelas mudanças climáticas. Nesse aspecto, um novo relatório da Organização Meteorológica Mundial (World Meteorological Organization – WMO), divulgado no dia 17 de maio, traz péssimas notícias, estimando que há 66% de probabilidade que o planeta ultrapasse o limite de 1,5ºC de aquecimento global entre 2023 e 2027. O relatório aponta ainda que há 98% de chance de que estes anos superem 2026 como os mais quentes no mundo desde que começaram os registros. Isso exige medidas ainda mais urgentes de nossa parte.
O Brasil, conhecido por sua natureza rica e exuberante, infelizmente, tem sido líder mundial na perda de florestas tropicais. Em 2021, de acordo com dados do Global Forest Watch, com a perda de 1,5 milhão de hectares de florestas primárias, o país respondeu por 40% da derrubada registrada globalmente. Um dos biomas que continua em risco é a Mata Atlântica, um hotspot mundial com recordes de biodiversidade e um dos mais ameaçados do planeta.
Presente em 17 estados e 3.429 municípios brasileiros, hoje, restam 24% da floresta que existia originalmente no bioma, sendo que apenas 12,4% são florestas maduras e bem preservadas. Esse percentual também está distribuído de forma desigual entre os diferentes ecossistemas do bioma, que abriga 35% de todas as espécies vegetais do país e mais de duas mil espécies de animais, sem contar os insetos. A Mata Atlântica, por exemplo, tem a maior biodiversidade de anfíbios do mundo. Por outro lado, o maior declínio mundial desses animais, segundo estudo, causado pelas mudanças climáticas, doenças e fragmentação dos habitats. A Mata Atlântica também abriga 9 das 12 bacias hidrográficas do Brasil e cerca de 72% da população brasileira (IBGE, 2014).
Dados do terceiro boletim do Sistema de Alertas de Desmatamento (SAD) da Mata Atlântica, consolidado no Map Biomas Alerta, mostram que um total de 21.302 hectares de floresta foram desmatados na Mata Atlântica no primeiro semestre de 2022. Essa destruição é comparável à área de 117 campos de futebol por dia.
Os dados do Atlas da Mata Atlântica, divulgado no dia 24 de maio, traz dados preocupantes, que comprovam que o desmatamento continua a passos largos. O bioma perdeu 20 mil hectares de florestas em um período de um ano (entre outubro de 2021 e de 2022). É a segunda maior área desmatada nos últimos 6 anos, colocando em risco a qualidade de vida de 145 milhões de brasileiros que dependem das bacias hidrográficas localizadas em áreas de Mata Atlântica para terem acesso à água.
Para ajudar a reverter esse quadro, o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg) tem como meta recuperar, na Mata Atlântica, 4,8 milhões de hectares até 2030, e o Pacto pela Restauração da Mata Atlântica se propõe a viabilizar a restauração de 15 milhões de hectares até 2050.
Em um estudo publicado em julho de 2019 na revista científica Science Advances, uma equipe de pesquisadores buscou identificar quais são os locais que possuem grande potencial de benefício da restauração somado à boa viabilidade de que o plantio de árvores prospere. Os resultados mostram que a Mata Atlântica foi o bioma com maior quantidade e área de hotspots para a restauração em todo o mundo, o que exemplifica uma grande oportunidade para os projetos de restauração do bioma.
É neste cenário que precisamos atuar com urgência, para mudar o curso catastrófico que se apresenta. Está mais do que comprovado que a conservação e a restauração de florestas são fundamentais para o combate à crise climática e a manutenção do fornecimento de serviços ecossistêmicos, que são essenciais para a saúde, a igualdade social e o desenvolvimento sustentável dos seres humanos. E as duas coisas não funcionam separadas. Para maximizar os benefícios oferecidos pelas florestas, precisamos manter intactos os remanescentes de floresta nativa, conservar a biodiversidade, impulsionar a regeneração e restaurar as áreas que costumavam ter floresta.
Precisamos integrar as soluções baseadas na natureza, que tem a ver com o redesenho e o planejamento das paisagens. Pensar o território com olhar de drone e visão de libélula: do alto com a complexidade exigida e onde cabem todos os atores e setores existentes naquele território, mas cabe também a natureza.
Repúdio aos ataques à Mata Atlântica
Em plena Semana da Mata Atlântica, a Comissão Mista da Câmara dos Deputados investe contra um dos biomas mais ameaçados do mundo ao alterar novamente o texto da Medida Provisória (MP) 1.150, reintroduzindo alterações na Lei da Mata Atlântica (Lei 11.428 de 2006) que fragilizam sobremaneira a proteção do bioma, até mesmo os seus raríssimos remanescentes primários. Não satisfeitos com o descaso, na Comissão de Meio Ambiente (CMADS), deputados da mesma laia aferiram também um verdadeiro golpe aos Campos de Altitude, ao debaterem o Projeto de Lei (PL) 364/2019, que postula a retirada dos Campos de altitude da esfera de proteção da Lei.
A Apremavi repudia todas as formas de ataques à Mata Atlântica, se une a sociedade civil e reitera as manifestações postuladas pela Rede de ONGs da Mata Atlântica, pelo Observatório do Clima, pelo Pacto pela Democracia e pelo Fridays for Future.
No contexto da restauração como pauta emergencial para salvar o bioma e ajudar a mitigar às crises climática e de biodiversidade, a Apremavi apresenta o Viveiro Jardim das Florestas. Foto: Miriam Prochnow.
Autoras: Miriam Prochnow e Carolina Schäffer.