O Código Florestal da destruição

O relator Deputado Paulo Piau do PMDB de Minas Gerais (principal partido da base do governo Dilma) escreve com destaque em seu parecer (1) que se orgulha do trabalho na Câmara dos Deputados (relatório do Deputado Aldo Rebelo). Essa sincera opinião de deputado reflete-se concretamente nas alterações por ele propostas em seu parecer no texto do Senado.

O relatório do Deputado Piau nos leva a concluir duas coisas (não excludentes). Ou a bancada ruralista perdeu totalmente a noção dos limites (o céu é o limite) e está se sentindo muito a vontade, jogando no seu próprio campo, e pretende impor uma derrota antológica ao governo (do PT) com vitória do governo do PMDB; ou, o que é mais provável, trata-se de um jogo de cena perfeitamente combinado (como disse Marina Silva, um perfeito telequete)(2) entre a bancada ruralista e o Palácio do Planalto. Tal jogo de cena se materializará em uma disputa de cartas marcadas no Plenário na Câmara entre apoiadores do (suposto) acordo do Senado versus a bancada ruralista da Câmara. Ou ainda pior, as duas hipóteses, jogo de cena, no seu próprio campo. Na peleja encenada, o Governo derruba (p.ex.) 80% dos absurdos propostos pelo deputado Piau e a Presidenta Dilma vetaria um ou outro absurdo que eventualmente passar no Plenário da Câmara.

O governo tentará, com isso, minimizar o risco de um grande constrangimento para a presidenta na Rio+20, ao sancionar o texto do Senado piorado, sob a alegação, já vocalizada por líderes do governo depois da votação no Senado, de que foi o possível considerando a correlação de forças no parlamento.

O relatório do Deputado Paulo Piau, membro da base de apoio do Governo Dilma, consegue a façanha de unir o que tem de pior das duas versões já aprovadas, pela Câmara e pelo Senado, inclusive suprimindo os poucos e insuficientes avanços ambientais introduzidos quase a fórceps no texto do Senado.

Cabe-nos denunciar esse evidente jogo de cena (cujo roteiro e atores principais podem variar no dia do ato) e trabalhar pela rejeição in totum do relatório do Deputado Piau na próxima 3ª feira,dia 24, se realmente for a votação. Infelizmente, com esse telequete do código florestal, o Brasil põe em risco sua condição de líder destacado nas negociações relevantes em torno da agenda socioambiental global.

No mérito seguem abaixo os principais problemas do relatório do Piau que reforçam a idéia do jogo de cena em campo “alheio” (3).

Análise parecer do Relator Deputado Federal Paulo Piau para o código florestal

1. O relator rejeita o artigo primeiro do texto aprovado pelo Senado que apesar de ser apenas principiológico (não estabelece obrigações), define uma série de princípios que caracterizam o código florestal como uma lei ambiental. Ao rejeitar esse dispositivo, o relator reforça a tese de que o Congresso está transformando o código florestal em uma lei de consolidação de atividades agropecuárias ilegais, ou uma lei de anistia.

2. O relator resgata o conceito original, incerto e genérico (da versão da Câmara) de pousio (art.3º XI). Na prática essa alteração significa a consolidação de desmatamentos ilegais posteriores a 2008 que serão caracterizados como áreas em pousio e vai permitir ainda novos desmatamentos legais em propriedades com áreas abandonadas, o que hoje é vedado pela Lei vigente.

3. O novo relatório propõe, ainda, – o que é coerente com a alteração referida no item 2-, a exclusão do conceito de áreas abandonadas ou sub-utilizadas previsto no artigo 3º, inciso XX, do texto do Senado. Isso pode comprometer o próprio Programa ABC (Agricultura de Baixo Carbono), cujo objetivo é criar incentivos à redução de emissões do setor agropecuário mediante o resgate dessas áreas para a produção. Cai um instrumento legal de pressão por recuperação e otimização produtiva de áreas hoje sub-utilizadas ou abandonadas na medida em que poderão ser abertas novas áreas de vegetação nativa nessas propriedades.

4. O relatório dispensa a proteção de 50 metros no entorno de veredas o que significa não somente a consolidação de ocupações feitas nessas áreas como inclusive novos desmatamentos, pois deixa de existir uma faixa de proteção das veredas, sendo somente as veredas consideradas área de preservação. É como se o relator definisse somente a nascente como área de preservação e dispensasse a faixa no entorno dessa nascente como de preservação permanente. Para o bioma Cerrado, o mais ameaçado hoje pela expansão indiscriminada da agricultura, essa exclusão dos 50 metros de faixa de proteção significa a condenação das veredas.

5 . O relator suprime APP de reservatório natural com menos de 1 ha (art. 4º, §4º). Retoma a redação da Câmara o que significa acabar com APP nesses reservatórios (altamente vulneráveis) sob o argumento de que muitos deixam de existir em função das longas estiagens.

6. O Dep. Piau aumenta as possibilidades legais de novos desmatamentos em APP ao excluir (§6º do artigo 4º) a restrição para novos desmatamentos nos casos de aqüicultura em imóveis com até 15 Módulos fiscais (na Amazônia, propriedades com até 1500ha).

7. O relatório amplia de forma indiscriminada a possibilidade de ocupação nos manguezais ao manter a separação dos Apicuns e Salgados e delegar o poder de ampliar as áreas de uso aos Zoneamentos, sem qualquer restrição e manter somente os §§ 5º e 6º do art. 12.

8. No art. 16, o relatório retoma o § 3º do texto da Câmara para deixar claro que no cômputo das Áreas de Preservação Permanente no cálculo do percentual de Reserva Legal todas as modalidades de cumprimento são válidas: além da regeneração e da recomposição, também a compensação que poderá ser feita em outros estados.

9. O relatório exclui critérios técnicos para manejo florestal facilitando a “supressão de árvores” em propriedades rurais. Isso significa estímulo à degradação florestal em RL (com a alteração do artigo 23).

10. Ao suprimir o parágrafo 10 do artigo 42 o relator propõe que incentivos inclusive econômicos inclusive com recursos públicos possam ser investidos para proprietário que desmatou ilegalmente depois de julho de 2008. Instituição da corrupção ambiental. O crime passa a compensar de fato com estimulo de governo.

11. Ao suprimir o artigo 43 do Senado o relatório elimina um dos poucos dispositivos que vincula recursos à recomposição de APPs.

12. O Deputado Piau ressuscita a emenda 164 (de sua autoria na Câmara) que delega aos Estados a definição do que será consolidado em APP (supressão dos §§ 4º, 5º e 7º do art. 62) remetendo aos PRAs a regularização das propriedades e posses rurais. É o dispositivo da institucionalização da anistia. Sequer os 15 metros mínimos do Senado foram acatados pelo Dep. Piau.

13. O relatório do Piau exclui também os §§ 13 e 14 do artigo 62 que tratam da possibilidade de exigências superiores às constantes na Lei, nas bacias hidrográficas consideradas críticas e das propriedades localizadas em área alcançada pela criação de unidade de conservação de proteção integral. A supressão do §13 condena mais de 70% das bacias hidrográficas da Mata Atlântica que já tem mais de 85% de sua vegetação nativa desmatada.

14. No art. 64, o relator Piau consolida pecuária improdutiva em encostas, bordas de chapadas, topos de morros e áreas em altitude acima de 1800 metros.

15. Suprime o art. 78, que veda o acesso ao crédito rural aos proprietários de imóveis rurais não inscritos no CAR após 5 anos da publicação da Lei. Com isso elimina um dos dispositivos de pressão para o cadastramento ambiental rural dos móveis e para que os estados de fato regulamentem e implementem os cadastros em no máximo 5 anos. Retira a eficácia do CAR.

André Lima é Advogado (OAB-DF 17878), mestre em gestão e política ambiental pela UnB, Consultor Jurídico da Fundação SOS Mata Atlântica, Consultor de Políticas Públicas do IPAM, Sócio-fundador do Instituto Democracia e Sustentabilidade e membro da Comissão de Direito Ambiental da Ordem dos Advogados do Brasil-DF.

(1) Logo no inicio do seu voto na pág. 08.
(2) Para os que nunca viram um telequete, vejam esse video gravado na 47a festa da Uva em Colombo no PR: http://t.co/L649hpMU
(3) Esta lista de problemas analisa apenas as novidades contidas no relatório do Deputado Piau. P/ os principais problemas do relatório do Senado, que foram recepcionados pelo relatório do dep. Piau veja link na nota de roda-pé anterior.

Redes ampliam articulação das ONGs

A Federação de Entidades Ecologistas Catarinenses (FEEC) e a Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA) convidam as suas filiadas a atualizarem os seus dados cadastrais. O convite também é extensivo a novas organizações que queiram participar desse importante momento de articulação, visando estimular e otimizar os trabalhos  das ONGs ambientalistas em Santa Catarina e na Mata Atlântica.

Com a proximidade da Rio+20, o  momento é de articulação e por isso solicitamos que todos participem.  Os contatos devem ser feitos com Daiana Tânia Barth, através do email daiana@apremavi.org.br ou telefone (47) 35350119. Este contato está sendo feito através da Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida (Apremavi) porque a instituição é atualmente a entidade Elo da RMA em Santa Catarina e também exerce a Coordenação Administrativa/Financeira da FEEC.

Sobre a FEEC e a RMA

Como todos sabem, o século XX foi um dos mais intensos para o movimento ambientalista com a criação de centenas de Organizações não Governamentais (ONGs) e Movimentos Sociais, que tinham como objetivo a preservação e recuperação do meio ambiente, num momento em que havia muito desmatamento e poluição a serem combatidos. Em Santa Catarina, um dos fatos marcantes foi a fundação, em 1988, da Federação de Entidades Ecologistas Catarinense (FEEC), que nasceu com o objetivo de juntar esforços entre as ONGs catarinenses, constituindo-se numa referência de integração do trabalho ambiental no estado.

Outro momento marcante a Rio 92, que fez surgir uma série de novas articulações, entre elas a Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA), fundada em junho de 1992, com o objetivo de unir esforços para a proteção do segundo Bioma mais ameaçado de extinção do mundo, a Mata Atlântica.

Em 2012 a FEEC completa 24 anos de existência, tendo promovido importantes ações ambientais em Santa Catarina. Denunciou desmatamentos, poluição e outras práticas nocivas ao ambiente e atuou e atua na indicação de representantes para vários conselhos, como o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), o Conselho do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA), o Conselho Estadual de Meio Ambiente (CONSEMA), entre outros.  Em 1997, a FEEC foi valente ao criar o “Prêmio Porco” e o “Prêmio Qualidade de Vida”. Os prêmios eram concedidos a pessoas físicas e jurídicas cujas atividades na perspectiva ambiental eram incoerentes e nocivas à natureza ou então, pelo lado positivo, que se destacavam na melhoria da qualidade de vida da população catarinense.  

Durante a sua trajetória a FEEC acompanhou o nascimento de diversas ONGs no estado, apoiou a aprovação da Lei da Mata Atlântica, realizou campanhas de mobilização, acompanhou os estudos para criação de importantes Unidades de Conservação (UCs) em Santa Catarina, como o Parque Nacional da Serra do Itajaí, o Parque Nacional das Araucárias e a Estação Ecológica da Mata Preta, além de juntamente com a RMA entrar com ação judicial contra a finalização da construção da Usina Hidrelétrica de Barra Grande.

A RMA também coleciona conquistas importantes. O maior destaque foi a luta por uma legislação específica para a Mata Atlântica, que culminou com a aprovação, em 2006, da Lei 11.428/2006 e, em 2008, de seu decreto de regulamentação, o decreto 6.660/2008.  A RMA também defendeu casos emblemáticos como o fechamento da Estrada do Colono, no Parque Nacional do Iguaçu. Além de realizar inúmeras campanhas para a criação de UCs no Bioma.

Outra reivindicação que a RMA viu ser transformada em realidade, foi a implantação de importantes programas de apoio a projetos para Mata Atlântica como o Subprograma de Projetos Demonstrativos (PDA), que foi criado em 1994, dentro do Projeto Piloto para a proteção das Florestas Tropicais do Brasil, o PPG7 e que até o momento continua apoiando projetos efetivos que promovem a conservação da natureza. Outra conquista da RMA foi a criação, no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, do Núcleo Mata Atlântica (NAPMA), que infelizmente foi desativado em dezembro de 2011, mas cujo trabalho foi fundamental para implantar diversas políticas de proteção da Mata Atlântica.

A RMA atualmente tem assento nas principais instâncias de representação da esfera ambiental do país, participa do movimento SOS Florestas e tem acompanhado de perto as discussões sobre as propostas de mudanças no código florestal.

ONGs avaliam primeiro ano do governo Dilma

No dia 06 de março de 2012, diversas organizações da sociedade civil, entre elas a Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida (Apremavi) lançaram em São Paulo um documento para alertar a sociedade brasileira sobre os retrocessos que vêm sendo constatados na área socioambiental e estimular a reflexão para incentivar ações que revertam esse quadro. Já o dia 07 de março foi marcado por uma grande mobilização em Brasília, pelo veto ao texto do novo Código Florestal. A Apremavi também esteve presente na mobilização.

O documento está disponível para ser assinado por pessoas e organizações que concordam com o seu teor. Para tanto basta acessar o seguinte link: Retrocessos na agenda socioambiental do governo Dilma – Petições on line.

As alterações no Código Florestal, a redução de Unidades de Conservação, a redução do poder de fiscalização do Ibama, os atropelos no licenciamento ambiental, a paralisação da agenda climática, a lentidão no saneamento, na mobilidade urbana, na regularização fundiária, o aumento da violência no campo e um Ministério do Meio Ambiente inerte são os itens apontados no documento intitulado “Sobre os retrocessos do governo Dilma”, lançado nesta terça-feira, 6/3,em São Paulo.

João Paulo Capobianco, do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS) explicou que as ONGs decidiram avaliar o conjunto de medidas tomadas pelo atual governo em relação à agenda socioambiental do Brasil e daí concluíram que houve uma inversão em relação ao que vinha sendo aprimorado nos últimos 20 anos. “A decisão de fazer o documento foi para mostrar essa situação e oferecer uma reflexão à sociedade paras estimular iniciativas que possam reverter esse quadro”. Para Márcio Santilli, do ISA, o governo Dilma está rifando o patrimônio socioambiental brasileiro. “Jogamos no lixo o que demoramos muitos anos para acumular”. Santilli foi contundente ao dizer que a presidente precisa ficar atenta. “Dilma precisa saber que o zelo pelo patrimônio nacional é dela”.

Maria Cecilia Wey de Brito da WWF e Paulo Barreto, do Imazon também chamaram a atenção para os retrocessos e para o projeto do Código Florestal aprovado pelo Senado, que será submetido novamente à apreciação da Câmara dos Deputados esta semana.

A ex-senadora e ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, assistiu à coletiva e ao final foi entrevistada por repórteres presentes. Ela afirmou que não só não houve avanço na agenda socioambiental como se está retrocedendo. Mas afirmou que tem esperança de que se a sociedade brasileira mostrar que zela pelo seu patrimônio, a presidente Dilma possa corrigir os rumos.

Veja aqui um quadro resumo do documento.

Íntegra do documento

O primeiro ano do governo da Presidente Dilma Rousseff foi marcado pelo maior retrocesso da agenda socioambiental desde o final da ditadura militar, invertendo uma tendência de aprimoramento da agenda de desenvolvimento sustentável que vinha sendo implementada ao longo de todos os governos desde 1988, cujo ápice foi a queda do ritmo de desmatamento na Amazônia no Governo Lula. Os avanços acumulados nas duas últimas décadas permitiram que o Brasil fosse o primeiro país em desenvolvimento a apresentar metas de redução do crescimento das emissões de carbono e contribuíram decisivamente para nos colocar numa situação de liderança internacional no plano socioambiental.

Ao contrário do anúncio de que a presidente aprofundará as boas políticas sociais do governo anterior, na área socioambiental, contrariando o processo histórico, há uma completa descontinuidade. A flexibilização da legislação, com a negociação para aprovação de um Código Florestal indigno desse nome e a Regulamentação do Artigo 23 da Constituição Federal, através da Lei Complementar 140, recentemente aprovada, são os casos mais graves. A lista de retrocessos inclui ainda a interrupção dos processos de criação de unidades de conservação desde a posse da atual administração, chegando mesmo à inédita redução de várias dessas áreas de preservação na Amazônia através de Medida Provisória, contrariando a legislação em vigor e os compromissos internacionais assumidos pelo país. É também significativo desse descaso o congelamento dos processos de reconhecimento de terras indígenas e quilombolas ao mesmo tempo em que os órgãos públicos aceleram o licenciamento de obras com claros problemas ambientais e sociais.

Esse processo contrasta com compromissos de campanha assumidos de próprio punho pela presidente em 2010, como o de recusar artigos do Código Florestal que implicassem redução de Áreas de Proteção Permanente e Reservas Legais e artigos que resultassem em anistia a desmatadores ilegais. Todos esses pontos foram incluídos na proposta que deve ir a votação no Congresso nos próximos dias, com apoio da base do governo.

Os ataques às conquistas socioambientais abrem espaço para outros projetos de alteração na legislação já em discussão no Congresso. São exemplos a Proposta de Emenda Constitucional que visa dificultar a criação de novas Unidades de Conservação e reconhecimento de Terras Indígenas; o projeto de lei que fragiliza a Lei da Mata Atlântica; os inúmeros projetos para diminuição de unidades de conservação já criadas; a proposta de Decreto Legislativo para permitir o plantio de cana de açúcar na Amazônia e no Pantanal e a discussão de mineração em áreas indígenas.

As organizações da sociedade – que apoiam o desenvolvimento não destrutivo e estão preocupadas com a preservação do equilíbrio socioambiental no país – subscrevem este documento, alertando a opinião pública para o fato de que o Brasil vive um retrocesso sem precedentes na área socioambiental, o que inviabiliza a possibilidade do país continuar avançando na direção do desenvolvimento com sustentabilidade e ameaça seriamente a qualidade de vida das populações atuais e futuras.

CÓDIGO FLORESTAL – É o ponto paradigmático desse processo de degradação da agenda socioambiental a iminente votação de uma proposta de novo Código Florestal que desfigura a legislação de proteção às florestas, concede anistia ampla para desmatamentos irregulares cometidos até julho de 2008, instituindo a impunidade que estimulará o aumento do desmatamento, além de reduzir as reservas legais e Áreas de Proteção Permanente em todo o País. A versão em fase final de votação nos próximos dias afronta estudos técnicos de muitos dos melhores cientistas brasileiros, que se manifestam chocados com o desprezo pelos alertas feitos sobre os erros grosseiros e desmandos evidentes das propostas de lei oriundas da Câmara Federal e do Senado.

Em outras oportunidades, durante os oito anos da administração Fernando Henrique Cardoso e nos dois mandatos da administração de Luís Inácio Lula da Silva, houve tentativas de reduzir os mecanismos legais de proteção a florestas e ao meio ambiente. Mas a maior parte delas foi barrada pelo Executivo, devido à forte contestação da sociedade. Hoje o Executivo se mostra inerte e insensível à opinião pública, a começar pelo Ministério do Meio Ambiente que interrompeu a realização das Conferências Nacionais de Meio Ambiente e tem sido conivente e passivo frente ao desmonte da legislação pertinente à sua área de atuação.

Invertendo aquela tradição, a atual administração deixou sua base parlamentar fazer o que bem entendesse, entrando na discussão quando o fato já estava consumado e de forma atabalhoada. Setores do governo interferiram para apoiar, às vezes veladamente, às vezes nem tanto, as propostas que reduzem as florestas, enquanto a tendência mundial, diante das mudanças climáticas, é aumentar a cobertura florestal.

REDUÇÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO – Nesse primeiro ano, o governo Dilma não criou nenhuma unidade de conservação e, numa atitude inédita, enviou ao Congresso a Medida Provisória nº 558 que excluiu 86 mil hectares de sete Unidades de Conservação federais na Amazônia para abrigar canteiros e reservatórios de quatro grandes barragens, nos rios Madeira e Tapajós. Além de não ter havido prévia realização de estudos técnicos e debate público sobre as hidrelétricas do Tapajós, a Constituição Federal estabelece que a alteração e supressão de áreas protegidas só poderia se dar através de lei, o que levou a Procuradoria Geral da República a impetrar Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) junto ao Supremo Tribunal Federal contra o uso de Medida Provisória pela Presidente.

REDUÇÃO DO PODER DE FISCALIZAÇÃO DO IBAMA – O governo federal eleito com a maior bancada de apoio da história do país, que deveria ser capaz de implementar as reformas necessárias para avançar o caminho da democracia, da governança política, da economia ágil e sustentável, vem dando sinais de ser refém dos grupos mais atrasados encastelados no Congresso. O que o levou a aceitar e sancionar sem vetos a citada Lei Complementar 140, que retirou poderes de órgãos federais, tais como o Ibama e o Conama, fragilizando esses órgãos que tiveram importância fundamental na redução do desmatamento da Amazônia e na construção da política ambiental ao longo dos últimos anos.

ATROPELOS NO LICENCIAMENTO – Mais do que omitir-se diante dos ataques à floresta, o governo federal vem atropelando as regras de licenciamento ambiental, que visam organizar a expansão dos projetos de infraestrutura no Brasil. Diferente do tratamento dado ao licenciamento da BR 163 num passado recente, quando o governo construiu junto com a sociedade um Plano de Desenvolvimento Sustentável da região de abrangência da obra, o licenciamento da Hidrelétrica de Belo Monte é marcado pelo desprezo às regras, às condicionantes ambientais e à necessidade de consulta às populações indígenas afetadas. Esse novo “modus operandi” vem tornando-se prática rotineira, o que ameaça a integridade da região amazônica, onde pretende-se instalar mais de 60 grandes hidrelétricas e 170 hidrelétricas menores. O conjunto de grandes e pequenas hidrelétricas provocará não só mais desmatamento associado à migração e especulação de terras como, ao alterar o regime hidrológico dos rios da região, afetará de forma irreversível populações indígenas e comunidades locais.

PARALISIA NA AGENDA DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS – Entre 2005 e 2010 o Brasil vinha dando passos decisivos ano após ano para avançar a agenda de enfrentamento das mudanças climáticas no cenário nacional e internacional. Esse esforço culminou, em 2009, com a acertada definição de metas para redução de gases de efeito estufa incorporadas na Lei da Política Nacional de Mudanças Climáticas que pautaram a virada de posição das economias emergentes. A regulamentação da lei em 2010 determinou a construção dos planos setoriais para redução de emissões em 2011. Porém o que se viu em 2011 foi uma forte retração da agenda e nenhum dos planos setoriais previstos para serem desenvolvidos no primeiro ano do governo Dilma foram finalizados nem sequer passaram por qualquer tipo de consulta publica.

LENTIDÃO NA MOBILIDADE – A agenda socioambiental caminha vagarosamente mesmo nas áreas apontadas pelo governo como prioritárias — a construção de obras de infraestrutura. O PAC da Copa, lançado em 2009, prevê investimentos de R$ 11,8 bilhões em melhoria da mobilidade urbana, mas só foram efetivados 10%. Já é de conhecimento público que os sistemas metroviários não estarão em operação em 2014. No início deste governo foi lançado o PAC da Mobilidade, mas até o presente momento ainda não foram selecionados os projetos e nenhum contrato para desembolso de verba foi assinado.

LENTIDÃO NO SANEAMENTO – Os investimentos em saneamento também andaram mais devagar do que fazia crer a intensa propaganda eleitoral. Com um orçamento inicial de R$ 3,5 bilhões, o governo investiu efetivamente apenas R$ 1,9 bilhões, valor 21% menor que em 2010. A liberação de recursos pela Caixa Econômica Federal também deixou a desejar (R$ 2,3 bilhões até novembro, apenas 25% do contratado). Peça fundamental de uma estratégia de redução da poluição de nossas águas, o saneamento básico no Brasil tem números vergonhosos: apenas 44,5% da população brasileira está conectada a redes de esgotos; e desse esgoto coletado, somente 38% é tratado (o que significa que mais de 80% do esgoto produzido no Brasil é despejado na natureza).

LENTIDÃO NA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA E AUMENTO DA VIOLÊNCIA NO CAMPO – Não é apenas na criação de unidades de conservação e terras indígenas e quilombolas que a hegemonia dos setores mais retrógrados do país se faz presente. O primeiro ano do governo Dilma foi marcado pelo pior desempenho na área de criação de assentamentos da reforma agrária desde, pelo menos, 1995. O desembolso de recursos com ações para estruturar produtivamente os assentamentos já existentes foi o mais baixo da última década: R$ 65,6 milhões. O processo de titulação de terras indígenas e de quilombos também se arrasta – em 2011, só uma terra de quilombo foi titulada e três terras indígenas homologadas.

Esses retrocessos coincidiram com o aumento da violência no campo. Segundo levantamento do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), 38 índios foram assassinados nos nove primeiros meses do ano passado, sendo 27 no Mato Grosso do Sul, cenário de tensas disputas por direitos territoriais. Esses números são engrossados por pelo menos oito assassinatos de agricultores familiares e/ou extrativistas em disputas com grileiros de terras, principalmente na região norte.

MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE INERTE – Diante desses ataques contra a estrutura e competências de sua pasta, o Ministério do Meio Ambiente, de forma inédita, tem acatado com subserviência inaceitável os prejuízos para as atribuições de órgãos    , como a fragilização do Conama e a redução dos poderes do Ibama na fiscalização e no licenciamento. Frente as agressões ao bom senso e à ciência contidas na proposta do Código Florestal, a Ministra deu seu beneplácito ao aceitar a alegação de que o texto não continha cláusulas de anistia, quando ele claramente concede perdão amplo, geral e irrestrito para a grande maioria dos desmatadores ilegais.

Diante desses retrocessos apontados, as organizações sociais signatárias apelam para que a Presidente cumpra os compromissos assumidos em campanha e retome a implementação da agenda de sustentabilidade no País. Somente uma ação forte nesse sentido evitará os graves prejuízos para a sociedade brasileira e que o Brasil viva o vexame de ser ao mesmo tempo anfitrião e vilão na Rio + 20, em junho deste ano.

Instituto Socioambiental – ISA
Instituto Democracia e Sustentabilidade – IDS
Fundação SOS Mata Atlântica
Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia – Imazon
Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia – Ipam
Instituto Vitae Civilis
Rios Internacionais – Brasil
Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA)
Grupo de Trabalho Amazônica (Rede GTA)
Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida (Apremavi)
Associação Alternativa Terrazul
WWF Brasil
Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará-CEDENPA

Novo Código Florestal promove anistia aos desmatadores

O relator da reforma do Código Florestal, deputado Paulo Piau (PMDB-MG), admitiu que a proposta promove anistias para quem desmatou ilegalmente e a redução de áreas protegidas em propriedades privadas. O texto deve ser votado na Câmara nas próximas semanas.

“Nas disposições transitórias, vai haver perdas, sim. O que você está chamando de anistia. É anistia”, disse o parlamentar, ao responder a uma pergunta feita em debate ontem, na Câmara. As disposições transitórias são a parte do projeto que trata da legalização de desmatamentos irregulares realizados até 2008.

Piau negou que o projeto poderá estimular novos desmatamentos. Mas fez uma ressalva em relação ao artigo que permite a redução da Reserva Legal, de 80% para 50% da propriedade, em municípios da Amazônia que alcançarem mais de 50% de seu território ocupado por terras indígenas ou unidades de conservação.

“Talvez esse seja um ponto, um dos pontos, na Amazônia, que pode ter alguma coisa em termos de desmatamento. Pode ser”, arriscou.

Defensores do agronegócio e os diversos relatores da matéria sempre negaram que a reforma significaria o perdão a quem desmatou e novos desmatamentos. A questão tornou-se importante porque, na campanha eleitoral, a presidenta Dilma Roussef comprometeu-se a vetar qualquer dispositivo que implique as duas consequências.

Rio+20

O deputado disse que o governo tem interesse em votar a matéria o quanto antes para evitar a proximidade com a conferência da ONU sobre meio ambiente que acontece em junho, no Rio de Janeiro. “Essa questão da Rio+20, essa é uma posição – vocês vão ver – até de governo. Estamos ouvindo que, por interesse do governo brasileiro, [não interessa] misturar essas duas coisas [Rio+20 e Código Florestal]”.

O governo teme que, caso a votação seja adiada para perto de junho, a posição do País na conferência saia enfraquecida. O Brasil poderia ser acusado de promover uma lei que flexibiliza a proteção às florestas enquanto cobra de outros países mais empenho na conservação. Ruralistas receiam que a pressão force a rediscussão do projeto que está hoje na Câmara.

As afirmações de Piau foram feitas no seminário “O Código Florestal e a Ciência: o que os legisladores ainda precisam saber”, promovido pelo Comitê Brasil em Defesa das Florestas.

Um documento da assessoria do deputado obtido pela reportagem do ISA revela que seu parecer deverá resgatar alguns dos maiores retrocessos aprovados pela Câmara, no início do ano passado, e alterados pelo Senado, em dezembro. Trata-se de uma tabela que compara os textos aprovados nas duas casas e a provável nova redação proposta pelo deputado (veja o documento) (saiba mais).

Segundo o regimento, na nova votação, os deputados terão de optar, em cada um dos artigos, pela versão do Senado ou a original da Câmara. Podem ser feitas apenas emendas de redação.

Vaia

O coordenador da mesa do seminário, professor José Eli da Veiga, da USP (Universidade de São Paulo), questionou Paulo Piau se ele estaria disposto a pedir o adiamento da votação. O deputado disse que essa decisão caberia ao presidente da Câmara e assegurou que não tem pressa em apresentar seu parecer.

Pouco depois, irritou-se e foi vaiado. “O senhor não é deputado e está se metendo em coisas que são da Câmara. Quem entende de processo legislativo são os deputados, por favor. Vocês têm o direito, como sociedade, de participar de tudo. Agora, representativos somos nós, os deputados. Nós é que temos voto. Não se metam em coisas que não são suas”, disse o relator.

Apesar disso, respondendo a outra pergunta, Piau concordou que a votação poderia ser adiada para dar mais tempo a seus colegas para entender e discutir o assunto. O parlamentar informou que seu parecer estaria pronto provavelmente hoje. Ele vem se reunindo com líderes e bancadas para sondar opiniões e apresentar suas propostas.

Seminário

No seminário, foi lançada uma publicação com artigos de cientistas sobre as consequências do novo Código Florestal (veja o documento). O evento reuniu ainda parlamentares, técnicos, representantes da sociedade civil e do Ministério Público.

A tônica foi de grande descontentamento com a reforma. Os autores da publicação ressaltaram a ausência de embasamento científico e as inúmeras impropriedades conceituais dos textos já votados na Câmara e no Senado.

Eli da Veiga insistiu que o tema tem sido tratado com atropelo no Congresso. “Eu desafio algum deputado a dizer que conhece o projeto do Senado. Ele é um projeto complexo, cujos resultados podem implicar riscos imensos. O que queremos dizer, junto com nossos colegas cientistas, é que numa democracia não se pode votar um assunto dessa importância com esse afogadilho.”

Vários dos palestrantes, incluindo a ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, reiteraram a opinião de que a bancada ruralista estaria usando a estratégia de carregar nas reivindicações e críticas ao projeto vindo do Senado para desgastar o governo e evitar os vetos da presidenta Dilma. Ainda assim, destacaram a preocupação de que o texto possa ser piorado na sua volta à Câmara.

Acesse a matéria na página do ISA.

Mesa de abertura do seminário. Foto: Miriam Prochnow

Código Florestal aprovado no Senado é retrocesso

O texto do Código Florestal aprovado esta semana no Senado Federal representa o maior retrocesso ambiental da história do Brasil. Todos precisam se engajar na campanha pelo veto da presidente.

Vejam abaixo dois textos com opiniões importantes sobre o Código Florestal aprovado. O primeiro texto é um artigo de André LimaAndré Lima, advogado, mestre em gestão e Política Ambiental (UnB), membro da Comissão de Direito Ambiental da OAB-DF, Assessor de Políticas Públicas do IPAM e Consultor Jurídico da Fundação SOS Mata Atlântica e foi escrito no dia posterior à aprovação do texto no Senado.

O segundo texto é uma nota de Wigold Schaffer, ambientalista com mais de 25 anos de experiência e um dos sócios fundadores da Apremavi.

Código florestal é aprovado no Plenário do Senado, com dezenas de emendas fantasmas

André Lima

Sem conhecimento das emendas e sem debates sobre as mesmas, com votação às escuras e com voto de lideranças que contrariaram em alguns casos a maioria de parlamentares o substitutivo do Senador Jorge Viana foi aprovado por 59 votos contra oito. É uma maioria considerável, aliás rara, mas longe de ser o grande consenso pleno que se tentou vender e que a mídia de massa comprou.

Até durante a votação poucos no plenário do Senado tinham conhecimento mínimo razoável das emendas que estavam sendo acatadas, rejeitadas, destacadas e votadas. Em certos momentos até mesmo o próprio Senador Jorge Viana, relator da matéria, se confundiu sobre qual emendas estava sendo discutida. Mas isso não foi suficiente para frear o ímpeto do "acordão" de bastidores. Segundo vários parlamentares que se utilizaram da tribuna por mais de cinco horas o acordo teria sido costurado e avalisado pela Ministra de Meio Ambiente Izabella Teixeira e os senadores Kátia Abreu, Jorge Viana, Rodrigo Rollemberg, Waldemar Moka, Blairo Maggi e Luiz Henrique durante almoço no restaurante do Senado.

Durante as mais de cinco horas de discursos ambíguos emendas eram negociadas nos corredores como títulos da bolsa de valores. Assessor surgiam com um papel nas mãos e chamavam pessoas para o cafezinho para ver e avalisar a nova redação. Versões eram feitas e refeitas na última hora e apresentadas à mesa apenas no papel (conforme o art. 235,II,d do regimento interno do Senado permite). Com isso, dezenas de emendas foram apresentadas na última hora sem que a grande maioria tivesse acesso aos textos que só existiam no papel. E assim foram acatadas, rejeitadas e votadas em bloco.

O acolhimento de emendas foi lido pelo relator em velocidade de cruzeiro e eu consegui anotar o acolhimento das seguintes emendas: 4, 12, 34, 36, 39, 51, 52, 53, 54, 55, 58, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 76, 77, 78, 79, 80, e 81. Mas até agora não tenho a redação dessas emendas.

Nos destaques que foram a voto individualmente com direito a uma defesa, apenas quatro emendas foram votadas,  de mais de 80 emendas apresentadas. Discutiu-se:

a)  Moratória do desmatamento na Amazônia, que obteve apoio de mais de 20 senadores, mas como a votação não foi nominal, lideranças como Jucá, Kátia Abreu decidiram a fatura contrariamente apesar da maioria ser a favor;

b)    Aumento da pena para desmatamento em APP, que assim como no caso da moratória do desmatamento, a maioria era a favor mas no voto de lideres foi derrubada;

c)     E outras duas que envolviam temas não menos relevantes ( prova de desmatamento anterior a lei e obrigatoriedade de desapropriação para criação de APPs pelo poder executivo), mas que também foram enterradas pelos líderes selando o grande acórdão que mais uma vez impediu um debate de fundo, assim como foi feito nas 4 comissões por onde tramitou o projeto, onde os debates foram sacrificados.

Portanto, acreditem se quiser, até agora (manhã do dia seguinte à votação), o Brasil (exceto a CNA e poucos senadores) não sabe o que foi aprovado. E não estamos tratando de um regimento de condomínio privado de abastados. Estamos falando do código florestal brasileiro, uma lei que protege a biodiversidade, no país com maior biodiversidade do planeta,.que protege as águas, no País que detém mais de 12% de toda água doce superficial do Planeta. Enfim…assim são feitas as salsichas, como dizia Bismarck.

Dito isso a respeito do método, abaixo indicamos alguns dispositivos que (sem prejuízo de um exame necessário mais apurado após o conhecimento pleno das emendas aprovadas) poderão ser objeto de veto se a Presidente Dilma resolver cumprir seu compromisso de não sancionar anistias a desmatamentos ilegais, redução de áreas de preservação e incentivos a novos desmatamentos.

1)    Definição de área rural consolidada (art. 3º, IV)- Razão do veto: constitui anistia, principalmente nos casos de desmatamento de APP que constituem crime ambiental desde a entrada em vigor da Lei de crimes e Infrações contra o mio ambiente 9605/98, contrariando frontalmente a art. 225 CF/88.

2)    Atividade de Carcinicultura (criatório de camarão) em apicuns (manguezal) – Razão do veto: reduz área de proteção ao separar os apicuns do manguezal e anistia ocupações ilegais ocorridas até a data da entrada em vigor da lei (supostamente artigo 64, mas ainda não vimos a emenda aprovada em detalhe).

3)    Artigo que elimina APP em lagoas naturais com menos de 1 hectares de lâmina dágua(parágrafo 4º do artigo 4º). Razão do veto: reduz área de proteção  e autorizará desmatamento em áreas de que hoje são consideradas de preservação permanente.

4)    Artigo que reduz reserva legal em estados que tiverem mais de 65% de UC e TI. Razão do veto:  a redução desse percentual poderá valer para autorizar novos desmatamentos, ou seja, não está ressalvado (como foi feito no parágrafo 4º para o caso dos municípios com mais de 50% de UC e TI) que se trata apenas de regularização de desmatamentos anteriores a julho de 2008  (parágrafos 4º e 5º do artigo 12)

5)    Consolidação de atividades agropecuárias que desmataram áreas de preservação permanente até julho de 2008 (artigo 61)- Razão do veto: Anistia a desmatamentos que constituem crime ambiental desde a entrada em vigor da Lei 9605, de 1998.

6)    Recomposição de reserva legal com 50% de espécies exóticas. Razão do veto: reduz em 50% a área de conservação de vegetação nativa (art. 67 parágrafo 3º).

7)    Anistia de recomposição de RL em imóveis com até 4 módulos fiscais (art. 68). Razão do veto: Constitui anistia, é redução de proteção e tratará desigualmente os que cumpriram a lei e os que infringiram a lei beneficiando os infratores em detrimento dos que respeitaram a Lei.

8)    Aceitação de indícios inconsistentes e de impossível confirmação pelo poder público para aplicação do benefício da dispensa ou redução de percentual de Reserva Legal para proprietário que desmatou área antes de criação ou aumento da reserva legal. O dispositivo trata dos tipos de prova de uso da propriedade conforme a lei em vigor à época do desmatamento (parágrafo 1º do artigo 68).

Esta análise dos pontos passíveis de veto, seja em função de inconstitucionalidade ou de contrariedade ao interesse público nacional na preservação das florestas e dos processos ecológicos essenciais, ainda é preliminar e será objeto de revisão após o conhecimento pleno das emendas aprovadas na noite do dia 06 de dezembro.

Código (não) Florestal

Wigold Schaffer

É hora de ler o texto com a redação final do Código (não) Florestal aprovado no Senado e que agora será apreciado pela Câmara dos Deputados. O mais difícil é entender o que querem dizer com uma série de artigos que foram escritos de forma confusa e com segundas intenções (pro mal).  

A título de exemplo, abaixo algumas das exceções (ou regras?) para detonação de APP….previstas no art. 62 que trata das Áreas Consolidadas em Áreas de Preservação Permanente:

§ 6o Aos proprietários e possuidores dos imóveis rurais da agricultura familiar e dos que, em 22 de julho de 2008, detinham até 4 (quatro) módulos fiscais e desenvolviam atividades agrossilvipastoris nas áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente, para o fim de recomposição das faixas marginais a que se referem os §§ 4o e 5o deste artigo, é garantido que a exigência de recomposição, somadas as áreas das demais Áreas de Preservação Permanente do imóvel, não ultrapassará o limite da Reserva Legal estabelecida para o respectivo imóvel.

§ 7o Para os imóveis rurais com área superior a 04 (quatro) módulos fiscais e que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, com largura superior a 10 (dez) metros, será admitida a manutenção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural, sendo obrigatória a recomposição das faixas marginais, observados critérios técnicos de conservação do solo e da água definidos pelos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente ou órgãos colegiados estaduais equivalentes que estabelecerão suas extensões, respeitado o limite correspondente à metade da largura do curso d’água, observado o mínimo de 30 (trinta) metros e o máximo de 100 (cem) metros.

§ 8o Nos casos de áreas rurais consolidadas em Áreas de Preservação Permanente no entorno de nascentes e olhos d’água, será admitida a manutenção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural, sendo obrigatória a recomposição do raio mínimo de 30 (trinta) metros.

Art. 65. Serão mantidas, excepcionalmente, para garantir a continuidade do uso antrópico consolidado, as ocupações em apicum e salgado existentes em 22 de julho de 2008.

Já o art. 69 é uma das maiores aberrações jurídicas do texto pois premia o "ruralista desmatador" e o torna "mais igual" perante a lei do que o agropecuarista que cumpriu a lei e preservou vegetação. Ou seja, quem tinha "escravo" tem autorização eterna (inclusive para seus filhos e netos) para manter "escravo"…em outras palavras, quem degradou o meio ambiente tem autorização para continuar degradando e prejudicando a vida alheia…

Art. 69. Nos imóveis rurais que detinham, em 22 de julho de 2008, área de até 4 (quatro) módulos fiscais e que possuam remanescente de vegetação nativa em percentuais inferiores ao previsto no art. 13, a Reserva Legal será constituída com a área ocupada com a vegetação nativa existente em 22 de julho de 2008, vedadas novas conversões para uso alternativo do solo.

Esses são apenas alguns poucos exemplos da "obra-prima" que vai "consolidar" a degradação das florestas e demais formas de vegetação nativa no Brasil… Tem muito mais, para entender é necessário ler o texto (e talvez reler algumas vezes) pois as maldades estão escondidas nas entrelinhas….

É hora de mobilização geral contra as aberrações aprovadas…

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