Uma expedição integrada por fotógrafos, jornalistas e técnicos, organizada pela ONG Mira-Serra, com a participação da Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida (Apremavi), percorreu por cinco dias no final de fevereiro, a região onde se propõe a criação do Refúgio de Vida Silvestre do Rio Pelotas e dos Campos de Cima da Serra.

A expedição foi realizada com o objetivo de chamar atenção para as riquezas naturais da região (veja também a matéria escrita por Carlos Matsubara), bem como para a situação dramática de pressão sobre os remanescentes de vegetação natural da floresta com araucárias e campos nativos da região, principalmente por desmatamentos, plantios de espécies florestais exóticas e agricultura intensiva.

Essa é ainda uma das áreas em melhor estado de conservação do Sul do Brasil e parte da área pertence à Zona Núcleo da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, patrimônio Mundial segundo a UNESCO. É apontada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) como área de extrema importância biológica e, portanto, prioritária para a conservação da biodiversidade.

O grupo passou pelos municípios de Cambará do Sul, São José dos Ausentes e Bom Jesus, no Rio Grande do Sul e Praia Grande em Santa Catarina, percorrendo aproximadamente 800 Km.

O Município de Cambará do Sul, primeiro a ser visitado, está localizado na região nordeste do Rio Grande do Sul, junto à divisa com o estado  de Santa Catarina. É uma cidade que apresenta baixas temperaturas durante o inverno, com ocorrência de neve.  Além do frio, é conhecida como a cidade dos cânions, sediados dentro dos parques nacionais dos Aparados da  Serra e da Serra Geral.

A cidade de São José dos Ausentes está localizada no extremo nordeste do Rio Grande do Sul, seus cânions também servem como marco divisor dos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. A expedição passou por estradas fascinantes avistando os extensos campos de cima da serra até chegar ao Pico Monte Negro, ponto mais alto do estado.

Além de toda exuberância dos campos, que predominam na região, o grupo pode observar a beleza incomparável da floresta com araucárias e das turfeiras. Entre a diversidade de  espécies vegetais, destaque para as petúnias, orquídeas, cactos, bromélias e a flor símbolo do Rio Grande do Sul, o brinco-de-princesa.

A fauna não ficou atrás, podendo-se encontrar com facilidade as siriemas, pica-paus, curicacas e gralhas azuis. Além das espécies que foram observadas a região também abriga espécies ameaçadas de extinção como a jaguatirica, o puma, o urubu-rei, o gavião de penacho e o papagaio-charão.

Falando em belezas naturais e biodiversidade era impossível finalizar a expedição sem visitar Bom Jesus e observar o Rio Pelotas e um de seus afluentes, o Rio dos Touros.

Na foz do Rio dos Touros fica o Passo de Santa Vitória, passagem obrigatória dos tropeiros para o estado de Santa Catarina, onde se instalou o primeiro posto de arrecadação de impostos da região.

Na travessia do rio, a mula guia passava amarrada numa espécie de botezinho feito com couro de boi, chamado de pelota, por isso o nome do rio: Rio Pelotas. O Passo de Santa Vitória foi palco também de um evento importante da Revolução Farroupilha: o combate de Santa Vitória, em 1839, com a presença de Anita Garibaldi lutando para derrubar as forças do império.

Além de sua importância histórica e cultural, o Rio Pelotas é muito importante do ponto de vista biológico. É o principal afluente do Rio Uruguai, formando uma das maiores bacias hidrográficas do Sul do Brasil. Suas águas passam ainda pela Argentina e pelo Uruguai e mais tarde se juntam ao rio Paraná para formar o grande Rio da Prata.

É um lugar sem igual, a paisagem é surpreendente, entre montanhas e remanescentes de Mata Atlântica é um rio que tem história, que reserva um alto potencial turístico para a região, importante para o desenvolvimento sustentável e para a conservação da biodiversidade.

Toda a biodiversidade que existe nesses locais se manteve desde a chegada dos primeiros habitantes devido às barreiras geográficas que limitaram o acesso do homem a determinadas áreas, e sobretudo, pelo tradicional modo de vida, baseado na agricultura familiar e pecuária extensiva.

Esse cenário de beleza e riqueza natural, cultural e histórica encontra-se ameaçado por plantios desordenados de pinus e batata, com altos índices de aplicação de agrotóxicos e pela construção de mais uma grande hidrelétrica, a de Pai Querê, que se for construída, será a quarta grande hidrelétrica sequencial no sistema Pelotas-Uruguai, compromentendo irremediavelmente toda a biodiversidade e cultura da região e inundando o que resta do Rio Pelotas. O Rio Pelotas deixará de existir, virará uma sequência de grandes lagos.

Temendo pelo futuro comprometido das riquezas naturais que compõem a região, a proposta de criação de um Refúgio de Vida Silvestre ao longo do Rio Pelotas e seus principais afluentes, tem como objetivo garantir a manutenção da biodiversidade em harmonia com as populações que ali vivem, com grande estímulo para a verdadeira vocação da região: o agro-ecoturismo.

Fica a lembrança de uma expedição encantadora, histórica, de aventura e de conhecimento de parte da identidade cultural do Brasil.

No Ano Internacional da Biodiversidade, apoie a criação do Refúgio de Vida Silvestre do Rio Pelotas e dos Campos de Cima da Serra, acessando a Campanha SOS Pelotas. Confira também as imagens da expedição realizada em setembro de 2006, durante uma descida do rio em botes de rafting, que durou três dias.

Confira também a matéria publicada em março de 2010, no Jornal Extra Classe (anexo).

Fotos: Tatiana Arruda Correia

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