A Campanha do Pelotas

A Campanha

A campanha SOS Rio Pelotas é um trabalho de mobilização ambiental realizado pela Apremavi, aberto à parceria de todas as instituições e pessoas interessadas, com o objetivo de preservar o que sobrou do rio Pelotas e também da Floresta com Araucárias e Campos Naturais das suas margens. Participe da campanha clicando aqui.

A campanha está centrada no repasse de informações sobre o rio Pelotas e na coleta de assinaturas para o seguinte texto: “Nós abaixo-assinados solicitamos a criação imediata da Unidade de Conservação Refúgio de Vida Silvestre "Corredor do Pelotas" e nos manifestamos contrários à construção da Usina Hidrelétrica de Pai Querê, por entendermos de fundamental importância a preservação dessa área para a conservação da diversidade biológica, cultural e histórica da região. Não podemos permitir que erros como os de Barra Grande se repitam”.

O abaixo-assinado será enviado às seguintes autoridades: Presidente da República, Ministra do Meio Ambiente, Ministro de Minas e Energia, Representantes do Ministério Público Federal, Governadores de SC e RS.

Depois do enchimento do lago da Usina Hidrelétrica de Barra Grande (saiba mais), que inundou praticamente as últimas áreas ciliares primárias de floresta com araucárias, são nestas margens do Pelotas que agora sobrevivem as últimas áreas de transição da floresta ombrófila mista e de campos naturais da região, fato que confere ao local um alto índice de biodiversidade. Estas formações são atualmente as mais ameaçadas do Bioma da Mata Atlântica.

Por este motivo é fundamental que no local seja criada uma Unidade de Conservação, que possa garantir o fluxo gênico das espécies animais e vegetais e a manutenção da biodiversidade, bem como da cultura e da história da região. Caso a hidrelétrica de Pai Querê seja construída, o rio Pelotas vai desaparecer por completo e junto com ele esses raros fragmentos florestais do Bioma da Mata Atlântica.

Participe. Não deixe o rio Pelotas desaparecer. Vamos apoiar a proposta de criar o Refúgio de Vida Silvestre “Corredor do Pelotas”, para o bem das presentes e das futuras gerações.

Comentários de quem já participou

Para saber quem já participou e deixou seu comentário acesse aqui.

Veja o que escreveu o Sr Ariovaldo Palhano Ribeiro, morador da região: "Me coloco como morador de Bom jesus-RS, um dos locais que seria atingido caso fose construída a barragem. Pelo pouco conhecimento que tenho e tendo em vista experiências anteriores mal sucedidas da intalação de UHE’s na região (Machadinho , Itá, Barra Grande) todas no mesmo rio. Percebo assim como crucial a manutenção do rio pelotas, fluxo de águas, sendo fundamental para conservação natural da região, ou seja a construção de uma barragem dessas proporções (Pai Querê) estaria condenando a região a uma estagnação e consequentemente causando problemas imensuráveis a biodiversidade bem como a perda da qualidade de vida dos moradores. Pelo contrário a criação da Unidade de Conservação provavelmente garantiria a manutenção das belezas naturais evitando por exemplo mudanças climáticas radicais bem como perda de biodiversidade".

Como ser parceiro na campanha

Existem várias maneiras de parceria. Uma delas é auxiliar na divulgação da campanha, através de outros sites, mala direta, boca-a-boca. As instituições que quiserem assinar a campanha junto com a Apremavi podem enviar esta solicitação ao seguinte email: info@apremavi.org.br. Veja as instituições que já estão apoiando.

A campanha também prevê a possibilidade de serem impressas folhas para a coleta de assinaturas em escolas, instituições e na comunidade. Quem quiser participar desta forma, pode imprimir o abaixo-assinado, que se encontra no site, coletar as assinaturas e enviá-las para a Apremavi (Caixa Postal 218 – 89160-000 Rio do Sul – SC).

Maiores informações:

Geraldine Marques Maiochi
Maria Luiza Schmitt Francisco

info@apremavi.org.br
(47) 3521-0326

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Por que salvar a Serra Vermelha?

Cerca de 78 mil hectares de matas nativas de Carrasco – uma mescla de Caatinga, Cerrado e do que resta de Mata Atlântica no Piauí – estão virando carvão no Sul do Estado. Uma decisão unânime do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) sugere que a área deveria formar o Parque Nacional da Serra Vermelha. No entanto, um projeto ironicamente denominado Energia Verde, incentivado pelo Ministério do Meio Ambiente e aprovado pelo Ibama, autoriza a empresa JB Carbon S/A, do Rio de Janeiro, a derrubar a última floresta do semi-árido brasileiro para produção de carvão.

O objetivo do empreendimento é abastecer as indústrias siderúrgicas do país e do exterior. No primeiro momento o carvão vegetal produzido na Serra Vermelha está sendo consumido por duas siderúrgicas, a Ferguminas, em Minas Gerais, e Fergumar, no Maranhão, alimentando os fornos que produzem ferro gusa. A meta é ultrapassar quatro milhões de toneladas de carvão nos 13 primeiros anos do projeto. Entre os investidores do negócio, aparecem empresas como a JBW Partners Comércio, Importação e Exportação.

Para o biólogo Francisco Soares, presidente da Fundação Rio Parnaíba (FURPA), o empreendimento é responsável pelo maior crime ambiental do Nordeste e um dos maiores do país. "É um grande desmatamento camuflado de plano de manejo", disparou. Já o proprietário da empresa JB Carbon, João Batista Fernandes, afirma que o projeto é de Manejo Florestal Sustentável – um dos maiores do mundo em volume de biomassa. "Fizemos um cronograma de desmate em 13 lotes alternados que serão explorados anualmente. Em 14 anos a floresta estará maior do que a atual", disse o empresário carioca ao rebater as criticas ao projeto.

Falando em nome do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – Ibama, o diretor do departamento técnico, Carlos Antônio de Moura Fé, disse haver uma confusão entre desmatamento e manejo florestal. "O manejo permite que você corte a árvore deixando parte do seu caule para a rebrota. No momento, a JB Carbon possui uma licença para manejar 5,9 mil hectares e uma nova aérea só será autorizada depois de duas vistorias no local. Após o corte de uma área, ela ficará intocada por 13 anos, tempo suficiente para a recomposição da floresta", garantiu.

"Um Plano de Manejo Florestal Sustentável, não permite o corte raso, com a utilização de toda madeira acima de 2cm no limite aprovado, com a intensidade de corte de 100% da produção florestal. A retirada das árvores teria que ser de forma seletiva e seria necessário ainda outras exigências técnicas. Diante da dimensão do projeto, não foi elaborado o Estudo nem o Relatório de Impacto Ambiental, e, para piorar, não foram realizadas audiências públicas", acusa o biólogo Francisco Soares.

No começo do ano, os procuradores federais Tranvanvan Feitosa e Carlos Wagner Barbosa Guimarães, ambos do Ministério Público Federal, que já tinha alertado o Ibama sobre as deficiências do empreendimento, ingressaram com uma ação civil pública na Justiça Federal, solicitando a suspensão do projeto Energia Verde. Alguns dias depois o juiz federal Clodomir Sebastião Reis, decidiu citar o Ibama e a empresa JB Carbon para que forneçam maiores informações sobre o projeto.

Localizado a mais de 800 km da capital Teresina, numa grande chapada da Serra Vermelha , ocupando áreas dos municípios de Morro Cabeça no Tempo, Curimatá e Redenção do Gurguéia, o projeto Energia Verde fica dentro do condomínio Chapada do Gurguéia, que tem área de 114 mil hectares, divididos em 38 fazendas, entre 19 proprietários. Existem suspeitas sobre a legalidade das terras na região. Em 2005 o Interpi (Instituto de Terras do Piauí) iniciou três ações discriminatórias para investigar a origem das propriedades na área. Num desses processos os técnicos do órgão tentam devolver ao patrimônio imobiliário do Estado do Piauí pelo menos 25 mil hectares.

A área aprovada para manejo florestal pelo projeto Energia Verde, cerca de 77.948 hectares, é maior do que muitos Parques Nacionais, a exemplo de Sete Cidades no Piauí e Ubajara no Ceará. Além disso, a região foi indicada entre as 900 áreas prioritárias para a Conservação da Biodiversidade Brasileira, conforme Relatório Nacional para Convenção sobre Diversidade Biológica, publicado pelo Ministério do Meio Ambiente.

"Os brejos de altitudes e vários mananciais que descem da Serra Vermelha contribuem para formar as nascentes do rio Rangel, além de outros córregos e mananciais que alimentam a bacia do rio Gurguéia. A cobertura vegetal exerce um papel importante na recarga dos aqüíferos e do lençol freático", explica Francisco Soares. Para ele, a produção de carvão vegetal vai comprometer a bacia dos rios Rangel, Curimatá e Gurguéia, podendo secar riachos e lagoas e até alterar o clima da região, aumentando a própria temperatura local.

Pesquisas lideradas pela equipe do biólogo Hussam Zaher, do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo, no Parque Nacional Serra das Confusões e na Estação Ecológica Uruçuí-Una – duas reservas localizadas nas proximidades da Serra Vermelha – indicam que a região abriga uma das maiores biodiversidades do interior nordestino, com espécies desconhecidas pela ciência.

Segundo os procuradores, Tranvanvan Feitosa e Carlos Guimarães, o Ministério do Meio Ambiente precisa rever o projeto e suas implicações ecológicas. "O Ibama desconsiderou a biodiversidade da Serra Vermelha e o potencial da floresta para o mercado de créditos de carbono, optando pela utilização mais fácil e de retorno imediato com a produção de carvão. No ritmo aprovado, as florestas do Piauí vão virar cinza em pouco tempo" afirmaram os representantes do Ministério Público Federal.

O deputado federal José Francisco Paes Landim (PTB), em discurso na Câmara dos Deputados, denunciou que o empreendimento estava destruindo uma área que futuramente poderia ser parte de uma reserva natural. O parlamentar enfatizou a necessidade de criação do Parque Nacional Serra Vermelha tendo em vista que "um grande desmatamento compromete a integridade da natureza e pode dificultar a intenção do governo brasileiro em criar essa nova unidade de conservação no Piauí". Já o deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ), solicitou que o presidente do Ibama, Marcus Barros, seja ouvido na Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados para dar explicações sobre o caso.

A forte repercussão do impacto ambiental do projeto tem chamado a atenção dos veículos de comunicação do Brasil e do exterior. A maior emissora brasileira de televisão mandou seus repórteres para a região e uma equipe de tv italiana gravou reportagem sobre o caso. Em Teresina, a Fundação Rio Parnaíba, com apoio de várias ONGs lançou a campanha "ajude a salvar a Serra Vermelha" pedindo que as pessoas telefonem ou enviem e-mails para linha verde do Ibama solicitando a criação do Parque Nacional Serra Vermelha e a paralisação do projeto Energia Verde.

MANEJO POLÊMICO

O Projeto Energia Verde faz parte do Plano de Desenvolvimento da Bacia do Rio Parnaíba (Planap), através da Companhia de Desenvolvimento do Vale dos Rios São Francisco e Parnaíba (Codevasf). Aprovado pela Secretaria do Meio Ambiente do Piauí, é um empreendimento que comercializa lenha e carvão para atendimento da demanda energética de diversos setores da economia, tanto do mercado interno como para exportação.

A técnica de exploração utilizada é a do corte raso sem destoca em unidades de produção anual (UPAs) que terão 100% do material lenhoso acima de 2cm aproveitado. "Apenas 4,2% da área total é utilizada anualmente para desmate sob forma de manejo e as áreas de corte foram desenhadas de forma alternada para assegurar o fluxo da fauna", explicou Alessandro Fernandes, diretor da JB Carbon e filho do empresário João Batista Fernandes.

Liderado pela empresa carioca, o projeto está sendo executado no condomínio Chapada do Gurguéia, formado por mais de 30 propriedades. O negócio tem financiamento do Banco do Nordeste e ganhou isenção fiscal do Governo do Piauí por 12 anos. "Nosso objetivo era plantar soja, porém, terminamos convencidos a transformar o projeto num manejo florestal sustentável", explicou o engenheiro Elizeu Rossato Toniolo. "Firmamos parcerias com várias instituições, entre elas o Programa Nacional de Florestas e o Projeto de Conservação e Uso Sustentável da Caatinga" – um programa financiado pelo PNUD, órgão das Nações Unidas.

Apesar da polêmica envolvendo o projeto Energia Verde, o funcionário do Ibama e coordenador do programa de Conservação e Uso Sustentável da Caatinga, Francisco Campelo, aparece em informe publicitário da empresa JB Carbon promovendo o empreendimento que tem fins lucrativos. "Como funcionário público federal, principalmente de um órgão ambiental, ele não poderia defender um negócio que tem interesses comerciais", denuncia o presidente da Furpa. Por coincidência, o irmão de Francisco Campelo, engenheiro florestal Ricardo Campelo, é um dos responsáveis técnicos pelo empreendimento.

Além do apoio governamental, tanto na esfera federal através do Ministério do Meio Ambiente e Ibama ou via governo do Estado do Piauí, a empresa JB Carbon ainda conseguiu duas autorizações do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) para prospectar minério de ferro nas proximidades da Serra Vermelha. A JB Carbon também aparece como uma das doadoras de recursos para campanha de reeleição do governador do Piauí, Wellington Dias (PT).

Em recente fiscalização na fazenda onde o projeto Energia Verde vem sendo executado, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT-PI) encontrou uma série de irregularidades trabalhistas. A empresa foi multada em 50 mil reais por danos coletivos e obrigada a pagar cerca de 200 mil reais a título de indenização aos trabalhadores. Cada empregado vai receber cerca de R$ 1.400. Como a empresa alegou não dispor de numerário suficiêncte, os funcionários receberam R$ 100,00 em espécie e R$ 1.300,00 em cheques.

PARQUE AMEAÇADO

A criação do Parque Nacional Serra Vermelha pode ficar comprometido com o desenvolvimento do projeto Energia Verde. Com planos para desmatar 78 mil hectares, o empreendimento vai causar uma enorme ferida na mata. A densa floresta que cobre o lugar levou séculos para chegar em seu estágio atual. "O desmatamento vai descaracterizar sua formação, causando riscos e prejuízos em toda cadeia natural. Esses parâmetros não foram mensurados e, o mais grave, não existe projeto piloto que demonstre que a mata vai se regenerar", explicou o biólogo Francisco Soares.

Na área da botânica o lugar é um desafio para os pesquisadores. Não existe bibliografia sobre a região. Ocupada por formações de Caatinga arbórea – plantas com porte de árvores – que permanecem com sua copa verde o ano inteiro, o local também tem elementos do Cerrado e da Mata Atlântica, formando uma cadeia de alta diversidade biológica e importante funções ambientais numa região com reduzida interferência humana.

Pesquisas da Fundação Museu do Homem Americano, liderados pela arqueóloga Niéde Guidon, definem a Serra Vermelha como área de provável passagem dos povos pré-históricos que habitaram o Nordeste há mais de 50 mil anos. Pinturas e gravuras rupestres, muitas delas sequer catalogadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), podem ser encontradas na fronteira entre a Serra Vermelha e a Área de Proteção Ambiental do Rangel, uma reserva estadual com dezenas de sítios arqueológicos.

DESERTIFICAÇÃO PODE AUMENTAR

Segundo a ONU, a região de Gilbués, no Sul do Piauí, abriga o maior núcleo de desertificação da América Latina e um dos mais críticos do mundo. A pequena cidade de Gilbués é a mais afetada, ilhada pela erosão. Para o Ministério do Meio Ambiente, os municípios vizinhos de Monte Alegre, São Gonçalo do Gurguéia, Barreiras, Corrente, Riacho Frio e Curimatá também estão incluídos na área afetada pelo processo de degradação ambiental.

Teoricamente esses municípios deveriam ser assistidos tecnicamente pelos órgãos oficiais, controlando as interferências humanas e pesquisando suas características naturais. Ao contrário, a implementação do projeto Energia Verde no município de Curimatá parece contradizer todo esse diagnóstico. "O desmatamento nas chapadas da Serra Vermelha vai contribuir para o avanço do processo de degradação", confirma o biólogo Francisco Soares.

NOVAS ESPÉCIES

No passado, parte da América do Sul tinha um tipo de vegetação que hoje os cientistas chamam de Carrasco. São áreas no alto de chapadas, cobertas por uma mistura de floresta seca e relativamente densa com uma savana mais aberta – quase uma mescla de Cerrado e Caatinga. Em alguns lugareshouve contato entre essas formações e a Mata Atlântica. É o que parece ter acontecido na Serra Vermelha, sul do Piauí.

Recentemente uma espécie de cágado ainda desconhecida foi encontrada no local. O animal se encontra no Museu de Zoologia da USP sendo descrito por pesquisadores da equipe de Hussam Zaher. "A possibilidade de existir animais novos é muito alta", diz o biólogo Luis Fábio da Silveira, que esteve na região.

Somando-se a esse importante achado, a descrição de duas novas espécies de lagartos, o Stenocercus quinarius, no Parque Nacional Grande Sertão Veredas, e Stenocercus squarrosus, no Parque Nacional Serra das Confusões, publicada na revista científica "South American Journal of Herpetology" confirmam a alta biodiversidade do Carrasco, rico em espécies endêmicas e com características geomorfológicas e de vegetação que o diferem das fisionomias típicas do Cerrado e da Caatinga.

Para os cientistas, o Carrasco pode ser o remanescente de um domínio anterior aos atuais, modificado por processos naturais – climáticos e geológicos. As duas novas espécies têm distribuição aparentemente restrita, ou seja, exclusivas de regiões especiais no Cerrado e seu contato com a Caatinga, áreas prioritárias para a conservação, revisadas recentemente pelo Ministério do Meio Ambiente.

"As áreas de Carrasco guardam informações biológicas antigas e únicas. Não se sabe quais as origens deste tipo de ambiente já bastante impactado", alerta Cristiano Nogueira, analista de biodiversidade da (CI). Segundo ele, a destruição da vegetação ressalta o risco que as novas espécies correm no exato momento em que "nascem" para a ciência: como todo o resto do Cerrado, da Caatinga e das Florestas Estacionais, seu habitat sofre com o desmatamento, que alimenta as carvoarias e o avanço da fronteira agrícola.

Fotos: Andre Pessoa

Terras Griladas

Pelo menos cerca de 40 mil hectares do condomínio Chapada do Gurguéia, responsável pelo projeto Energia Verde, podem ser, com muita probabilidade,terras públicas. A documentação apresentada pela empresa JB Carbon S/A junto à Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Naturais – Semar, foi definida pelo Interpi (Instituto de Terras do Piauí), como integrantes de um típico caso de grilagem encoberto sob a forma de um condomínio.

Os documentos datados de 1929 e que segundo o empreendimento tem origem em título sesmarial, não demonstram sequer, o nome da Sesmaria. Segundo os técnicos do Interpi a concessão teria ocorrida num Brasil Reinado, o que ultrapassa o período legal desta prática – na época o Brasil já era uma República. As Cartas de Sesmarias foram concedidas no Estado do Pará.

Para o Interpi, nesse período, o território do Piauí estava sob a competência do Governo-Geral de Pernambuco, o que caracterizaria outra irregularidade na documentação. Em 2005, ao tomar conhecimento do relatório emitido pelo Interpi, o Ministério Público do Estado do Piauí recomendou a Semar à anulação de qualquer autorização ou licença ambiental favorável a JB Carbon S/A.

Inconformados com a decisão, a empresa resolveu anexar ao processo outros documentos obtidos junto ao arquivo público estadual. Questionado sobre os novos dados apresentados, o Interpi se posicionou através de um despacho assinado pelo diretor geral do órgão, Francisco Guedes Alcoforado Filho, onde encaminhava o mesmo Parecer Jurídico contrário ao empreendimento.

O estranho é que mesmo diante de tantas evidências de irregularidades, o chefe da Assessoria Judiciária da Procuradoria Geral de Justiça, Erivan José da Silva Lopes, decidiu emitiu parecer favorável a concessão da licença ambiental a JB Carbon S/A, até que o Interpi se manifeste especificamente sobre os novos documentos anexados ao processo.

Foi com essa decisão do Ministério Público do Estado do Piauí que a empresa JB Carbon S/A conseguiu a autorização oficial para implantação do projeto Energia Verde numa área de 114 mil hectares entre os municípios de Curimatá, Morro Cabeça no Tempo e Redenção do Gurguéia. O objetivo do negócio é transformar 78 mil hectares de florestas em carvão vegetal.

IMÓVEIS SOB SUSPEITAS

O condomínio Chapada do Gurguéia, localizado na Serra Vermelha, no Sul do Piauí, é formado por 38 fazendas divididas entre 19 proprietários. O menor imóvel tem área de 650 hectares e o maior 5 mil hectares. Na média, as propriedades tem cerca de 2.500 hectares. Segundo o Interpi, cerca de 74 mil hectares têm como primeiros proprietários Dílson Lustosa e Romoaldo Lustosa e Silva, e não foram objeto de processo de demarcação de terras particulares, não sendo advindas de demarcação em data alguma.

Os documentos que supostamente comprovariam a legitimidade das terras do condomínio foram expedidas pelos oficiais dos registros de imóveis das comarcas de Avelino Lopes e Redenção do Gurguéia, além de certidões translativas de documentos existentes no arquivo público estadual. A dúvida diz respeito à cadeia dominial dos imóveis.

Segundo Erivan Lopes, chefe da Assessoria Judiciária da Procuradoria Geral de Justiça, até que se prove o contrário, os documentos apresentados pela JB Carbon S/A gozam de presunção de veracidade e fé pública. Para ele, sem uma decisão judicial que declare a falsidade ou irregularidade das certidões imobiliárias, não se pode negar a validade e eficácia dos referidos documentos.

"Dando conta da existência dos imóveis e dos respectivos proprietários, a princípio, entende este órgão ministerial que não se deve tolher dos interessados o direito do exercício pleno da propriedade sobre os imóveis em questão, incluindo-se neste exercício dominial o direito de explorá-los economicamente, cumprindo sua função social", argumentou Lopes em seu despacho.

Fotos: André Pessoa

Serra Vermelha perto de virar Parque

Nos dias 12 e 13 de abril, a Rede de ONGs da Mata Atlântica – RMA, com apoio de ambientalistas e instituições do Piauí, realizou, em Teresina, uma série de eventos em prol da defesa da Serra Vermelha.

A notícia mais importante dos eventos e comemorada com muitos aplausos foi o anúncio feito pelo representante do Ministério do Meio Ambiente, Maurício Mercadante, Diretor de Áreas Protegidas, durante o Painel sobre a situação da Mata Atlântica no Nordeste. Ele abriu o painel dizendo que o MMA está decidido e fortemente empenhado no processo de criação do Parque Nacional da Serra Vermelha, uma reivindicação da comunidade piauiense.

A Serra Vermelha, com cerca de 120.000 hectares, é uma área no sul do Piauí, onde se encontram três importantes Biomas: a Mata Atlântica, o Cerrado e a Caatinga. Este fato confere à região uma importância extrema, por conta da altíssima biodiversidade que se encontra em seus remanescentes praticamente virgens, intactos e considerada uma floresta relíctual, ou seja, remanescentes de florestas muito antigas.

Entretanto a Serra Vermelha está ameaçada por um projeto chamado “Energia Verde”, autorizado ilegalmente pelo IBAMA Piauí, no ano de 2006, atualmente paralisado, e que pretende através de um suposto “plano de manejo”, realizar o corte raso de 78.000 hectares da vegetação nativa primária, transformando- a em carvão vegetal para alimentar os fornos das siderúrgicas de Minas Gerais.

A notícia dada pelo MMA, sobre a decisão da criaç ão do parque, traz um novo alento, porque desta forma este projeto, que na realidade é um crime ambiental, deverá ser definitivamente cancelado.

Durante o painel sobre a Mata Atlântica no Nordeste foi também feita uma apresentação, pela coordenadora da RMA e Conselheira da Apremavi, Miriam Prochnow, sobre a situação crítica em que encontram os remanescentes da Mata Atlântica nessa região e a necessidade de se implementar ações imediatas para sua proteção e recuperação.

Ainda no painel, o também coordenador da RMA, Kláudio Nunes, falou sobre a Lei da Mata Atlântica e a Diretora do Instituto Socioambiental, Adriana Ramos, apresentou os resultados do último encontro do Grupo Internacional de Conselheiros do PPG7 – IAG, realizado na Mata Atlântica no ano passado.

No dia 13 pela manhã, coordenadores da RMA, ambientalistas e a comunidade realizaram uma caminhada no centro da cidade, para entregar um documento ao Procurador Geral da República, Tranvanvan Feitosa, contendo uma série de informações técnicas e legais sobre a existência da Mata Atlântica na Serra Vermelha e pedindo providências com relação ao caso. Uma cópia do documento foi também protocolada no Palácio do Governo,endereçadaao Governador do Piauí, Wellington Dias (PT).

Antes da entrega do documento ao Procurador e em frente ao prédio da Procuradoria, a RMA anunciou os vencedores do Prêmio Motosserra de 2007. Os agraciados deste ano são pessoas e instituições que efetivamente contribuíram com a aprovação do projeto Energia Verde, considerado um dos maiores crimes ambientais já cometidos na Mata Atlântica. São eles:

1 – Romildo Mafra – Gerente Regional do IBAMA Piauí, por ter autorizado o projeto Energia Verde.

2 – Carlos Moura Fé – Diretor Técnico do IBAMA, responsável pela aprovação técnica do projeto.

3 – Dalton Macambira – Secretário Estadual de Meio Ambiente do Piauí, por ter concedido a licença estadual para o projeto.

4 – JB Carbon, por ser a empresa autora e implementadora do projeto.

5 – Tasso Azevedo – Ex. Diretor de Florestas do Ministério do Meio Ambiente, por ter apoiado e incentivado o projeto durante sua gestão no MMA

Além dos eventos acima, coordenação nacional da RMA também aproveitou a aportunidade para fazer sua reunião de preparação para a Semana da Mata Atlântica, que ocorrerá em maio de 2007, na cidade de Porto Alegre.Vale lembrar que este ano a RMA completa 15 anos de existência. Em Porto Alegre serão discutidos vários assuntos importantes sobre o futuro do Bioma, não só no Brasil, mas também no corredor trinacional, que envolve o Paraguai e a Argentina.

Para a Coordenadora Geral da RMA, Kathia Vasconcelos Monteiro,essa ação da Rede foi realmente um sucesso. "Tivemos um apoio fabuloso das pessoas e organizações do Piauí e isso mostrou mais uma vez a importância do trabalho em rede e de que somos capazes de mobilizar e realizar ações efetivas e concretas em prol da Mata Atlântica".

Fotos: André Pessoa, Armin Deitenbach e Miriam Prochnow

A Mata Atlântica da Serra Vermelha

A campanha do Ibama do Piauí e dos defensores do desmatamento na Serra Vermelha, que não admitem a existência da vegetação Mata Atlântica, onde o projeto Energia Verde pretende desmatar 78 mil hectares de floresta, contradiz o estudo feito por pesquisadores da Sociedade Nordestina de Ecologia, da Universidade Federal de Recife em parceria com a Rede de Ongs da Mata Atlântica, que se manifestaram exibindo provas que evidenciam a presença da Mata Atlântica na Serra Vermelha.

O estudo que organizaram e está publicado no livro "Mata Atlântica – Uma rede pela floresta", foi realizado em 2005. A responsável pela área do Piauí, Maria das Dores Melo, afirma ter encontrado vegetação da Mata Atlântica naquela área. "Me surpreendi com a quantidade de Mata Atlântica encontrada no Piauí", garantiu a pesquisadora que trabalha com cartografia.

No relatório do seu trabalho, Maria das Dores escreveu que "em mapeamento concluído em 2005, verifica-se que a Mata Atlântica do Piauí abrange uma área de 7.791 Km², correspondendo a 3,10% da superfície do Estado, compreendendo as seguintes formações vegetais: floresta estacional semidecidual, floresta estacional decidual, vegetação de dunas/restinga e manguezal".

Continuando a técnica diz : "as maiores áreas de vegetação estão localizadas nos municípios de Guaribas e Canto do Buriti com a fisionomia de floresta estacional decidual montana e floresta estacional semidecidual submontana, no município de Alvorada do Gurguéia. Além de incluir também os municípios, Morro Cabeça no Tempo, Curimatá, Redenção do Gurguéia, Avelino Lopes e Bom Jesus.

Bem antes deste estudo, o Conselho Nacional do Meio Ambiente-Conama, havia definido na Resolução n° 26 de dezembro de 1994, orientar os procedimentos para licenciamento de atividades florestais no Piauí. O órgão, que tem como presidente a Ministra do Meio Ambiente, Mariana Silva, proíbe a devastação da vegetação no estado primário, ou seja, aquela com diversidade biológica, como é o caso da Serra Vermelha.

No artigo 1º diz: Vegetação primária é aquela de máxima expressão local, com grande diversidade biológica, sendo os efeitos das ações antrópicas mínimos, a ponto de não afetar significativamente suas características originais de estrutura e de espécies".
Para completar o número de provas que revelam o quanto as leis foram desobedecidas, uma outra resolução do Conama , n° 001 de janeiro de 1986, determina a obrigatoriedade do Estudo de Impacto ambiental em empreendimentos que causam grandes impactos.

No capítulo XIV, diz que uma das atividades que exige o EIA-Rima é a "exploração econômica de madeira ou de lenha, em áreas acima de 100 hectares ou menores, quando atingir áreas significativas em termos percentuais ou de importância do ponto de vista ambiental".

Enquanto a população que vive na região onde a JB Carbon está desmatando só tem o direito de permanecer calada, o governo do estado concede isenção fiscal de 12 anos para que a empresa permaneça destruindo uma floresta que, sem dúvida, poderia ser a redenção da população.

Veja o decreto no link: http://www.sefaz.pi.gov.br/slpi/gui/jsp/consultaDeAtoNormativo.jsp?idAtoNormativo=1595

A área da Serra Vermelha também é considerada uma área de extrema importância biológica para a conservação da biodiversidade, conforme determina a Portaria do Ministério do Meio Ambiente.

Por esses motivos a transformação da área em uma Unidade de Conservação, é a única maneira de se preservar esses importantes remanescentes e fazer com que seus benefícios ambientais.

Não esqueça de participar da campanha, veja outra matéria neste mesmo site: http://www.apremavi.com.br/pagina.php?codigo=103

Fotos – André Pessoa – Divulgação Furpa

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