O que leva um proprietário rural a conservar e restaurar a floresta?

O que leva um proprietário rural a conservar e restaurar a floresta?

O que leva um proprietário rural a conservar e restaurar a floresta?

Novo estudo revela que a água é o principal motivo para agricultores manterem ou restaurarem áreas de floresta nativa em suas propriedades.

Um dos maiores desafios da restauração ecológica é engajar proprietários rurais. Com 54% da vegetação nativa remanescente do país localizada em terras privadas, entender o que move, ou desmotiva, agricultores a conservar e restaurar as florestas é essencial para dar escala à restauração. E foi exatamente isso que o estudo liderado pela pesquisadora Amanda Augusta Fernandes, do Laboratório de Ecologia e Restauração Florestal (LERF) da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ/USP), buscou compreender.

Publicado recentemente na revista Restoration Ecology, o artigo se debruça sobre as decisões de uso da terra na Mata Atlântica em 90 propriedades rurais de diferentes portes em 13 municípios do estado de São Paulo. O objetivo foi investigar os motivos que levam os proprietários a diminuir, manter ou aumentar a cobertura florestal em suas propriedades e quais serviços ecossistêmicos são percebidos por eles como benefícios da floresta.

 

Água em primeiro lugar

A água é o serviço ecossistêmico mais valorizado pelos produtores rurais. A conservação de nascentes, o fornecimento de água e a melhoria do microclima aparecem como principais razões para manter a floresta em pé, especialmente entre proprietários de pequenas propriedades que foram entrevistados.

Já benefícios como sequestro de carbono e produção de alimentos foram raramente mencionados, revelando que existe uma necessidade grande de conscientização sobre esses temas. Apenas 9% dos entrevistados citaram o carbono como um benefício.

 

Um estímulo para a restauração acontecer

Apesar do reconhecimento dos benefícios, a maioria dos produtores não planeja restaurar por conta própria. No entanto, esse cenário muda quando há apoio técnico e financeiro. Nesses casos, o interesse aumenta: cerca de um terço dos produtores afirmaram que participariam de ações de restauração. Além disso, o estudo revela que grandes proprietários tendem a enxergar mais oportunidades ligadas ao mercado de créditos de carbono, mesmo ainda conhecendo pouco sobre o tema.

 

Comunicação e cultura

O estudo aponta para a necessidade de melhorar a comunicação com os produtores rurais sobre os benefícios múltiplos da floresta, indo além da obrigatoriedade legal e traduzindo temas como carbono e biodiversidade em impactos tangíveis no dia a dia das famílias rurais.

A pesquisadora destaca também a importância de formar e manter redes e coletivos locais, que fortaleçam a construção de capacidades e vínculos duradouros com os produtores. “Não basta plantar a semente, é preciso regar. A continuidade da relação é fundamental para escalar a restauração”, reforça Amanda Fernandes.

Confira o artigo na íntegra

 

 

Entrevista com Amanda Augusta Fernandes
Amanda Augusta Fernandes, engenheira ambiental e doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Recursos Florestais, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz ESALQ

Amanda Augusta Fernandes, engenheira ambiental e doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Recursos Florestais na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/USP).

A Apremavi entrevistou Amanda A. Fernandes, que liderou o estudo. Em sua entrevista, Amanda compartilhou as motivações dos proprietários rurais, os desafios enfrentados para ampliar a restauração e a importância de uma comunicação eficaz e participativa para engajar os agricultores na construção de uma cultura de cuidado com a natureza.

  • Como surgiu a ideia de explorar a percepção dos agricultores sobre os serviços ecossistêmicos associados à cobertura florestal nativa? 

A ideia surgiu de uma vivência pessoal. Eu sou filha de agricultores e cresci no meio rural, então sempre tive um olhar sobre como as pessoas desse meio se relacionam com o ambiente. Aos poucos, minha curiosidade foi se ampliando para compreender o que leva alguém a conservar a floresta dentro de uma propriedade rural

  • Como você acha que a compreensão do porque os proprietários rurais participam de iniciativas de restauração pode dar escala à restauração?

Um ponto fundamental é focar na comunicação e na mudança de cultura para que a restauração possa ganhar escala. Isso é ainda mais importante quando a gente considera que cerca de 54% dos remanescentes florestais estão em propriedades privadas. 

Precisamos cultivar relações e vínculos com os proprietários. Esse vínculo é essencial para a continuidade e o sucesso das ações de restauração.

  • Os aprendizados do seu estudo podem ser aplicados em outros territórios da Mata Atlântica?

A Mata Atlântica é muito diversa nas suas fitofisionomias, e isso precisa ser considerado. É preciso alinhar essas oportunidades, como os projetos de carbono, com a água e também com a produção de alimentos. Nosso protocolo de entrevista semi-estruturado foi adaptado aos objetivos dos projetos e pode servir como base para ser usado em outros contextos. 

  • O sequestro de carbono foi um benefício pouco reconhecido pelos agricultores. Como as redes e coletivos que atuam com restauração ecológica podem atuar para tornar esse serviço mais visível e valorizado no campo? 

Uma das formas é por meio da construção de capacidades. As organizações que atuam com restauração precisam ter um entendimento claro sobre a temática do carbono e, principalmente, desenvolver uma comunicação didática e focada.  O Pacto pela Restauração da Mata Atlântica, por exemplo, tem atuado com forças-tarefa e cursos voltados para organizações.

Para médios e grandes proprietários rurais, é importante garantir acesso a informações verdadeiras, com foco em áreas maiores onde há obrigatoriedade de manter Reserva Legal (RL) e Áreas de Preservação Permanente (APP). Nesses casos, os Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA), envolvendo carbono, água e biodiversidade, podem ser caminhos viáveis, especialmente em projetos agrupados, com mais escala.

Já para pequenos proprietários, é importante desenvolver arranjos de projetos participativos, que tragam compartilhamento de benefícios econômicos e estejam conectados com suas realidades. 

  • Como você avalia a percepção dos proprietários rurais sobre a legislação ambiental? Como você avalia a diferença de percepção entre pequenos e grandes proprietários?

De modo geral, os entrevistados demonstram respeito pelo Cadastro Ambiental Rural (CAR). Além disso, há uma percepção de que as políticas ambientais geram mais medo no pequeno produtor, porque ele sente os impactos diretamente, inclusive no bolso. Já para o médio e grande, muitas vezes é mais vantajoso pagar uma multa do que seguir a legislação. Isso cria um cenário em que o pequeno respeita mais por necessidade, enquanto os outros grupos podem relativizar esse respeito.

Quanto aos benefícios associados à cobertura florestal, os pequenos proprietários, por morarem na propriedade, percebem uma gama mais ampla de serviços ecossistêmicos, não apenas a provisão de água, mas também serviços culturais, de suporte e de regulação. Já os médios e grandes tendem a valorizar quase exclusivamente o acesso à água, sem mencionar tanto os demais serviços.

  • Quais são os próximos passos que você acredita serem necessários para ampliar o impacto das ações de restauração junto aos proprietários?

Um ponto fundamental é investir em uma comunicação participativa e horizontal, que valorize o diálogo com os agricultores desde o início dos projetos.  Ficou evidente, nas entrevistas, que a maioria dos proprietários têm interesse em restaurar, mas o interesse maior surge quando existe um projeto que traz apoio técnico, mudas e preparo do terreno.

Também é essencial aprofundar a compreensão sobre as abordagens de contabilidade do carbono, especialmente adaptadas ao bioma da Mata Atlântica, e consolidar indicadores sociais e econômicos

Por fim, o papel dos coletivos e redes é central nesse processo. A construção de capacidades locais, o fortalecimento das relações interpessoais e o acúmulo de aprendizados ao longo do tempo são o que tornam possível aplicar esses conhecimentos a outros biomas

 

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Carolina Schäffer.
Foto de capa: Maíra Ratuchinski.

Apremavi celebra o Dia Mundial do Meio Ambiente

Apremavi celebra o Dia Mundial do Meio Ambiente

Apremavi celebra o Dia Mundial do Meio Ambiente

O Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado em 5 de junho, surgiu na década de 1970 durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano. Realizada em Estocolmo, na Suécia, a iniciativa é  considerada a primeira cúpula ambiental global e consolidou a ideia de criar uma data dedicada à conscientização e à promoção da proteção do meio ambiente.

A Apremavi aproveita essa data para intensificar suas ações de educação ambiental nos territórios onde atua em Santa Catarina e no Paraná, promovendo palestras, atividades com jogos educativos e o plantio de mudas nativas que fortalecem a conexão das pessoas com a natureza.

As ações realizadas envolveram o público de escolas e outros espaços públicos, reunindo estudantes, educadores, técnicos e moradores em torno da importância da conservação dos ecossistemas locais. Essa estratégia parte do entendimento de que o compromisso com a sustentabilidade ganha força quando comunidades se tornam protagonistas na defesa do direito garantido pela Constituição de todos os brasileiros a um meio ambiente saudável e equilibrado.

 

Santa Catarina

Em Abelardo Luz (SC), o Programa de Educação Ambiental Geração +Floresta do projeto +Floresta realizou uma série de atividades com estudantes de diferentes escolas, totalizando a participação de 107 alunos do ensino fundamental e médio. As ações foram conduzidas por Marluci Pozzan, Guilherme Callegari e Manuela de Deus, do Projeto +Floresta e aconteceram diretamente nas instituições de ensino.

A programação incluiu palestras e atividades práticas com as turmas do 5º ano da EBM José Maia (turnos da manhã e da tarde), da EIEF Cacique Karenh e da EBM 25 de Maio, além dos alunos do 2º ano do ensino médio da EEM Paulo Freire e da EEM Semente da Conquista, e do curso técnico em agropecuária do IFC Abelardo Luz.

As atividades do Programa de Educação Ambiental ocorrem quatro vezes ao ano. Nesta edição, os temas abordados foram: “Fauna Silvestre da Floresta Ombrófila Mista”, para os alunos do ensino fundamental, e “Legislação Ambiental Aplicada a Pequenas Propriedades Rurais”, para os estudantes do ensino médio.

Ações de educação ambiental do Geração +Floresta realizadas durante a Semana do Meio Ambiente em Abelardo Luz (SC) 2025

Ações de educação ambiental do Geração +Floresta realizadas durante a Semana do Meio Ambiente em Abelardo Luz (SC). Fotos: Manuela de Deus.

Na Serra Catarinense, em Palmeira (SC), a Apremavi participou da Semana do Meio Ambiente promovida pela Prefeitura Municipal, que reuniu mais de 400 estudantes das escolas municipais no espaço multiuso da cidade. O evento teve como foco a valorização do bioma Mata Atlântica, promovendo atividades interativas que aproximaram os jovens da conservação da natureza.

A programação incluiu exposições sobre a biodiversidade da região, maquetes demonstrativas de áreas alteradas e restauradas, além de dinâmicas com o jogo de tabuleiro gigante “Fique Legal” facilitadas pelos colaboradores Tatiana Correa e Ronaldo Straubel, do Programa Matas Legais e Sociais. As ações despertaram a curiosidade e o engajamento dos estudantes, incentivando a reflexão sobre o papel de cada um na proteção do meio ambiente.

O encerramento da Semana do Meio Ambiente em Palmeira contou com a entrega simbólica de brindes, folders informativos e mudas de espécies nativas, reforçando o convite para que os estudantes se tornem multiplicadores das práticas de conservação em suas casas, escolas e comunidades.

 

Dia do meio ambiente matas legais sociais em Palmeira

Exposições sobre a fauna e flora local durante a Semana do Meio Ambiente de Palmeira (SC). Foto Ronaldo Straubel de Oliveira

Em Bom Retiro (SC), as atividades ocorreram no dia 05 de junho. Na parte da manhã ocorreu a distribuição gratuita de 700 mudas de árvores nativas da Mata Atlântica. No turno da tarde, o Salão Nobre da E.E.B. Valmir Omarques Nunes recebeu a palestra “Pequenas Ações, Grande Impacto!“, com Leandro Casanova, assessor florestal da Apremavi. 

A Secretaria Municipal de Turismo, organizadora das atividades, destacou a importância da atividade: “Foi um momento de reflexão e aprendizado sobre como atitudes simples no dia a dia podem gerar grandes transformações no meio ambiente.”

Ainda na Serra Catarinense, entre os dias 02 e 09 de junho, os colaboradores da Apremavi  Daiana Barth e Luciano Comunello realizaram uma série de atividades em diferentes municípios. Em Lages, as ações ocorreram no Parque Natural Municipal e no Parque Jonas Ramos, com palestras seguidas de dinâmicas com  jogos educativos. 

Michelle Pelozatto, bióloga da Secretaria de Meio Ambiente de Lages, destacou: “As atividades de educação ambiental vão repercutir positivamente, uma vez que, trabalhadas de forma lúdica e prática, sensibilizam os alunos sobre a importância do cuidado com o meio ambiente. Além disso, eles repassam essas informações a outras pessoas, criando uma rede.”

Os eventos contaram com o apoio de prefeituras, secretarias municipais e organizações locais, reforçando o compromisso coletivo com a conscientização e a educação ambiental. Em Ituporanga, no Alto Vale, foi realizada a doação de mudas de árvores nativas, enquanto em Palmeira houve uma exposição fotográfica sobre a Mata Atlântica. Ao todo, as ações envolveram aproximadamente 450 estudantes.

Arno Clasen, presidente da Associação Desportiva Amigos da Gabiroba (ADAGA), comentou: “O sucesso do evento se deve, em grande parte, à parceria com a Apremavi, pela disponibilidade em palestrar com propriedade sobre o tema e pela doação de mudas que foram distribuídas. Agradecemos a colaboração, certos de que poderemos contar com a entidade em futuras parcerias.”

 

Atividades de educação ambiental entre os dias 02 e 09 de junho em Lages, Ituporanga e Palmeira (SC) 2025 Foto Daiana Barth

Atividades de educação ambiental entre os dias 02 e 09 de junho em Lages e Ituporanga (SC). Fotos: Luciano Comunello.

Paraná

Na região Norte do Paraná, o Programa Matas Legais, desenvolvido em parceria com a Klabin, realizou ações de Educação Ambiental em três municípios: Ortigueira, Japira e Ventania. As atividades contaram com a participação de estudantes de diferentes etapas da educação básica, além de membros do corpo docente das escolas envolvidas, totalizando cerca de 160 participantes.

As ações foram motivadas por duas datas comemorativas importantes: o Dia da Mata Atlântica e o Dia do Meio Ambiente. Pedro Ferreira, Lucas Costa e Weliton Oliveira, colaboradores da Apremavi, realizaram palestras com temas relacionados à restauração ecológica, à importância da conservação e mudanças climáticas. Os alunos também participaram de jogos educativos que contribuíram para a fixação dos conteúdos abordados. Ao final, foram distribuídas mudas de árvores nativas da Mata Atlântica aos estudantes.

As atividades aconteceram em três locais: no Centro Estadual de Educação Profissional Florestal e Agrícola (CEEP), em Ortigueira; na Escola Municipal Dr. César Augusto Luiggi de Oliveira, em Japira; e na Escola Rural Zacarias de Góes e Vasconcelos, em Ventania. Em Ortigueira e Japira, as ações ocorreram no dia 4 de junho, no período da manhã. Em Ventania, foram realizadas no dia 10 de junho, nos períodos da manhã e da tarde.

Segundo Flávio Bicudo de Oliveira, Secretário de Meio Ambiente do município de Japira: “Os técnicos da Apremavi desenvolveram ações de educação ambiental fundamentais para conscientizar as crianças sobre a importância da preservação e formar jovens comprometidos com a sustentabilidade, fortalecendo a responsabilidade com a natureza e a construção de um futuro mais justo e equilibrado.”

As atividades contaram com o apoio da Secretaria de Meio Ambiente de Japira, da Secretaria Municipal de Educação de Ventania, e da Klabin em Ortigueira e das equipes pedagógicas das escolas participantes.

Palestras e jogos educativos realizados em Ventania, Ortigueira e Japira (PR) 2025

Palestras e jogos educativos realizados em Ventania, Ortigueira e Japira (PR). Fotos: Lucas Costa.

Em Reserva, na região central-norte do Paraná, o Programa Matas Sociais, iniciativa da Klabin em parceria com a Apremavi, o Sebrae e prefeituras municipais das regiões de atuação, promoveu atividades no dia 05 de junho no Colégio Estadual do Campo Prefeito Albano Guimarães Martins, localizado na comunidade de Pinhal Preto.

Foi realizada uma palestra voltada aos alunos do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) e do Ensino Médio (1º ao 3º ano). Os temas abordados incluíram conservação e restauração de ecossistemas e mudanças climáticas. O evento contou com a participação de aproximadamente 60 pessoas, entre estudantes, professores e representantes das secretarias municipais. As ações foram realizadas por Emílio Ribas e Marcos dos Santos, colaboradores da Apremavi. Após a apresentação, os participantes receberam mudas de árvores nativas da Mata Atlântica e materiais educativos sobre o meio ambiente, incentivando práticas sustentáveis e o plantio de árvores na comunidade.

A professora Juliana Vozniak de Souza destaca a importância da ação: “Essas ações engajam a comunidade escolar na preservação ambiental, promovem práticas sustentáveis e ajudam a formar cidadãos conscientes, com os alunos demonstrando grande entusiasmo e avanço na conscientização ambiental.”

Ação realizada no Dia do Meio Ambiente em Reserva (PR)

Ação realizada no Dia do Meio Ambiente em Reserva (PR). Foto: Arquivo Apremavi.

Autores: Marluci Pozzan, Tatiana Arruda Correia, Pedro Ferreira, Emilio André Ribas, Marcos José dos Santos, Daiana Tânia Barth, Luciano Fiorentin Comunello e Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto.
Foto de capa: Lucas Costa.

Carvalho-brasileiro: espécie secundária da Mata Atlântica e do Cerrado

Carvalho-brasileiro: espécie secundária da Mata Atlântica e do Cerrado

Carvalho-brasileiro: espécie secundária da Mata Atlântica e do Cerrado

O carvalho-brasileiro (Roupala brasiliensis Klotzsch) se destaca pela sua ampla distribuição na América do Sul. Conhecida também como carvalho-da-serra, cedro-bordado ou cigarreira, a espécie da família Proteaceae habita desde o sul da Bahia até o estado de Santa Catarina, e está presente também em países vizinhos como Argentina, Paraguai e Bolívia.

Com altura entre 25 e 30 metros e tronco de até 50 cm de diâmetro, o carvalho-brasileiro exibe madeira de tonalidade rósea-arroxeada ou róseo-acastanhada. Roupala é nome comum da espécie na Guiana, já brasiliensis se refere ao Brasil, onde a espécie foi descrita e nomeada.

 

Ecologia e distribuição

A espécie ocorre principalmente em encostas úmidas e pequenas depressões, sendo nativa do Cerrado e da Mata Atlântica e algumas das suas fitofisionomias, como:

  • Floresta Ombrófila Mista – na formação Montana
  • Floresta Ombrófila Densa – onde é rara
  • Floresta Estacional Semidecidual
  • Campos rupestres e de altitude
  • Cerrado e Cerradão

É comum em florestas secundárias, com boa capacidade de regeneração natural, inclusive em áreas degradadas.

 
Reprodução e ciclo de vida

A reprodução do carvalho-brasileiro se inicia com cerca de 3 anos em solos férteis e 6 anos em solos mais pobres. A polinização é feita principalmente por insetos e beija-flores, e a floração ocorre na primavera e no verão. A espécie apresenta brotação intensa entre outubro e dezembro, seguido de frutificação entre abril e julho. A dispersão das sementes é anemocórica, ou seja, feita pelo vento.

Os frutos devem ser colhidos no início da deiscência (amadurecimento), quando passam da cor verde para castanho-parda. Após a coleta, são deixados em ambientes ventilados para a liberação das sementes, um quilo de frutos contém cerca de 380 g de sementes viáveis.

 
Usos e potencial
  • Apicultura: suas flores são melíferas, fornecendo néctar e pólen;
  • Medicina tradicional: utilizado por povos indígenas no tratamento de febre, cólicas intestinais, hemorragias digestivas e infecções urinárias*;
  • Paisagismo: recomendado para arborização de parques e rodovias;
  • Restauração: indicado para recuperação de áreas alteradas e de matas ciliares, principalmente em locais não sujeitos a alagamentos.

Do ponto de vista sucessional, a espécie é classificada como secundária inicial a tardia, e em alguns contextos, clímax exigente de luz

Inflorescência do carvalho-brasileiro (Roupala brasiliensis Klotzsch)

Detalhes da inflorescência (várias flores), folhas, fruto e árvore do carvalho-brasileiro (Roupala brasiliensis Klotzsch). Fotos: Carolina Schäffer

Carvalho-brasileiro

Nome científico: Roupala brasiliensis Klotzsch
Família: Proteaceae.
Coleta de sementes: os frutos devem ser coletados quando passam da coloração esverdeada e consistência carnosa para castanho-parda ou castanho-esverdeada e consistência lenhosa-coriácea. Após a coleta, os frutos devem ser levados para ambiente ventilado para completar a deiscência e possibilitar a extração das sementes a extração das sementes se faz por maceração dos frutos. Após isso, as sementes devem ser secas a meio-sol, em ambiente ventilado.
Fruto: cor castanho-esverdeada, olivácea, com até 4 cm de comprimento e 1,4 cm de largura, contendo 1 a 3 sementes.
Flor: brancas, no interior e bege no exterior e odoríferas.
Crescimento da muda: lento.
Germinação: com início entre 25 a 60 dias após a semeadura. O potencial germinativo é variável, até 70%. As mudas estão prontas para plantio cerca de 9 meses após a semeadura.
Plantio: plantio misto, a pleno sol, associado com espécies pioneiras ou secundárias iniciais, e em linhas, em faixas abertas em vegetação matricial arbórea.
Status de conservação: Não listada – Portaria MMA 148/2022 e IUCN.

* Os dados sobre usos medicinais das espécies nativas são apenas para informação geral. O uso de medicamentos fitoterápicos deve ser seguido de orientações médicas

 

Fontes Consultadas:

Carvalho, P. (2006). Carvalho-Brasileiro: Roupala brasiliensis.

 

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto.
Foto de capa: Carolina Schäffer.

Unidades de Conservação cobrem menos de 10% da Mata Atlântica

Unidades de Conservação cobrem menos de 10% da Mata Atlântica

Unidades de Conservação cobrem menos de 10% da Mata Atlântica

A SOS Mata Atlântica publicou um novo estudo que lança luz sobre o status das Unidades de Conservação (UCs) na Mata Atlântica no âmbito da Lei da Mata Atlântica, revelando lacunas críticas e apontando caminhos para o fortalecimento da conservação e da restauração no bioma mais ameaçado do país.

A análise utilizou dados do Cadastro Nacional de Unidades de Conservação (CNUC) e de uso da terra do MapBiomas, cruzando informações e eliminando sobreposições entre diferentes categorias de UCs. A área efetivamente protegida na Mata Atlântica corresponde a apenas 9,8% do território coberto pela lei, bem abaixo da meta “30×30” de 30% estabelecida pelo Marco Global da Biodiversidade e assumida pelo Brasil em sua Estratégia e Plano de Ação Nacional para Biodiversidade (EPANB). 

Embora a vegetação nativa ainda esteja presente em 59% das UCs, a diferença entre os tipos de unidade é marcante. As UCs de proteção integral apresentam 90,6% de cobertura de vegetação nativa, enquanto nas de uso sustentável essa proporção cai para 49,5%. Ao todo, 34% das UCs estão ocupadas por atividades agropecuárias, especialmente pastagens e mosaicos agrícolas, evidenciando a pressão do uso do solo sobre as áreas que deveriam priorizar a conservação.

“A visão do “copo meio vazio” é o pequeno número de florestas em UCs. O “copo meio cheio” é o fato que existe um grande espaço onde é possível avançar com a criação de novas UCs e com o fortalecimento da rede de Unidades já existentes. Apenas na esfera federal são dezenas de processos de criação ou ampliação de UCs na Mata Atlântica que estão em curso e é preciso compromisso e apoio para essa agenda”, relata Diego Igawa Martinez, coordenador de projetos da SOS Mata Atlântica, à Apremavi.

Status da proteção da Mata Atlântica Imagem Unidades de Conservação na Mata Atlântica da SOS Mata Atlântica

Status da proteção da Mata Atlântica. Imagem: Unidades de Conservação na Mata Atlântica da SOS Mata Atlântica.

O estudo aponta que alcançar a meta 30×30 na Mata Atlântica exige uma combinação de estratégias complementares, com destaque para o fortalecimento da gestão das Unidades de Conservação (UCs) existentes, a criação de novas UCs em áreas prioritárias, o incentivo à criação de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) e a restauração de áreas degradadas dentro das UCs, especialmente aquelas de uso sustentável.

Embora a restauração seja essencial, ela não substitui a urgência da conservação, já que os processos de sucessão ecológica e recuperação plena da biodiversidade podem levar décadas ou até séculos. “Os processos de restauração florestal e condução da regeneração natural devem caminhar em conjunto com os esforços para aumento da proteção”, comenta Diego.

> Acesse o relatório completo

 

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Carolina Schäffer.
Foto de capa: Parque Nacional da Serra do Itajaí. © Carolina Schäffer.

A Mata Atlântica resiste com soluções que florescem em rede

A Mata Atlântica resiste com soluções que florescem em rede

A Mata Atlântica resiste com soluções que florescem em rede

Apesar dos inúmeros desafios enfrentados, a Mata Atlântica resiste, graças ao trabalho integrado de diversas instituições e pessoas que atuam em prol da sua conservação e restauração. Pesquisa científica, criação de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs), ativismo ambiental, arte, permacultura e educação são algumas de uma rede de ações interligadas que se fortalecem mutuamente. É nessa conexão entre saberes e práticas que surgem soluções inovadoras para preservar um dos biomas mais ameaçados e ricos do Brasil.

Na Semana da Mata Atlântica, a Apremavi ouviu organizações parceiras que atuam ativamente pela conservação e restauração do bioma. Confira os destaques dessas iniciativas e saiba mais sobre quem trabalha pela Mata Atlântica em pé.

Conhecer para conservar: a pesquisa científica do Mater Natura

A pesquisa científica ocupa um papel estratégico, especialmente quando conecta o conhecimento técnico à proteção efetiva de espécies e territórios. É com esse espírito que o Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais atua há mais de 40 anos, desenvolvendo ações voltadas à conservação da biodiversidade brasileira, com atenção especial à Mata Atlântica e seus ecossistemas costeiros e marinhos.  “Apesar do bioma estar fragmentado e impactado, ainda é biodiverso e possui espécies que precisam ser descobertas e protegidas. Precisamos manter o que temos em pé”, comenta Ana Paula Silva, bióloga e coordenadora de projetos do Mater Natura em entrevista à Apremavi. 

Desde sua fundação, o Mater Natura participou da descoberta de 26 novas espécies da fauna brasileira, incluindo pequenos e singulares habitantes da floresta como o bicudinho-do-brejo (Formicivora acutirostris), um pássaro raro e ameaçado que vive exclusivamente em brejos do litoral sul do Brasil. Sua descoberta, em 1995, e os estudos subsequentes coordenados com a ONG foram decisivos para que a Baía de Antonina, no Paraná, fosse reconhecida em 2017 como um sítio Ramsar – zona úmida classificada como local de importância ecológica internacional ao abrigo da Convenção sobre as Zonas Úmidas de Importância Internacional.

Além das descobertas científicas, o Mater Natura tem papel ativo na criação e estruturação de RPPNs e na atualização de listas de espécies ameaçadas, especialmente em Santa Catarina e Paraná. Os estudos desenvolvidos pela equipe ajudam a identificar bioindicadores, compreender o manejo de sementes e reconhecer a importância das fitofisionomias menos conhecidas da Mata Atlântica, contribuindo para estratégias mais eficazes de conservação.

“Levantamos a bandeira da pesquisa como contribuição para a conservação da Mata Atlântica”, relata a bióloga. Segundo ela, o investimento em conhecimento técnico é essencial para revelar o que ainda não foi descoberto e fortalecer estratégias como a criação de Unidades de Conservação e o manejo de espécies ameaçadas. Investir em pesquisa é essencial: “As pessoas precisam conhecer para poder conservar. Esse conhecimento técnico nos orienta sobre onde e como devemos agir.”

Bicudinho-do-brejo uma das espécies estudadas por pesquisadores do Mater Natura

Bicudinho-do-brejo, uma das espécies estudadas por pesquisadores do Mater Natura. Foto: Aaron Maizlish CC BY-NC 2.0.

SPVS e a produção de natureza em rede: RPPNs que conectam e conservam

Desde 1984, a Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS) atua na proteção da natureza no Brasil, com forte presença na Grande Reserva Mata Atlântica, o maior remanescente contínuo do bioma, entre São Paulo, Paraná e Santa Catarina. A SPVS desenvolve iniciativas que unem proteção ambiental, valorização dos serviços ecossistêmicos e desenvolvimento sustentável.

Inspirada em experiências na Argentina, a iniciativa da Grande Reserva Mata Atlântica foi oficialmente lançada em 2018, durante o Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação. Ela surgiu a partir do conceito de produção de natureza, uma abordagem que valoriza os serviços ecossistêmicos, conecta conservação à economia e propõe um novo olhar sobre paisagens naturais.

Essa visão inovadora propõe que a natureza seja encarada como ativo estratégico e produtivo, capaz de gerar desenvolvimento sustentável por meio de atividades econômicas sustentáveis, como o ecoturismo. A Grande Reserva é uma iniciativa coletiva e em rede, que já reúne cerca de 900 membros entre ONGs, empresas, gestão pública e comunidades locais. Parte do compromisso envolve o diálogo com trabalhadores da região, promovendo inclusão e desenvolvimento socioeconômico. O impacto dessas reservas vai além da biodiversidade: entre 2005 e 2022, só o município de Antonina (PR) recebeu quase R$ 40 milhões em repasses do ICMS Ecológico, oriundos das reservas da SPVS,  recursos aplicados, principalmente, nas áreas de educação e saúde.

“O turismo é o carro-chefe da economia restaurativa”, explica Ricardo Borges, engenheiro florestal e coordenador de comunicação da Grande Reserva Mata Atlântica em entrevista à Apremavi. “Essa é uma região que já tinha vocação turística, e a proposta da Grande Reserva ajudou a potencializar isso de forma mais estruturada, com foco em conservação e inclusão social.”

A proposta da Grande Reserva extrapola os limites de uma UC ao propor uma paisagem funcional e interconectada, com trânsito de espécies, atividades econômicas sustentáveis e protagonismo de atores locais. Hoje, a SPVS compartilha essa metodologia com outras regiões da Mata Atlântica e em outros biomas, buscando ampliar a escala.

“A produção da natureza tem o potencial de transformar o Brasil no maior produtor de natureza do mundo”, afirma Ricardo. “Estamos falando do bioma onde vive a maior parte da população brasileira. Se conseguirmos consolidar esse modelo aqui, podemos inspirar outras regiões e enfrentar de forma mais eficaz a crise ambiental global.”

A experiência da SPVS e da Grande Reserva mostra que conservar a Mata Atlântica não é um freio ao desenvolvimento, mas sim um novo motor para a economia, para o bem-estar das comunidades e para a construção de um futuro viável para o planeta.

Paisagem da Grande Reserva da Mata Atlantica na região de Guaraquecaba PR

Paisagem da Grande Reserva Mata Atlântica na região de Guaraqueçaba (PR), reabertura do Portal Guarakessaba e oficinas. Foto: Gabriel Eloi de Marchi.

Acaprena e o ativismo ambiental histórico e atual

Fundada em 1973 por estudantes de Ciências Biológicas da Universidade Regional de Blumenau (FURB), a Associação Catarinense de Preservação da Natureza (ACAPRENA) surgiu inspirada por movimentos semelhantes no Brasil e logo se destacou como pioneira do ambientalismo em Santa Catarina. Desde seus primeiros anos, teve papel decisivo em políticas públicas ambientais, como a criação da FATMA (atualmente Instituto de Meio Ambiente de Santa Catarina), da SETMA (atualmente Secretaria de Estado do Meio Ambiente e da Economia Verde) e da AEMA (Assessoria Especial do Meio Ambiente) na Prefeitura de Blumenau, consolidando sua atuação técnica, política e comunitária, além de apoiar a criação de outras ONGs, como a própria Apremavi.  

Com uma trajetória marcada pela articulação técnica e política, Lauro Bacca, biólogo e um dos fundadores da Acaprena, traz reflexões contundentes sobre os desafios do ativismo ambiental no Brasil.  

Embora importantes conquistas tenham sido alcançadas, como a criação do Parque Nacional da Serra do Itajaí e a aprovação da Lei da Mata Atlântica, vivemos hoje um momento de esvaziamento do ativismo e de reação contra políticas ambientais. “Estamos enfrentando uma crise de lideranças. E há um agravante: muitos jovens não se sentem convocados a lutar por essas causas, talvez por viverem uma realidade mais confortável.”

Entre os principais legados do ativismo da Acaprena está a inserção da pauta ambiental no debate público. A entidade tem trabalhado de forma constante pela criação e melhoria de legislações ambientais, pela divulgação de pautas ambientais na imprensa regional e pela conscientização da população. “Ainda enfrentamos desafios, o aumento da produção de resíduos e os retrocessos legislativos, como o avanço do chamado PL da Devastação.” Lauro destaca também a importância de mudar o paradigma de relação com a natureza. “Precisamos substituir uma visão antropocêntrica por uma visão ecocêntrica.” Apesar das ameaças, ele enxerga sinais de transição para uma consciência ambiental mais ativa. “Falta agora os líderes políticos perceberem que é possível melhorar a qualidade de vida sem destruir o meio ambiente.”

Ao relembrar o processo de criação do Parque Nacional da Serra do Itajaí, Lauro reconhece o protagonismo de lideranças como Wigold Schäffer, João de Deus Medeiros e a potência do trabalho coletivo. No entanto, alerta para as dificuldades enfrentadas durante o processo, como a disseminação de informações distorcidas e o medo provocado por boatos infundados: “Diziam que 400 mil pessoas seriam retiradas do local. E mesmo proprietários fora da área do parque se sentiam ameaçados.”

Apesar das dificuldades, o projeto foi adiante. Apenas 12 propriedades foram desapropriadas para a criação da Unidade de Conservação, cinco delas já indenizadas. “Foi uma experiência difícil, com momentos traumáticos, mas extremamente rica e positiva”, relata. Ele observa, no entanto, que novos desafios surgem, como a discussão sobre eventuais sobreposições com terras indígenas: “É uma questão sensível, que precisa ser tratada com diálogo e responsabilidade, sem generalizações.”

Destruição na Serra do Itajaí Mata Atlântica

Destruição na Serra do Itajaí; Testemunhando a triste devastação das Araucárias, em desmatamentos que corriam soltos nos anos 1980; Passeata no Centro de Blumenau em protesto contra a intenção de se instalar na cidade uma Usina de Gaseificação do poluente carvão mineral; Grupo da Acaprena numa das 59 travessias do rio Garcia, procurando conhecer a região, o que ajudou muito na luta pela criação do Parque Nacional da Serra do Itajaí; ante a notícia de que as espetaculares Sete Quedas do rio Paraná iriam desaparecer, a Acaprena encheu um ônibus com mais de 40 participantes para conhecer o espetáculo, prestes a sumir para sempre sob as águas da Represa da Hidrelétrica da Itaipu Binacional. Fotos: Lauro Bacca.

Instituto Çarakura: arte, educação e afeto para restaurar vínculos com a Mata Atlântica

Em Florianópolis (SC), o Instituto ÇaraKura cultiva mais do que mudas de árvores: cultiva vínculos afetivos entre pessoas e florestas. Fundado a partir das vivências no Sítio ÇaraKura, desde 2017 o Instituto vem se consolidando como uma referência em educação ambiental aliada à arte, à permacultura e à restauração ecológica da Mata Atlântica.

“A gente quer proporcionar uma experiência viva como ferramenta de transformação”, explica Andrea de Oliveira, pedagoga e presidente do Instituto. Essa proposta se materializa quando crianças entram na floresta com enxadas de bambu adaptadas às suas mãos pequenas. Ali, escutam histórias, desenham, tocam o solo. “Elas se envolvem com muito entusiasmo”, conta Andrea. “Esse contato com a natureza e com as expressões artísticas resgata questões culturais e estimula o encantamento com a vida.”

O Sítio ÇaraKura, que deu origem ao Instituto, permanece como núcleo das ações: “É um lugar que desperta memórias da infância e ajuda a criar um vínculo afetivo com a Mata Atlântica.” Com sua estética rústica e estruturas feitas por bioconstrução, ele convida a uma reconexão profunda. “Tudo ali é parte da experiência, até o banheiro de chão de terra”, relata Andrea. O espaço acolhe desde grupos escolares até formações para educadores. A atuação do instituto também é marcada por projetos de restauração ecológica baseados na permacultura, filosofia que orienta práticas integradas e sustentáveis, com uso consciente dos recursos locais. “A gente fecha ciclos. Usa o que tem, escuta o território. São soluções simples, mas muito eficazes, que fortalecem a autonomia das comunidades.”

Uma das principais estratégias de restauração hoje dentro da abordagem educativa são as atividades de educação florestal. “Queremos renovar o olhar sobre a educação ambiental, trazendo propostas que vão desde atividades imersivas até projetos de educação florestal”, afirma Andrea. “Buscamos implementar trilhas, que chamamos de trilhas da restauração ecológica, e vivências imersivas na floresta, não só nas áreas já restauradas, mas, principalmente, naquelas que ainda precisam ser restauradas.”

A transdisciplinaridade é um eixo estruturante. O Instituto busca integrar saberes populares com o conhecimento técnico e científico. “Quando a comunidade se reconhece nos processos, ela se envolve mais, com pertencimento e afeto. Atuamos a partir de uma escala afetiva, onde o encantamento é o ponto de partida.”

Em tempos de crise ecológica e desconexão com a natureza, o trabalho do Instituto ÇaraKura mostra que restaurar a floresta também é restaurar relações, com a terra, com os outros, com o afeto, com a brincadeira e com a nossa própria história.

 

Desenho de educação ambiental realizado com as crianças pelo Instituto Çarakura

Atividades de educação ambiental realizadas com as crianças pelo Instituto Çarakura e visita das Unidades Regionais do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica. Fotos: Arquivo Instituto Çarakura e Carolina Schäffer.

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Carolina Schäffer e Vitor Lauro Zanelatto.
Foto de capa: Gabriel Eloi de Marchi.

Lei da Mata Atlântica: um marco ambiental sob risco no Congresso

Lei da Mata Atlântica: um marco ambiental sob risco no Congresso

Lei da Mata Atlântica: um marco ambiental sob risco no Congresso

No dia 27 de maio celebramos o Dia da Mata Atlântica, uma data que nos convida à reflexão sobre a importância da conservação de um dos biomas mais ricos em biodiversidade e, ao mesmo tempo, um dos mais ameaçados do planeta. Presente em 17 estados brasileiros e lar de mais de 70% da população do país, o bioma tem sua importância reconhecida. Mesmo assim, restam apenas cerca de 12% da sua vegetação original.

A Lei da Mata Atlântica (Lei nº 11.428/2006), sancionada em 22 de dezembro de 2006, é a única lei federal voltada exclusivamente para um bioma e representa uma conquista histórica da sociedade civil, ambientalistas e cientistas que lutaram por quase 15 anos no Congresso Nacional para sua aprovação.

Uma história de resistência e mobilização

A trajetória da Lei da Mata Atlântica começou em 1992, quando o então deputado Fábio Feldmann apresentou o projeto de lei que visava regulamentar a proteção e o uso sustentável do bioma e ecossistemas associados. Inspirada no reconhecimento constitucional da Mata Atlântica como Patrimônio Nacional pela Constituição de 1988, a proposta enfrentou diversas tentativas de enfraquecimento por setores contrários à proteção ambiental, em especial representantes do agronegócio e da indústria madeireira.

Entre arquivamentos, desarquivamentos, substitutivos polêmicos e disputas regimentais, o projeto só foi aprovado após intensas mobilizações da sociedade, denúncias públicas de manobras políticas e pressão contínua por parte de parlamentares ambientalistas e organizações da sociedade civil. Foram 14 anos de embates até que o Brasil passasse a contar com uma legislação específica para um de seus mais ameaçados biomas.

Linha do tempo resumida da aprovação da Lei da Mata Atlântica. Foto: Miriam Prochnow.

O que a Lei protege?

A Lei da Mata Atlântica regulamenta o uso e a proteção de formações vegetais típicas e ecossistemas associados ao bioma, conforme mapa oficial do IBGE (Decreto nº 6.660/2008), abrangendo:

  • Florestas Ombrófilas (Densa, Mista – como a Floresta com Araucárias – e Aberta)
  • Florestas Estacionais (Semidecidual e Decidual)
  • Campos de Altitude
  • Manguezais e vegetações de restingas
  • Refúgios vegetacionais, brejos interioranos e encraves florestais

Ela é especialmente rigorosa na proibição do desmatamento de florestas primárias e estabelece critérios claros para intervenções em áreas em regeneração, restauração ecológica, e para o uso sustentável da vegetação nativa, contribuindo para a conservação da biodiversidade e dos recursos hídricos.

Entre os principais avanços trazidos pela Lei, destacam-se:

  • Definição clara do domínio da Mata Atlântica
  • Proibição de supressão de florestas primárias
  • Regras específicas para áreas em regeneração
  • Incentivos à restauração ecológica
  • Estímulo à participação privada em projetos de conservação
  • Regulamentação de artigo constitucional que define o bioma como Patrimônio Nacional
  • Estabelecimento de critérios para a exploração econômica sustentável
Aplicações práticas: dos municípios à fiscalização ambiental

Os Planos Municipais de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica (PMMA) permitem que os municípios conheçam melhor seu território, identifiquem áreas prioritárias para conservação e restauração, e integrem a proteção da Mata Atlântica ao planejamento urbano e ambiental. Com o apoio de organizações da sociedade civil e órgãos estaduais, diversas cidades vêm avançando na elaboração e implementação desses planos, tornando a conservação mais próxima da realidade local.

A Operação Mata Atlântica em Pé é uma operação conjunta entre os Ministérios Públicos Estaduais, IBAMA, polícias ambientais e secretarias estaduais, que desde 2017, atua anualmente para identificar e responsabilizar desmatamentos ilegais no bioma. Utilizando imagens de satélite e ações de campo, a operação tem sido fundamental para coibir violações da lei, reforçar a fiscalização e dar visibilidade aos crimes ambientais.

Ameaça no Congresso: o PL da Devastação

Apesar de sua importância, a Lei da Mata Atlântica está sob ataque. O Projeto de Lei 2.159/2021, denominado por ambientalistas de “PL da Devastação”, pretende enfraquecer pontos cruciais da legislação, como a exigência de autorização para desmatamento de áreas em regeneração e a necessidade de compensações ambientais.

O PL ainda tem uma trajetória antes da sanção pelo presidente, momento onde organizações da sociedade civil lutam para barrar o avanço da proposta. A defesa da Lei da Mata Atlântica também é uma questão de saúde pública, segurança hídrica, equilíbrio climático e justiça socioambiental. No Dia Nacional da Mata Atlântica, é essencial lembrar que a floresta em pé é um direito de todos.

“Não podemos permitir que conquistas ambientais históricas sejam desmanteladas. A Mata Atlântica precisa de mais proteção, não menos. Reforçar o cumprimento da lei e barrar retrocessos como o PL 2.159/21 é uma urgência nacional”, comenta Carolina Schäffer, vice-presidente e coordenadora da Apremavi.

 

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Carolina Schäffer.
Foto de capa: Carolina Schäffer.

PL da Devastação é aprovado no Senado

PL da Devastação é aprovado no Senado

PL da Devastação é aprovado no Senado

Imagine acordar e descobrir que uma mineradora será instalada ao lado da sua casa. Nenhuma reunião na comunidade. Nenhum estudo técnico analisado por especialistas. Nenhuma garantia de que a água que você bebe continuará potável. 

Isso porque, com um simples formulário preenchido na internet, a empresa conseguiu uma autolicença, que agora se tornou regra. E o mais alarmante: esse modelo automático não será limitado a empreendimentos de pequeno porte. Projetos de médio porte e potencial poluidor também poderão se beneficiar desse atalho, ignorando os riscos reais para comunidades e ecossistemas inteiros.

Na noite de 21 de maio de 2025, essa cena hipotética se aproximou da realidade de milhões de brasileiros.  O Senado aprovou por 54 votos a 13 o Projeto de Lei (PL) 2.159/2021 que ambientalistas já renomearam de “PL da Devastação”, uma proposta que desmonta o sistema de licenciamento ambiental no Brasil. Agora, o projeto retorna à Câmara dos Deputados para votação final.

 

Um retrocesso histórico

Considerado o mais perigoso entre as propostas do chamado Pacote da Destruição, o PL 2.159/2021 tem sido duramente criticado por ambientalistas, juristas, cientistas e até mesmo pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA). O texto legaliza o autolicenciamento para diversos empreendimentos, como atividades agropecuárias, além de permitir a dispensa de análise prévia por órgãos ambientais.

De acordo com a nova regra, a maioria das atividades passará a ser autorizada com o simples preenchimento de um formulário autodeclaratório, sem estudo técnico, sem consulta pública, sem fiscalização prévia. Ou seja: quem vai poluir, desmatar ou degradar, autoriza a si mesmo. “Ao priorizar de forma irresponsável a isenção de licenças e o autolicenciamento, a proposta tem potencial de agravar a degradação ambiental, representando grave ameaça a direitos humanos fundamentais”, aponta nota técnica do Observatório do Clima, que elaborou uma análise detalhada de mais de 100 páginas sobre os impactos do projeto.

 

Riscos para povos tradicionais e omissão climática

Além de eliminar salvaguardas ambientais, o projeto ignora completamente a emergência climática, não há uma única menção ao tema. Também fragiliza os direitos de povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e outras comunidades tradicionais, restringindo a participação de órgãos como a Funai e o Iphan apenas a casos de territórios já oficialmente reconhecidos, e mesmo assim, de forma não vinculante.

“Isso institucionaliza o racismo ambiental”, alerta o Observatório do Clima. Segundo eles, a proposta subverte o princípio de precaução e deixa populações vulneráveis sem proteção efetiva contra megaprojetos com alto impacto.

 

Mata Atlântica sob ataque

Como se não bastasse, na véspera da votação no plenário, o relator senador Confúcio Moura (MDB-RO) acolheu uma emenda de última hora apresentada por Jayme Campos (União-MT), que libera o desmatamento de vegetação nativa na Mata Atlântica, contrariando a Lei da Mata Atlântica, sem necessidade de autorização ambiental.

“O projeto retira garantias históricas de proteção e ameaça diretamente os 12% restantes da cobertura original da Mata Atlântica”, denuncia Malu Ribeiro, da Fundação SOS Mata Atlântica para o Instituto Socioambiental. Ela destaca que a medida compromete serviços ambientais essenciais à segurança hídrica e à saúde de mais de 70% da população brasileira que vive nesse bioma.

 

Licenciamento ambiental: o que está em jogo?

O licenciamento ambiental é um dos principais instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981). Ele obriga que empreendimentos potencialmente poluidores sejam previamente analisados por autoridades ambientais antes de sua instalação ou funcionamento. Para isso, são exigidos estudos técnicos, consultas públicas e condicionantes que garantam a mitigação de impactos.

Com o PL aprovado, todo esse processo é ameaçado. O projeto transfere aos estados e municípios a possibilidade de ampliar dispensas de licenciamento e normaliza a chamada Licença por Adesão e Compromisso (LAC), um mecanismo automático e sem análise técnica prévia.

“O PL representa desestruturação significativa do regramento existente sobre o tema e representa risco à segurança ambiental e social no país”, alertou nota do próprio Ministério do Meio Ambiente.

 

O que ainda pode ser feito?

O projeto ainda precisa ser analisado pela Câmara dos Deputados, que decidirá se mantém ou não as mudanças feitas no Senado. Esse é o momento para mobilização da sociedade civil, pesquisadores, instituições e cidadãos que defendem o direito constitucional ao meio ambiente equilibrado. A pressão popular pode ser decisiva para evitar que o “PL da Devastação” entre em vigor. Precisamos de um licenciamento ambiental forte, técnico, participativo e transparente, não de uma carta branca para poluir e destruir.

> Saiba mais

Autora: Thamara Santos de Almeida, com informações do Observatório do Clima e Instituto Socioambiental.
Revisão: Carolina Schäffer.
Foto de capa: Ibama combate desmatamento ilegal na Terra Indígena Pirititi, Roraima. Foto: Felipe Werneck/Ibama.

Escalada que dá escala: treinamento fortalece a coleta de sementes

Escalada que dá escala: treinamento fortalece a coleta de sementes

Escalada que dá escala: treinamento fortalece a coleta de sementes

Entre os dias 28 e 30 de abril, a equipe da Apremavi e a GR Ambiental, empresa terceirizada que está prestando serviço de restauração para a instituição, participaram de um treinamento básico em escalada de árvores para coleta de frutos e sementes nativas na Fazenda Taquara em Painel (SC).

A coleta de sementes é uma etapa crítica e desafiadora da restauração ecológica. Ela exige conhecimento técnico para identificar espécies nativas em diferentes estágios de maturação, muitas vezes localizadas em locais de difícil acesso, como a copa de árvores altas ou o interior de florestas densas. Subir com segurança, manejar equipamentos adequadamente e garantir a integridade das árvores e das sementes são competências indispensáveis para projetos de restauração ecológica.

Pensando nisso, a Apremavi investiu no treinamento  da equipe  para essas atividades, reforçando seu compromisso com uma restauração ecológica de alta qualidade.

 

Conteúdo da formação

O curso abordou desde fundamentos básicos até práticas avançadas em escalada de árvores. Dividido entre aulas teóricas, simulações controladas e prática em árvores reais, o conteúdo incluiu:

  • Segurança e avaliação de riscos;
  • Conhecimento e uso correto dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs);
  • Aprendizado de nós, cordas, mosquetões e dispositivos de ascensão e descensão;
  • Técnicas de movimentação segura na copa das árvores e ancoragem;
  • Boas práticas de auto resgate e procedimentos de emergência;
  • Manutenção e cuidados com os equipamentos de escalada.

Ao final do curso, os participantes foram avaliados e receberam certificados garantindo que acessaram os conhecimentos necessários para atuar com segurança e eficácia no campo.

“O curso de escalada em altura foi muito importante, proporcionou muito mais segurança para executar nosso trabalho de coleta. Ao seguir corretamente todos os procedimentos de escalada, as chances de sofrer uma queda tornam-se praticamente nulas. Outra vantagem é o aumento da produtividade, já que agora conseguimos coletar espécies que antes não eram acessadas devido ao risco de queda”, relata Alex Sieves, coordenador adjunto do Viveiro Jardim das Florestas da Apremavi, que participou da formação.

Treinamento em escalada de árvores para coleta de frutos e sementes nativas na Fazenda Taquara em Painel (SC) maio de 2025

Atividades teóricas e práticas do curso de escalada para coleta de sementes, realizado de 28 a 30 de abril em Painel (SC). Fotos: Edilaine Dick

Parceiros com experiência

A formação contou com a expertise da Sociedade Chauá, ONG fundada em 2003 e reconhecida internacionalmente por sua atuação na conservação da Floresta com Araucárias. Com mais de 30 projetos implementados, a organização já mapeou mais de 3 mil árvores matrizes, plantou cerca de 100 mil mudas e mantém o maior viveiro de espécies da Floresta com Araucária no mundo, com mais de 350 espécies catalogadas.

A parceria técnica com os instrutores Ollyver Bizarro, Elivelton Marcos Gueski e Danilo Vidal Blasi e a Chauá garantiu uma abordagem prática, contextualizada e com conhecimento especializado das espécies nativas e das especificidades da coleta de sementes num dos ecossitemas mais ameaçados da Mata Atlântica, a Floresta com Araucárias.

 

Escala na restauração ecológica

Capacitar os coletores para acessar de forma segura e eficiente as sementes nativas da Mata Atlântica, em especial da Floresta com Araucárias, é um passo fundamental para dar escala à restauração ecológica. Com técnicas corretas, é possível aumentar a quantidade e a diversidade das sementes coletadas, garantindo mudas de qualidade e, consequentemente, florestas mais diversas.

“O investimento em formação valoriza os profissionais que atuam na linha de frente da restauração, fortalece a atuação da instituição e promove o desenvolvimento de soluções que aliam conhecimento técnico e compromisso com o futuro da Mata Atlântica”, comenta Edilaine Dick, coordenadora de projetos da Apremavi que acompanhou a formação.

A formação já deu frutos: a GR Ambiental realizou a coleta de mais de uma tonelada de pinhão, semente da araucária, na Fazenda Taquara.

 

Colaboradores da GR Ambiental, empresa contratada para prestar serviços de restauração à Apremavi, durante uma das coletas de pinhão realizadas após o curso

Colaboradores da GR Ambiental, empresa contratada para prestar serviços de restauração à Apremavi, durante uma das coletas de pinhão realizadas após o curso. Foto: Arquivo Apremavi.

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Carolina Schäffer e Vitor Lauro Zanelatto.
Foto de capa: Edilaine Dick.

Apremavi é eleita para o Conselho Nacional do Meio Ambiente

Apremavi é eleita para o Conselho Nacional do Meio Ambiente

Apremavi é eleita para o Conselho Nacional do Meio Ambiente

Representando a região sul, numa das vagas das ONGs ambientalistas, a Apremavi foi eleita para fazer parte do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). O resultado das eleições foi oficializado pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) no dia 16 de maio.

A lista divulgada no site do CONAMA apresenta o nome das entidades representantes da sociedade civil que irão compor o Conselho pelo próximo biênio. A Apremavi já esteve no CONAMA nos anos 1989 e 1990, representando a Região Sul, numa composição com a Associação Catarinense de Preservação da Natureza (Acaprena). 

Participação da Apremavi em uma reunião do CONAMA entre 89-90 sobre Energia Nuclear

Participação da Apremavi em uma reunião do CONAMA entre 89-90 sobre Energia Nuclear.

Histórico resumido da criação da ARIE Serra da Abelha e a importância do CONAMA.

Histórico resumido da criação da ARIE Serra da Abelha e a importância do CONAMA.

A outra organização eleita para a segunda vaga da região é a Mira-Serra. Por conta de um acordo histórico entre os ambientalistas da Região Sul, tanto a Apremavi, quanto a Mira-Serra indicarão como suplentes representantes de organizações do Paraná, respectivamente o Observatório de Justiça e Conservação (OJC) e o Centro de Estudos e Defesa e Educação Ambiental (Cedea). Este acordo existe para fortalecer a articulação e a representação das ONGs da região perante este que é o órgão colegiado mais importante da área ambiental no Brasil.

O processo de eleição para a escolha dos representantes se dá após a publicação do Edital de Convocação, tendo as entidades registradas no Cadastro Nacional de Entidades Ambientalistas um prazo para se inscrever no edital, indicando sua intenção de votar ou se candidatar. A votação ocorre virtualmente, sendo que cada entidade tem direito a dois votos regionais e três votos nacionais.

A representante da Apremavi no CONAMA será Carolina Schaffer, atual vice-presidente da organização. Com ampla experiência, conhecimento e compromisso com as questões ambientais, Carolina ressalta não apenas a importância da Apremavi ocupar este espaço, mas também a continuidade de um legado de engajamento na pauta ambiental em fóruns decisórios nacionais. “Representar a Apremavi é uma grande oportunidade, mas também uma enorme responsabilidade. Estou levando a voz da Apremavi e também para honrar uma história que já viu minha mãe como conselheira nos  anos 1990, e meu pai como representante do Ministério do Meio Ambiente.”

Estar no CONAMA permite à Apremavi participar ativamente das discussões e decisões sobre as políticas ambientais brasileiras. É um espaço estratégico para levar as experiências e as demandas da sociedade civil e contribuir para a construção de um futuro mais sustentável. A organização poderá influenciar temas cruciais como licenciamento, gestão de recursos hídricos, proteção da biodiversidade e combate às mudanças climáticas.

 

 

Entenda o que é o CONAMA

O Conselho Nacional do Meio Ambiente é o principal órgão consultivo e deliberativo do Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA). Ele foi criado em 1981 pela Lei 6.938, que estabeleceu a Política Nacional do Meio Ambiente.

A função do CONAMA é definir e propor políticas, diretrizes, normas e padrões para a gestão ambiental no Brasil. Suas decisões, muitas vezes na forma de Resoluções, estabelecem regras importantes para o licenciamento de atividades potencialmente poluidoras, a gestão de resíduos, a qualidade do ar e da água, a proteção de ecossistemas, entre outros temas essenciais para a proteção ambiental. O Conselho é composto por representantes do governo federal, governos estaduais e municipais, setor produtivo e sociedade civil, buscando um debate plural sobre as questões ambientais.

As reuniões do CONAMA são públicas e abertas a toda a sociedade.

 

Autoras: Carolina Schäffer e Miriam Prochnow.
Foto de capa: Carolina Schäffer.

Universitários do curso de Agronomia recebem o Programa Matas Legais em Telêmaco Borba

Universitários do curso de Agronomia recebem o Programa Matas Legais em Telêmaco Borba

Universitários do curso de Agronomia recebem o Programa Matas Legais em Telêmaco Borba

No dia 3 de abril, 35 estudantes do curso de Agronomia da UNIFATEB (Centro Universitário de Telêmaco Borba) participaram de uma atividade formativa promovida em parceria com o Programa Matas Legais. O encontro teve como tema central “A Relação da Floresta com a Água Frente às Mudanças Climáticas”, apresentado por Mauricio Reis, coordenador de projetos da Apremavi.

A atividade foi dividida em dois momentos. Na primeira parte, realizada em sala de aula, os estudantes puderam aprofundar o entendimento sobre a conexão entre florestas e recursos hídricos em um contexto de crise climática. Também foram abordados temas como legislação ambiental e as ações desenvolvidas pelo Programa Matas Legais na região.

Na segunda parte da ação, os estudantes participaram de uma dinâmica prática na quadra poliesportiva da instituição: o “Jogão Didático” do Matas Legais. Com apoio dos colaboradores da Apremavi, Weliton Oliveira e Pedro Ferreira, a atividade lúdico-pedagógica simulou um grande tabuleiro de 7×7 metros, no qual duplas de estudantes percorriam casas que representavam práticas ambientais positivas e negativas, proporcionando reflexões sobre os impactos dessas ações no meio ambiente.

Ao longo de toda a atividade, os acadêmicos demonstraram grande interesse, participação ativa e fizeram diversas perguntas, evidenciando o engajamento com os temas tratados.

Para o professor responsável, Anderson Farias, a ação foi de grande relevância para a formação dos futuros agrônomos:

“A palestra foi extremamente enriquecedora para os nossos acadêmicos. Em um momento em que a produção agropecuária sofre os efeitos das mudanças climáticas, é fundamental preparar os profissionais para atuarem de forma sustentável. Além disso, temas como restauração de áreas degradadas – incluindo APPs, Reservas Legais e áreas de pastagem – ainda são pouco explorados na formação dos engenheiros agrônomos. A palestra destacou a importância de conservar as florestas existentes, evitando a abertura de novas áreas. Os alunos se mostraram muito entusiasmados, e reforçamos a importância de novas parcerias e ações voltadas à sustentabilidade na agricultura.”

A atividade integrou a programação da XXI Semana de Engenharias e da I Semana de Agrárias da UNIFATEB, realizadas de 2 a 4 de abril, que reuniram acadêmicos, docentes e profissionais para o debate de temas atuais e relevantes nas áreas de Engenharia, Agronomia e Medicina Veterinária.

Universitários do curso de Agronomia recebem o Programa Matas Legais em Telêmaco Borba

Palestra e jogo didático realizados com o curso de Agronomia da UNIFATEB no dia 3 de abril de 2025. Fotos: Pedro Ferreira, Maurício Reis e Weliton Oliveira

O Matas Legais

É uma iniciativa da parceria entre a Apremavi e a Klabin que acontece em Santa Catarina e no Paraná. Busca desenvolver ações de conservação, educação ambiental e fomento florestal, que ajudam a preservar e recuperar os remanescentes florestais nativos, a melhorar a qualidade de vida da população e a aprimorar o desenvolvimento florestal, tendo como base o planejamento de propriedades e paisagens.

A palavra legal procura traduzir dois sentidos: o de cumprimento da legislação ambiental e o de expressão de um lugar agradável, bonito e bom para viver.

> Conheça o Matas Legais

 

Autor: Pedro Ferreira.
Revisão: Thamara Santos de Almeida.
Foto de capa: Pedro Ferreira, Maurício Reis e Weliton Oliveira.

Brasil reduz desmatamento em 2024, mas desafios permanecem

Brasil reduz desmatamento em 2024, mas desafios permanecem

Brasil reduz desmatamento em 2024, mas desafios permanecem

O sexto Relatório Anual do Desmatamento, produzido pelo MapBiomas, destaca a redução de 32%  no desmatamento no Brasil.

O Brasil assumiu a meta de zerar o desmatamento até 2030. Para que essa meta seja efetiva, não bastam apenas intenções: é fundamental monitorar e divulgar as perdas de vegetação nativa, além de combater com rigor o desmatamento ilegal. O risco de ser responsabilizado por suprimir ilegalmente vegetação precisa ser real e visível para frear a impunidade e a devastação ambiental.

Nesse contexto, o MapBiomas lançou nesta quarta-feira (15/05) o RAD 2024 – sexto Relatório Anual do Desmatamento no Brasil, consolidando seis anos de análise sistemática sobre os alertas de desmatamento em todos os biomas brasileiros. Os dados são fruto da iniciativa MapBiomas Alerta, que valida os alertas com imagens de alta resolução e cruza informações fundiárias e territoriais, como imóveis no CAR, áreas protegidas, assentamentos e terras indígenas, para entender a dinâmica e a legalidade das perdas florestais.

Uma queda inédita: maioria dos biomas apresenta redução no desmatamento.

Pela primeira vez desde 2019, o Brasil registrou queda na área desmatada em todos os biomas. O desmatamento no país caiu 32,4% em relação a 2023, consolidando o segundo ano consecutivo de redução. Ainda assim, o país perdeu cerca de 9,88 milhões de hectares de vegetação nativa desde o início do monitoramento, o equivalente a quase todo o estado de Pernambuco.

Apesar do avanço, o Cerrado permaneceu como o bioma com maior área desmatada pelo segundo ano seguido, superando a Amazônia. Quatro dos cinco estados que mais perderam vegetação nativa estão no Matopiba (áreas nos estados Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), considerada a nova fronteira agropecuária brasileira.

 

Desmatamento na Mata Atlântica 2024

Infográfico do desmatamento nos biomas brasileiros em 2024. Créditos: RAD 2024 MapBiomas

A Mata Atlântica não apresentou redução no desmatamento em 2024, permanecendo estável após uma queda expressiva de quase 60% em 2023. Foram emitidos 3.156 alertas, totalizando 13.264 hectares de vegetação nativa suprimida.

Parte significativa dessa perda se deu em Áreas de Preservação Permanente (APPs), como encostas e margens de rios, impactadas por eventos climáticos extremos no Rio Grande do Sul, como enchentes e deslizamentos entre abril e maio. O bioma registrou o maior aumento (46,4%) de desmatamento em APPs e, ao mesmo tempo, o menor percentual de áreas sob embargo entre todos os biomas, com apenas 2% do desmatamento submetido a sanções.

Para o ambientalista e professor João de Deus Medeiros, o cenário ainda é alarmante: “Parece absurdo, mas é mesmo. A Mata Atlântica, a despeito de toda sua longa história de devastação, segue perdendo vegetação nativa. E os alertas sobre o acelerado processo de conversão de áreas do Cerrado não cessam. Apesar dos números apontarem queda no desmatamento, estamos ainda distantes de uma situação razoável em termos de conservação da nossa vegetação nativa.”

 

Infográfico do desmatamento na Mata Atlântica em 2024. Créditos: RAD 2024 MapBiomas

Monitoramento e fiscalização: a aplicação concreta dos dados

A utilização dos alertas do MapBiomas vem sendo essencial para fortalecer a fiscalização ambiental e a responsabilização de infratores. Uma das principais iniciativas nesse sentido é a operação “Mata Atlântica em Pé”, que desde 2016 atua em todos os 17 estados abrangidos pelo bioma. Coordenada atualmente pela Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (ABRAMPA) e o Ministério Público de Minas Gerais, a operação monitora, investiga e responsabiliza desmatamentos ilegais.

Em 2024, a força-tarefa analisou 1.635 alertas, identificando mais de 19 mil hectares de desmatamento ilegal, um crescimento de 9% em relação ao ano anterior. O monitoramento de alta precisão vem permitindo intervenções mais eficazes e abrangentes.

Além disso, os dados de desmatamento começaram a ser integrados em análises de crédito rural. Em 2024, duas instituições financeiras informaram ao MapBiomas que 1,8 bilhão de reais em crédito rural foi bloqueado devido à detecção de desmatamento em áreas solicitantes. Entre cerca de 380 mil solicitações avaliadas, mais de 11.300 apresentavam desmatamento validado, sendo que 6.300 pedidos foram negados por ausência de comprovação de legalidade.

 

Caminhos para o desmatamento zero

Os avanços registrados em 2024 são importantes, mas não definitivos. O monitoramento contínuo e a transparência nos dados são ferramentas cruciais para frear o desmatamento ilegal. Entretanto, ainda é necessário fortalecer a articulação entre órgãos de controle, Ministério Público, setor financeiro e sociedade civil, para que as perdas de vegetação nativa não apenas sejam monitoradas, mas efetivamente punidas e revertidas.

Alcançar o desmatamento zero até 2030 exige muito mais que tecnologia: requer vontade política, ação coordenada e responsabilização eficaz. 

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Capa RAD 2024 MapBiomas

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto.
Foto de capa: Terra Indígena Pirititi, Roraima. Ibama apreende 7.387 toras extraídas ilegalmente da Terra Indígena Pirititi, em Roraima © Felipe Werneck/Ibama.

Rede de Sementes Mais Floresta se reúne para planejamento com o Redário

Rede de Sementes Mais Floresta se reúne para planejamento com o Redário

Rede de Sementes Mais Floresta se reúne para planejamento com o Redário

Após uma temporada intensa de coleta de sementes na primavera e verão, a Rede de Sementes Mais Floresta se reuniu no último dia 15 de abril no Sítio Oliveira (PA Juruá) – em Abelardo Luz, para mais uma atividade de planejamento. O evento contou com 17 pessoas, entre coletores, equipe da Apremavi e convidados.

A reunião teve como principal objetivo a aplicação do “Muvucômetro”, uma ferramenta de diagnóstico que avalia a maturidade das redes de sementes, identificando seus pontos fortes e necessidade  de aprimoramento. A ação foi coordenada por Giovanna Bernardes, madrinha da Rede de Sementes Mais Floresta pelo Redário, movimento que reúne as Redes de Sementes do Brasil. A atividade permitiu que coletores e técnicos pudessem descrever a trajetória da rede e vislumbrar ações futuras para o grupo. 

Outro ponto de diálogo do encontro foram os dados de coleta de 2024: no último ano foram coletados 207,16 kg de sementes, sendo as sementes mais coletadas: pinhão, butiá, jerivá e imbuia. Na ocasião, houve uma premiação simbólica para a família que coletou a maior diversidade de espécies no ano passado. A família Oliveira conquistou o reconhecimento por ter coletado 13 espécies diferentes.

José de Oliveira, agricultor e coletor de sementes, comenta a participação na Rede Mais Floresta: “Eu gosto de participar da rede, porque a gente nasceu e se criou no interior. Eu gosto de andar no mato, então quando a gente vai catar semente é uma coisa muito boa”.

 

A Rede de Sementes Mais Floresta 

Formada em abril de 2023, a Rede de Sementes Mais Floresta surgiu das demandas da cadeia da restauração e atuais dificuldades na coleta de sementes. Os coletores engajados na Rede são moradores de seis projetos de assentamentos (PAs) de Abelardo Luz (PA 13 de Novembro, PA José Maria, PA Juruá, PA Papuã 1, PA Roseli Nunes e PA Volta Grande), localizada no oeste de Santa Catarina. As primeiras sementes coletadas foram da árvore símbolo da fitofisionomia regional: a araucária, e atualmente são coletadas sementes de mais de 20 espécies nativas da Floresta Ombrófila Mista, com potencial de expandir para 91 espécies, de acordo com estudos de ocorrências na região e demanda para projetos existentes.

 

Apoio

A Rede de Sementes Mais Floresta é apoiada pela Apremavi, através do Projeto +Floresta (coordenação) e Projeto Conservador das Araucárias (apoio).

O projeto + Floresta é financiado pelo Ibama através do Acordo de Cooperação Técnica nº 34/2021 e supervisionado pelo Ministério Público Federal de Santa Catarina (MPF/SC), pelo Instituto Socioambiental (ISA) e pela Justiça Federal de Santa Catarina, na forma da ação n° 5001458-53.2017.4.04.7200/SC.

 

Autoria: Marluci Pozzan.
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto.
Foto de capa: Arquivo Apremavi.

A emoção de ver a Terra com os olhos de David Attenborough

A emoção de ver a Terra com os olhos de David Attenborough

A emoção de ver a Terra com os olhos de David Attenborough

Sir David Attenborough acaba de completar 99 anos, quase um século dedicado à celebração da vida na Terra. Naturalista, documentarista, escritor e dono da voz mais reconhecível do planeta, ele relaciona a natureza com arte e emoção, despertando em cada um de nós a curiosidade infantil que conduz ao cuidado com o mundo natural.

Ao longo de mais de sete décadas, Attenborough tem nos levado através das telas a florestas tropicais, desertos, oceanos profundos e até às geleiras do Ártico. Mas mais do que nos mostrar imagens incríveis, ele nos convida a sentir, e a proteger, a extraordinária diversidade da vida. Seus documentários são obras de contemplação e urgência. Ele sabe, como poucos, conjugar beleza e alerta, maravilhamento e responsabilidade.

 

O começo de tudo

Nascido em Londres, em 8 de maio de 1926, David cresceu em Leicester, no interior da Inglaterra, onde desenvolveu cedo uma paixão pelo mundo natural, caçando fósseis em pedreiras abandonadas. Foi em 1936, aos 10 anos, ao assistir a uma palestra do controverso conservacionista Grey Owl com seu irmão Richard, que algo mudou para sempre. Pela primeira vez, Attenborough ouviu que os humanos estavam colocando a natureza em perigo. Essa ideia o acompanharia por toda a vida.

Formado em ciências naturais pela Universidade de Cambridge, ele entrou na BBC em 1952 e logo revolucionou a maneira como o público via o mundo natural. Seu primeiro grande sucesso foi Zoo Quest (1954), onde os animais eram filmados em seu habitat, algo inédito na época. Foi com a série Life on Earth (1979) que ele conquistou o planeta. Com 13 episódios e uma escala técnica monumental, a série foi assistida por cerca de 500 milhões de pessoas. Um dos momentos mais emblemáticos da série, e também da televisão mundial, foi o encontro de Attenborough com gorilas da montanha em Ruanda, capturado com uma sensibilidade que transcende a tela.

 

A arte de inspirar

David é um contador de histórias que nos envolve com a poesia das imagens e a intensidade das palavras. Sua narração na voz de Deus“, como cunhou o New York Times, é uma sinfonia de reverência à vida. Cada cena que ele descreve carrega uma emoção sutil, como se falasse com o coração de cada espectador.

Ao longo dos anos, seu trabalho ficou cada vez mais marcado pelo ativismo. Mesmo que tenha demorado a aderir à causa climática, admitindo publicamente em 2005, após uma palestra transformadora do cientista Ralph Cicerone, que “não tinha dúvidas” sobre as mudanças climáticas, desde então tem usado sua influência para alertar sobre o colapso ecológico em curso. Documentários como The Blue Planet, Our Planet e A Life on Our Planet transformaram-se em verdadeiros manifestos ambientais. E não é por acaso que, em 2021, Attenborough recebeu o título de “Campeão da Terra” das Nações Unidas, a maior honraria ambiental do planeta.

 

Lançamento marca seu aniversário

Ao se aproximar de seu 99º aniversário, Sir David apresenta Ocean, seu novo documentário no contexto de sua notável vida e carreira, estudando e refletindo sobre os oceanos como a última parte do mundo a ser totalmente compreendida e também, talvez, a última a ser explorada e saqueada.

Como ele mesmo afirma, até relativamente pouco tempo atrás, o oceano era considerado uma espécie de Saara misterioso e indiferenciado, uma região selvagem, de interesse principalmente por fornecer um suprimento aparentemente infinito de alimentos. Ocean nos mostra uma vista incrível de diversidade e vida, uma paisagem ondulante extraordinária, um segundo planeta gigante cuja existência a humanidade há muito desconhece, mas que agora parece estar em perigo de danificar ou mesmo destruir. Mais uma vez, Attenborough nos lembra que a contemplação da beleza deve vir acompanhada de responsabilidade e urgência.

 

Uma vida em nomes, memórias e legados

Cerca de 50 espécies foram nomeadas em sua homenagem: sapos, plantas carnívoras, moluscos e até fósseis de répteis marinhos. Contudo, o maior legado de Attenborough talvez seja como ele nos fez sentir. Seus documentários nos lembram de algo essencial: só protegemos aquilo que amamos, conhecemos e que nos conectamos. E para amar, é preciso ver, com olhos de encantamento, com o espírito de descoberta, com a ternura de quem entende que fazemos parte deste mesmo planeta.

Como ele mesmo disse ao presidente Barack Obama, em 2015: “Nunca conheci uma criança que não estivesse interessada na história natural. A pergunta não é por que algumas se interessam, mas como outras perdem esse fascínio.”

Aos 99 anos, David Attenborough continua nos provocando e inspirando a seguir na luta em defesa da vida. Ao transformar ciência em arte e educação em encantamento, ele inspira gerações a cuidar da Terra como se cuida de um lar. Suas histórias nos lembram que a natureza não está separada de nós, nós somos natureza e fazemos parte dela.

Feliz aniversário Sir David Attenborough e muito obrigada por esse maravilhoso legado. Que sua inspiração alcance ainda mais pessoas ao redor do planeta.

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto e Miriam Prochnow.
Foto de capa: William Murphy/Informatique, CC BY-SA 2.0 via Flickr.

Avanços recentes na proteção dos Campos de Altitude

Avanços recentes na proteção dos Campos de Altitude

Avanços recentes na proteção dos Campos de Altitude

Os Campos de Altitude, formações vegetacionais únicas e de extrema importância ecológica, estão no centro de propostas legislativas que ameaçam a sua conservação. A tramitação do Projeto de Lei 364/2019 propõe a exclusão desses ecossistemas, e de todas as fitofisionomias não florestais, da proteção conferida pela legislação nacional. A medida, se aprovada, colocará em risco diversas áreas naturais em todos os biomas brasileiros.

Ainda que o projeto de lei federal esteja em debate, os impactos da agenda de flexibilização já são sentidos em nível estadual. Um exemplo é o de Santa Catarina, onde, em 2022, o Código Estadual do Meio Ambiente foi alterado restringindo a proteção dos Campos de Altitude apenas às áreas localizadas acima de 1500 metros de altitude. Além disso, o Código Estadual, contrariando a legislação federal, redefiniu os critérios para definir vegetação campestre primária e classificar os estágios sucessionais da vegetação secundária. Apenas considerando a definição de Campos de Altitude trazida pelo Código catarinense, sua aplicação implica na redução da área protegida para apenas 3,8% da cobertura original de vegetação campestre no Estado, segundo projeção com base na área mapeada pelo IBGE. 

Apesar das ameaças, o último mês trouxe importantes iniciativas favoráveis aos Campos de Altitude. A primeira veio da Advocacia-Geral da União (AGU), que assegurou a validade das sanções aplicadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) a um produtor rural do município de Vacaria, na serra gaúcha. O produtor foi multado em cerca de R$ 2 milhões e teve uma área de mais de 300 hectares embargada por desmatamento ilegal de vegetação nativa pertencente ao bioma da Mata Atlântica.

A Procuradoria Regional Federal da 4ª Região, que atuou no caso em nome do Ibama, defendeu que os Campos de Altitude, assim como o bioma Pampa, são vitais para a regulação do clima, dos recursos hídricos, da qualidade do solo e do ar. Além disso, ressaltou a biodiversidade singular desses ambientes, que abrigam espécies endêmicas, ou seja, exclusivas da região.

A mobilização pela conservação dos Campos de Altitude também ganhou força institucional com o posicionamento do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). Na 145ª Reunião Ordinária, realizada em 23 de abril, o conselho aprovou, por ampla maioria, uma moção de repúdio às alterações do Código Ambiental de Santa Catarina que retiram a proteção aos Campos de Altitude. A manifestação, defendida por entidades como o Conselho Regional de Biologia da 9ª Região (CRBio-09), destacou os riscos que as mudanças representam para a conservação e o uso sustentável da vegetação campestre da Mata Atlântica. A votação teve 34 votos favoráveis, 11 contrários e 5 abstenções, configurando importante vitória frente as tentativas de obstrução por parte de representantes do governo catarinense e do setor florestal.

A pressão agora avança para o Supremo Tribunal Federal (STF). O Ministério Público Federal (MPF), por meio do Procurador-Geral da República, Paulo Gonet Branco, ingressou com uma ação pedindo a declaração de inconstitucionalidade de trechos do Código do Meio Ambiente de Santa Catarina. Segundo o MPF, as normas estaduais violam a Constituição Federal e leis nacionais de proteção à Mata Atlântica, além de extrapolarem a competência legislativa estadual, ao invadir matéria de regulamentação federal.

“A luta em defesa da Mata Atlântica, incluindo os ecossistemas associados como os Campos de Altitude, é anterior à Constituição de 1988, tanto é que os constituintes reconheceram a Mata Atlântica como patrimônio nacional. Isso permitiu a regulamentação da conservação, proteção, regeneração e  utilização da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica, por lei federal em todos os 17 estados de sua ocorrência, ou seja, os estados devem seguir a legislação federal, podendo apenas impor restrições adicionais e não flexibilizar como fez Santa Catarina”, comenta Wigold B. Schaffer, coordenador do Núcleo Mata Atlântica do Ministério do Meio Ambiente na época da aprovação e regulamentação da Lei 11.428, de 2006.

O embate em torno dos Campos de Altitude reflete, na essência, um conflito mais amplo entre um modelo de desenvolvimento baseado na exploração intensiva dos recursos naturais e a urgência de transições para alternativas sustentáveis. Conservar esses ecossistemas vai além da proteção da biodiversidade: é garantir a continuidade de serviços ambientais vitais, como a regulação do clima e a segurança hídrica. Os recentes avanços, com as iniciativas no campo jurídico e institucional, demonstram que ainda há caminhos para conter os retrocessos e fortalecer a agenda ambiental.

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Wigold Schäffer e João de Deus Medeiros.
Foto de capa: Wigold Schäffer.

O pequeno gigante da Floresta com Araucárias: a jornada do papagaio-charão

O pequeno gigante da Floresta com Araucárias: a jornada do papagaio-charão

O pequeno gigante da Floresta com Araucárias: a jornada do papagaio-charão

Imagine acordar em um no interior do sul do Brasil e avisar um colorido vibrante no céu, além de um sol alto, potente, impossível de ignorar, como se a floresta ganhasse voz própria. São centenas, às vezes milhares, de aves verdes com uma máscara vermelha vibrante sobre os olhos. Essa é a revoada do papagaio-charão (Amazona pretrei), um espetáculo da natureza que encanta cientistas, moradores locais e turistas todos os anos.

Apesar de ser o menor papagaio brasileiro, o charão se destaca por voar as maiores distâncias diariamente. Sua vida é marcada por jornadas extensas e uma impressionante vida em grupo, formando as maiores concentrações populacionais conhecidas entre os papagaios do Brasil. 

A história do charão é profundamente conectada com as Florestas com Araucárias, especialmente no sudeste de Santa Catarina e nordeste do Rio Grande do Sul. Entre março e julho, ele encontra seu banquete preferido: as sementes do pinheiro-brasileiro (Araucaria angustifolia), conhecidas como pinhão. Durante o restante do ano, em seu período reprodutivo, migra de volta ao Rio Grande do Sul, onde habita paisagens de campos abertos e pequenos capões de mato, hoje bastante modificados pela ação humana.

Com sua plumagem verde-claro e uma mancha vermelha que cobre a testa até a parte de trás dos olhos, o papagaio-charão é uma figura marcante. Vive em grandes grupos – exceto durante a reprodução, quando forma casais. A fêmea choca os ovos enquanto o macho lhe traz alimento. E quando os filhotes estão prontos para voar, são rapidamente integrados ao bando maior. A espécie é migratória, e todos os anos mais de 20 mil aves cruzam o céu Santa Catarina em busca do alimento que garante sua sobrevivência.

O charão não vive apenas entre as araucárias, ele as protege, devido a sua dependência pela espécie. Com a destruição de seu habitat sua sobrevivência está ameaçada e hoje a espécie está ameaçada de extinção. O que antes era um espetáculo comum em locais como a Estação Ecológica de Aracuri, no RS, agora se tornou raro.

Desde a década de 90 pesquisadores perceberam que os bandos migratórios haviam abandonado o Rio Grande do Sul e migrado em massa para Santa Catarina, onde ainda existem grandes áreas conservadas com araucárias. A mudança de rota foi reveladora: mesmo com Unidades de Conservação, se o entorno das áreas protegidas não for conservado, as espécies desaparecem.

 

O Projeto Charão e a luta pela conservação

Foi com essa preocupação que nasceu o Projeto Charão, criado por Jaime Martinez e Nêmora Prestes, biólogos e apaixonados pela espécie. Desde 1991, o projeto estuda, monitora e luta pela proteção do papagaio-charão, numa parceria entre a Universidade de Passo Fundo e a AMA (Associação dos Amigos do Meio Ambiente). Com o uso de técnicas como radiotelemetria, identificaram as rotas migratórias da espécie e criaram estratégias para sua conservação.

Em 2018 fundaram a Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) Papagaios de Altitude, em Urupema (SC), para proteger os principais pontos de alimentação da ave. Essa RPPN também abriga o papagaio-de-peito-roxo, outro devorador de pinhão e morador das araucárias.

Papagaio-charão

Papagaio-charão e sua revoada. Foto: Arlei antunes, CC BY-SA 4.0, via Wikimedia Commons e Wigold Schäffer.

Um convite para observar e proteger

A cada inverno, as montanhas da serra catarinense são palco de uma revoada única. Turistas e observadores de aves do mundo inteiro vão a Urupema ver de perto essa dança aérea dos charões. Mais do que uma atração, o espetáculo é um lembrete de que a conservação depende de ação concreta, pesquisa, educação e respeito ao ritmo da natureza.

Se você ainda não viu uma revoada de papagaio-charão, quem sabe o próximo inverno seja a oportunidade perfeita para se encantar com esse pequeno gigante das araucárias no Festival dos Papagaios.

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Papagaio-charão

Nome científico: Amazonia petrei.
Família: Psittacidae.
Habitat: Floresta com Araucárias (SC) e formações florestais conhecidas por capões de mato, em meio a áreas abertas (RS).
Alimentação: Preferencialmente a semente de araucária, além de frutos, sementes, folhas e flores de dezenas de espécies de plantas nativas e algumas exóticas, destacando-se os frutos de guabiroba (Campomanesia xanthocarpa), cereja (Eugenia involucrata), sementes de camboatá-vermelho (Cupania vernalis), canela (Ocotea puberula).
Peso: 280 g.
Comprimento: 32 cm.
Hábito de vida: monogâmico.
Distribuição: Mata Atlântica (Rio Grande do Sul e Santa Catarina).
Ameaças: perda de habitat devido à destruição das florestas e pelo tráfico ilegal.
Status de conservação: Vulnerável (VU) pelo MMA, IUCN e Lista da Fauna Ameaçada de Extinção no Rio Grande do Sul; Em Perigo (EN) segundo a Lista das Espécies da Fauna Ameaçada de Extinção de Santa Catarina.

 

Referências consultadas:

AMA, ÁVILA, A. B., MARTINEZ, J., PRESTES, N. P., PRESTES, M. X. As aventuras do papagaio-charão em quadrinhos. Santa Maria: Associação Amigos do Meio Ambiente, 2002, v.1. p. 64. 

BIRDLIFE INTERNACIONAL 2022. Amazona pretrei. The IUCN Red List of Threatened Species 2022: e.T22686251A210018258

MARTINEZ, Jaime. Pequeno, muito social, migrante, exuberante e adora voar: esse é o papagaio-charão. Parque das Aves, 21 jun. 2023.

PARQUE DAS AVES. Migrando com o misterioso papagaio-charão. Parque das Aves, 11 maio 2022.

UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO. Projeto Charão. 

 

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Foto de capa: Wigold Schäffer.

Apremavi apoia o 12º Festival dos Papagaios em Urupema (SC)

Apremavi apoia o 12º Festival dos Papagaios em Urupema (SC)

Apremavi apoia o 12º Festival dos Papagaios em Urupema (SC)

Em meio à exuberante paisagem de Urupema (SC), o 12º Festival dos Papagaios aconteceu entre os dias 25 e 27 de abril, reunindo mais de 270 participantes de 8 estados brasileiros e também dos Estados Unidos, da França e da Bélgica.

Organizado pelo Instituto de Pesquisas de Aplicação Ambiental e Cultural (IPAC) em parceria com a comunidade local, o festival contou com a colaboração e apoio de parceiros como a Prefeitura Municipal de Urupema, o Sicoob, a Sicredi, o Colégio Santa Rosa de Lages e a Apremavi.

Nossa participação no Festival é uma aproximação com a comunidade da região da Serra Catarinense, local onde estamos cada vez mais presentes no desenvolvimento de projetos de conservação e restauração da Mata Atlântica”, destaca Carolina Schaffer, vice-presidente da Apremavi.

Estande da Apremavi no Festival dos Papagaios, em Urupema (SC)

Estande da Apremavi no Festival dos Papagaios, em Urupema (SC). Foto: Carolina Schaffer.

Celebrando a chegada de milhares de papagaios-charão (Amazona pretrei) e papagaios-de-peito-roxo (Amazona vinacea), que visitam a região na estação de inverno para se alimentar do pinhão, o Festival proporcionou uma programação com 22 atividades interativas e educativas, como saídas de campo para observação de aves, incluindo as impressionantes revoadas dos papagaios e trilhas para vistoria de comedouros, além de palestras e oficinas educativas para diferentes faixas etárias.

A programação gratuita e diversificada do evento também incluiu exposições de desenhos e fotografias, concurso e premiação de desenhos e uma feira de produtos regionais com gastronomia típica. Na feira a Apremavi montou um estande onde foram vendidas e doadas árvores nativas e produtos da Ecoloja, distribuídos materiais de educação ambiental e divulgado o projeto Conservador das Araucárias

Em 12 anos de festival, esta edição trouxe a primeira mesa-redonda com especialistas, ambientalistas, guias de turismo e membros da comunidade local para discutir estratégias inovadoras para o “Desenvolvimento do Birdwatching em Urupema”, com ideias e soluções para conservar a natureza e promover o turismo sustentável na região. A Apremavi esteve na mesa redonda onde apresentou o Projeto Conservador das Araucárias e destacou a importância da conservação da Mata Atlântica para a manutenção das atividades de observação de aves. “Eventos como o Festival dos Papagaios são fundamentais para aproximar as pessoas da natureza e inspirar atitudes em defesa das espécies nativas e de seus habitats”, destacou Carolina.

 

Revoada papagaio-charão no Festival dos Papagaios, em Urupema

Atividades do 12° Festival dos Papagaios, em Urupema (SC). Fotos: Arquivo Apremavi.

O evento, que ao longo dos anos tem ganhado notoriedade não apenas pela presença dos entusiastas da observação de aves, é uma ótima oportunidade para reafirmar o compromisso da comunidade com a conservação da natureza e da biodiversidade e a busca por um futuro mais sustentável.

A participação da Apremavi no Festival dos Papagaios fez muita diferença, afinal não podemos falar de observação de aves sem pensar no meio ambiente, comenta Julia Monteiro, co-organizadora do evento. “Saber sobre os projetos que acontecem na região é de suma importância para a gestão pública e para as empresas da cidade, que podem olhar para a preservação e recuperação de áreas com mais carinho e respeito. Esperamos que este Festival seja o início de novos projetos e grandes parcerias”, destaca Julia.

 

O Festival dos Papagaios

O Festival surgiu há 12 anos não apenas para destacar a beleza da Floresta com Araucárias e das aves símbolo da região, mas também para promover a conscientização sobre a importância da conservação da biodiversidade local.

Segundo pesquisadores, o papagaio-charão e o papagaio-de-peito-roxo iniciaram em 1995 o seu processo de migração para a Serra Catarinense, mais precisamente as cidades de Urupema, Painel e Lages, em virtude da vasta área de Araucárias (Araucaria angustifolia). A população de papagaios que migra para a região todos os anos é em torno de 20 mil, todos vindos do Rio Grande do Sul em busca de alimento: o pinhão.

Saiba mais na página do Festival.

Autora: Carolina Schäffer.
Revisão: Thamara Almeida.
Foto de capa: Revoada de papagaios-charão, de Wigold Schaffer.

Observatório do Clima realiza encontro de comunicadores da rede

Observatório do Clima realiza encontro de comunicadores da rede

Observatório do Clima realiza encontro de comunicadores da rede

A Apremavi esteve presente no primeiro encontro presencial dos comunicadores das organizações que integram o Observatório do Clima (OC), realizado no último dia 23 em São Paulo. O evento reuniu profissionais da comunicação de diversas regiões do Brasil para fortalecer a atuação em rede na comunicação sobre a crise climática.

O encontro foi iniciado com uma rodada de apresentações, em que cada participante compartilhou ações em andamento em suas organizações. Em seguida, Marcio Astrini, secretário executivo do OC, reforçou a importância do encontro e o papel estratégico da comunicação para o fortalecimento das campanhas coletivas da rede. Segundo ele, o objetivo é consolidar uma atuação colaborativa, com entregas em grupo e construção de narrativas comuns.

Um dos temas debatidos foi a Conferência do Clima das Nações Unidas (COP30), que acontecerá em Belém em 2025. O site “Central da COP” foi apresentado por Joana Amaral e Roberto Kaz, do OC, como foco prioritário da comunicação no próximo ano. A iniciativa reúne informações sobre clima e COP, mas escrito com uma linguagem de futebol. Eles convidaram as organizações a contribuírem com conteúdos e propuseram a realização de eventos descentralizados.

Bruno Torturra trouxe reflexões relevantes sobre os desafios da comunicação no cenário atual. Ele destacou a transformação do ecossistema midiático a partir de 2011, com a popularização dos smartphones, e como as redes sociais se tornaram uma extensão do espaço público. Também chamou a atenção para a necessidade de estimular mais encontros presenciais e conexões reais no pós-pandemia.

“Precisamos transformar o ansioso climático em um revoltado climático, alguém que canaliza sua inconformidade em ação concreta”, provocou Bruno. Ele também criticou o uso superficial das ferramentas digitais, como grupos de WhatsApp, sem estratégias efetivas para disputar a atenção do público em meio ao excesso de informações.

Em seguida, as organizações presentes foram convidadas a discutir em grupo temas como imprensa, redes sociais, campanhas e advocacy. Os participantes compartilharam boas práticas, limitações enfrentadas e sugestões para aprimorar a comunicação das organizações e do OC como um todo.

As organizações ressaltaram a importância de comunicar a  mudança no clima e temas associados de forma mais simples e acessível, sem perder a profundidade. Foi mencionada a necessidade de superar o cansaço com as pautas socioambientais e evitar a complexidade excessiva e a linguagem demagógica.

“O encontro foi uma oportunidade valiosa para perceber que os desafios, angústias, e também as oportunidades, no campo da comunicação são comuns entre as organizações. As soluções para a crise climática se tornam mais potentes quando colocadas em prática de forma colaborativa, em rede. É dessa conexão que surgem transformações reais a partir de boas ideias”, relata Thamara Santos de Almeida, colaboradora da Apremavi, que esteve presente no evento.

Márcio Astrini e Joana Amaral, do Observatório do Clima, durante suas falas no encontro de comunicadores. Foto: Thamara Almeida.

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto.
Foto de capa: Felipe Werneck/Observatório do Clima.

Informe Brasil 2045: avanços nas políticas ambientais em 2024

Informe Brasil 2045: avanços nas políticas ambientais em 2024

Informe Brasil 2045: avanços nas políticas ambientais em 2024

O Observatório do Clima lançou, no mês passado, o “Informe Brasil 2045 – Anual 2024”, elaborado com contribuições de diversas organizações da rede da instituição, cada uma atuando em sua especialidade. O documento apresenta um panorama do avanço em várias áreas relacionadas às políticas públicas ambientais, destacando pontos de atenção e propondo medidas para seu aperfeiçoamento e efetividade.

A estratégia Brasil 2045 projeta uma visão ambiciosa: fazer com que o Brasil vá além da neutralidade de carbono até 2050, aproveitando suas vantagens comparativas para se tornar a primeira grande economia do mundo a sequestrar mais gases de efeito estufa do que emite – alcançando a condição de país carbono negativo até 2045.

“Não é possível (tampouco plausível) que o Poder Público e a sociedade tenham uma postura inerte frente à crise climática, pois, conforme já é reconhecido, o custo de remediar danos é bem mais alto do que o de se preparar”, comenta Suely Araújo, coordenadora de Políticas Públicas do Observatório do Clima (OC), na introdução do documento.

A política climática e os acordos internacionais avançaram em 2024 com a aprovação da Lei 14.904/2024, que define diretrizes para planos de adaptação às mudanças climáticas, embora tenha excluído critérios de raça, gênero e deficiência. A apresentação final dos Planos Clima foi adiada para a COP30, em Belém, e o governo realizou apenas uma consulta limitada sobre a Estratégia Nacional de Adaptação. Foram instituídos o Programa Cidades Verdes Resilientes e o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), pela Lei 15.042/2024. O documento também destacou o anúncio do Fundo Florestas Tropicais para Sempre, previsto para lançamento na COP30, e o fortalecimento da diplomacia climática com a inclusão de soluções oceânicas nas metas brasileiras e a parceria com a França na declaração “De Nice a Belém: Brasil e França unidos em defesa dos oceanos e do clima”.

Em 2024, o Brasil intensificou as ações de prevenção e controle do desmatamento com a consolidação dos Planos de Ação (PPCDs), incluindo o relançamento do PPCDAm e o programa União com Municípios. O governo firmou parcerias com o Judiciário e cartórios para enfrentar a grilagem de terras e, por decisão do STF, deverá zerar o desmatamento na Amazônia até 2030. 

Planos específicos para a Caatinga e o Pantanal também foram finalizados, com metas de fiscalização e criação de fundos regionais. No Legislativo, a Lei 14.932/2024 permitiu o uso do CAR para fins fiscais sem necessidade de validação; gerando críticas, enquanto a Medida Provisória 1276/2024 fortaleceu o Fundo Nacional de Meio Ambiente e facilitou o repasse de recursos para combate a incêndios e recuperação ambiental, medidas que ainda exigem regulamentação e monitoramento rigoroso.

Em relação às iniciativas voltadas à bioeconomia e às atividades agrossilvopastoris, foi instituído o Programa Nacional de Florestas Produtivas, com foco na recuperação de áreas degradadas por agricultores e empreendedores rurais familiares. Também foi criado o Programa Coopera Mais Brasil, com o objetivo de fortalecer o cooperativismo, o associativismo e os empreendimentos solidários da agricultura familiar. 

Além disso, foi estabelecida a Comissão Nacional de Bioeconomia (CNBio) para elaborar e implementar o Plano Nacional de Desenvolvimento da Bioeconomia, com diretrizes como descarbonização e estímulo ao uso sustentável da biomassa. Por fim, foi instituído o Planapo 2024-2027, destinado à promoção da agroecologia, da sociobiodiversidade e da produção orgânica.

No campo da justiça climática, houve a homologação de terras indígenas e avanços na titulação de territórios quilombolas, enquanto o Supremo Tribunal Federal gerou preocupações ao propor uma “conciliação” sobre a tese de Marco Temporal, mesmo após sua inconstitucionalidade ter sido reconhecida. O Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) recomendou a suspensão da Lei 14.701/2023 e a inclusão da demarcação de terras indígenas no Plano Clima. Também está em andamento a regulamentação do reconhecimento de territórios de outros povos e comunidades tradicionais.

Em resposta ao desastre climático no Rio Grande do Sul, o governo federal adotou medidas emergenciais como o Auxílio Reconstrução, repasse de recursos para os municípios e criação do Grupo de Trabalho Cheias RS. A Medida Provisória 1.278/2024 autorizou a destinação de até R$ 6,5 bilhões para ações de reconstrução e adaptação climática, embora ainda faltem informações sobre os resultados concretos do GT.

“Os eventos climáticos extremos ocorridos no Rio Grande do Sul, em maio de 2024, foram um grande choque da nova realidade climática que está se impondo e para a qual definitivamente não estamos preparados. Esse aspecto, por si só, deveria ser suficiente para que as ações previstas visando a reconstrução e também a preparação para possíveis novos eventos não sejam mais do mesmo, porque elas não vão dar conta do que é preciso fazer. Se não tivermos a capacidade de pensar e implementar políticas muito mais audaciosas, arrojadas e efetivas, vamos acabar normalizando a tragédia”, comenta Miriam Prochnow, cofundadora e diretora da Apremavi, no documento.

A agenda de energia teve como foco a exploração de minerais estratégicos para a transição energética, com a assinatura de acordos internacionais e o lançamento de um fundo de investimentos específico. A Política de Apoio ao Licenciamento Ambiental de Projetos de Minerais Estratégicos permanece sem representação ambiental no comitê gestor, e não há previsão para a publicação de uma nova política de mineração. Também foi instituído o Programa Potencializa E&P para estimular a exploração de petróleo e gás, mesmo com contradições frente à meta de descarbonização. O marco legal do hidrogênio de baixa emissão de carbono foi aprovado, com criação de incentivos fiscais e programas de desenvolvimento, embora o plano de trabalho para sua implementação ainda não tenha sido divulgado. No campo das renováveis, foi aprovada a lei das eólicas offshore e instituída a Política Nacional de Transição Energética (PNTE), com o Plano Nacional (Plante) e o Fórum Nacional (Fonte) como instrumentos de execução. Por fim, a Lei do “Combustível do Futuro” estabeleceu programas para combustíveis sustentáveis na aviação, diesel verde e incentivo ao biometano, com metas reguladas pelo CNPE.

No âmbito de biodiversidade e áreas costeiras foram criadas duas novas Reservas Extrativistas costeiras no Pará (Filhos do Mangue e Viriandeua) e ampliação da Resex Chocoaré-Mato Grosso, totalizando mais de 79 mil hectares. Também foi instituído o Plano de Ação do ProManguezal, com metas como recuperar 17 mil hectares de manguezais até 2030 e criar seis Unidades de Conservação federais com manguezais até 2028. Entre as ações previstas estão a atualização do Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, a inclusão da temática climática nos planos de manejo e a integração com o Planaveg. 

O tema de indústria e gestão urbana contou com a Nova Indústria Brasil, com plano de ação até 2026 e metas até 2033, prevendo R$300 bilhões em financiamentos. Foram estabelecidas metas específicas para redução de emissões e aumento do uso sustentável da biodiversidade. Também foi aprovado o Programa Mover, voltado à inovação e descarbonização na indústria automotiva, com exigências de eficiência energética e reciclabilidade para veículos novos. Na gestão urbana, foi instituído o Programa Cidades Verdes Resilientes (PCVR), que apoia a elaboração de planos locais de adaptação climática por meio da iniciativa AdaptaCidades. Além disso, foi criada a Portaria 1.250/2024, que regulamenta propostas dentro da Lei de Incentivo à Reciclagem.

Por fim, no campo da governança e financiamento da política ambiental nacional foi instituído o Programa Eco Invest Brasil pela Lei 14.995/2024 para atrair investimentos estrangeiros em projetos sustentáveis, prevendo R$6,8 bilhões em capital público e busca de R$37,6 bilhões em capital privado. Foi criado o Comitê Interinstitucional da Taxonomia Sustentável Brasileira, com consulta pública sobre os cadernos técnicos da primeira edição da TSB e previsão de publicação até julho de 2025. 

Também foi assinado o Pacto pela Transformação Ecológica entre os três poderes, com medidas sobre ordenamento territorial, transição energética e desenvolvimento sustentável. Outras ações incluem a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo (Lei 14.944/2024), com criação de comitê interinstitucional, Sisfogo e incentivo à substituição do uso do fogo; o Plano Safra 2024/2025, com R$400,59 bilhões em financiamentos, incluindo o RenovAgro Ambiental; e a aprovação de R$882 milhões em projetos pelo Fundo Amazônia. A Instrução Normativa IBAMA 20/2024 definiu regras para reparação administrativa de danos ambientais, e foi criado o grupo AGU Enfrenta, com atuação destacada no Pantanal. Segundo a Lei de Acesso à Informação, o Ibama arrecadou R$361 milhões em 2024, embora outras fontes indiquem um recorde de R$729 milhões.

 

Capa do Informe Brasil 2025 do Observatório do Clima
Monitor 2045

O Monitor 2045 é uma ferramenta colaborativa liderada pelo Observatório do Clima, criada para monitorar políticas públicas nos próximos anos, envolvendo ativamente a sociedade e tornando o processo mais transparente e inclusivo. Com a colaboração de diversas organizações, incluindo a Apremavi, e especialistas, a iniciativa tem como objetivo ajudar a transformar o Brasil em uma economia de carbono negativo até 2045.

> Conheça a iniciativa

 

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto.
Foto de capa: Wigold Schäffer.

Clima muda rápido demais para as florestas tropicais

Clima muda rápido demais para as florestas tropicais

Clima muda rápido demais para as florestas tropicais

Novo estudo global aponta que árvores em florestas tropicais nas Américas estão mudando em um ritmo muito mais lento do que o necessário para se adaptar às consequências da mudança no clima.

As florestas tropicais das Américas, conhecidas por sua extraordinária biodiversidade e papel crucial na regulação do clima global, podem estar em descompasso com as mudanças climáticas. Um artigo publicado na revista Science revela que essas florestas não estão se adaptando com rapidez suficiente para acompanhar as alterações nas temperaturas e nos regimes de precipitação causados pelas mudanças climáticas. Até 2100, as projeções indicam um aumento de até 4 °C nas temperaturas e uma redução de quase 20% na precipitação em muitas regiões tropicais.

“Esses ambientes estarão sujeitos a climas que nunca enfrentaram antes”, relata o estudo. Com isso, é possível que, no futuro, comunidades vegetais completamente diferentes –  e ainda desconhecidas – substituam as florestas tropicais atuais. 

O trabalho analisou 6.000 parcelas permanentes de floresta e envolveu a colaboração de 134 cientistas de todo o mundo, dentre eles pesquisadores brasileiros. Eles  observaram mudanças muito lentas na composição das espécies arbóreas nas últimas décadas – muito aquém da velocidade exigida pelas mudanças no clima. As mudanças observadas nas características das árvores representam apenas cerca de 10% do que seria necessário para acompanhar as alterações ambientais em curso.

Como as árvores são organismos de vida longa e com baixa taxa de renovação, a lentidão em acompanhar o clima pode levar a florestas cada vez mais vulneráveis. Isso significa que “as florestas estão ficando para trás em relação ao clima”. Essa lacuna crescente ameaça comprometer os serviços ecossistêmicos essenciais que essas florestas prestam, como a regulação do carbono, a proteção da biodiversidade e a manutenção dos ciclos hidrológicos.

 

Montanhas, secas e adaptações possíveis

O estudo também aponta que as florestas em regiões montanhosas tendem a responder mais rapidamente às mudanças, já que espécies podem migrar para altitudes mais adequadas em distâncias menores. Nas planícies, esse deslocamento é mais difícil.

Além disso, espécies com traços adaptativos à seca – como árvores caducifólias, que perdem as folhas durante a estação seca – podem se tornar mais comuns. Traços como tolerância à seca e maior plasticidade funcional serão cruciais para a sobrevivência das espécies no novo cenário climático.

 

Fragmentação e limitações à adaptação

Regiões como a Mata Atlântica e o sul da Amazônia brasileira apresentam uma vulnerabilidade ainda maioràs mudanças climáticas: nesses locais, a fragmentação florestal e outras pressões humanas dificultam a capacidade das florestas de se ajustarem, reforçando sua fragilidade.

Diante desse cenário, os cientistas reforçam a urgência de conservar áreas florestais intactas, restaurar ecossistemas degradados e criar corredores ecológicos que facilitem a migração natural das espécies. Mais do que nunca, compreender e apoiar os processos de adaptação natural é essencial para a sobrevivência desses ecossistemas – e, por extensão, do equilíbrio climático global.

A pesquisa também reforça a importância do monitoramento ecológico de longo prazo e do trabalho colaborativo entre cientistas, comunidades locais e tomadores de decisão para construir respostas eficazes diante da crise climática.

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto.
Foto de capa: Wigold Schäffer.

Seminário debate delegação de competência para intervenções na Mata Atlântica da região Sul

Seminário debate delegação de competência para intervenções na Mata Atlântica da região Sul

Seminário debate delegação de competência para intervenções na Mata Atlântica da região Sul

A Lei da Mata Atlântica, lei 11.428 de 2006, exige de todos os entes públicos assumam o compromisso com a conservação e uso sustentável do bioma. Nesse contexto, os municípios devem assumir suas responsabilidades na proteção desse bioma por meio dos instrumentos previstos na legislação. Dentre eles se destaca o Plano Municipal de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica, que cada município deve elaborar e aplicar. 

Esse plano deve incluir um diagnóstico da vegetação nativa remanescente, a identificação das principais causas do desmatamento local, sugestões de ações preventivas para mitigar ameaças, diretrizes para o uso sustentável da vegetação e a definição de áreas prioritárias para conservação e restauração.

A partir da edição da Lei Complementar n° 140, de dezembro de 2011, que fixa normas para competência comum entre os vários níveis de governo, surgem os termos de cooperação entre estados e municípios, que são acordos destinados à delegação da gestão da flora nativa da Mata Atlântica para os municípios. Esses termos estabelecem os critérios e procedimentos para a delegação de competência, permitindo que o município tenha autonomia para licenciar atividades relacionadas ao uso do solo e à construção de empreendimentos.

No dia 15 de março o Instituto MIRA-SERRA e a Rede de ONGs da Mata Atlântica promoveram o seminário “Convênios de Delegação de Competência para intervir na vegetação da Mata Atlântica, no âmbito da região Sul, Brasil – estudo de caso, relatos dos participantes, encaminhamentos” em Porto Alegre (RS). O evento contou com a parceria da Apremavi, Mater Natura e SPVS, além do apoio da SOS Mata Atlântica e financiamento da Hempel Foundation por meio do projeto “Cuidando da Mata Atlântica.”

O objetivo do encontro foi discutir os convênios que delegam competência para a intervenção na vegetação da Mata Atlântica na região Sul, abordando desafios e soluções para garantir a efetividade da legislação ambiental. Participaram representantes de diversas organizações, incluindo Instituto MIRA-SERRA, Apedema, Agir Azul, Onda Verde, Aipan, Igré e a Apremavi.

O seminário iniciou com a apresentação dos participantes e seguiu para a análise de casos concretos no Rio Grande do Sul. Foi enfatizado que os municípios podem perder a delegação de competência caso descumpram a Lei da Mata Atlântica, e que as entidades da RMA precisam ficar atentas e, nesses casos, requerer a suspensão desses termos quando irregularidades são constatadas.

 
Desafios na implementação dos Termos de Cooperação

Entre os principais problemas apontados estão os conflitos legais decorrentes da interpretação das prefeituras sobre a hierarquia dos planos ambientais. Muitas administrações municipais consideram o Plano Diretor superior ao Plano da Mata Atlântica, resultando em embates jurídicos e dificuldades na aplicação da legislação ambiental.

Além disso, os estados não possuem competência para fiscalizar os planos municipais de Mata Atlântica, o que abre margem para irregularidades. No Rio Grande do Sul, por exemplo, vários municípios justificam desmatamentos ilegais alegando, de maneira equivocada, que as áreas afetadas pertencem ao bioma Pampa, escapando, assim, da proteção estabelecida para a Mata Atlântica.

Outro desafio é a renovação dos termos de cooperação. Idealmente, essa renovação deveria estar condicionada à existência de Planos Municipais de Mata Atlântica, garantindo uma gestão ambiental estruturada. No entanto, essa exigência não tem sido cumprida na prática, deixando a fiscalização e a proteção ambiental fragilizadas.

Um levantamento preliminar realizado pela MIRA-SERRA e apresentado durante o seminário revelou o status dos termos de delegação de competência nos estados do Sul do Brasil. Em Santa Catarina, não houve retorno das autoridades devido ao período de férias. No Paraná, o protocolo para a realização do levantamento já foi iniciado. Já no Rio Grande do Sul, 188 municípios possuem termos de cooperação, mas a maioria enfrenta problemas como irregularidades na aplicação da legislação e a falta de profissionais qualificados para a gestão ambiental.

Lisiane Becker, bióloga e presidente do Instituto MIRA-SERRA comenta sobre a importância da discussão do tema: “a delegação de competência do estado aos municípios para intervir na vegetação da Mata Atlântica é o principal meio de extinção da nossa fauna – agravando os eventos climáticos extremos devido à redução dos serviços ecossistêmicos”.

Ainda, ela ressalta a importância de momentos como esse entre organizações ambientalistas: “O evento se prestou, também, como uma qualificação às entidades com distintos focos de atuação – visto que esse tipo de delegação de competência interage (diretamente ou indiretamente) com seus objetivos ambientalistas.”

 

Propostas e encaminhamentos

Os participantes do seminário discutiram soluções para aprimorar a gestão ambiental e a fiscalização da Mata Atlântica no Sul do Brasil. Entre as principais propostas, destacam-se a criação de um checklist baseado na atuação das ONGs para evitar ataques ao licenciamento ambiental, a publicação de estudos de caso sobre a aplicação da Lei da Mata Atlântica e o desenvolvimento de cartilhas informativas sobre denúncias ambientais e resgate de fauna. Também foi sugerida uma fiscalização estadual mais rigorosa sobre os planos municipais, a destinação de recursos específicos para sua implementação e o monitoramento contínuo dos termos de cooperação. Essas medidas visam fortalecer a governança ambiental e garantir a proteção efetiva do bioma.

“Além disso, outras ideias discutidas levaram a um denominador comum: ampliar e consolidar a capacitação no tema, de modo que os atores socioambientais tenham segurança na aplicação da legislação relacionada ao uso do solo na Mata Atlântica. Isso inclui estratégias para apresentação de denúncias bem fundamentadas, fortalecimento das atividades colaborativas, interface com profissionais da comunicação e exercício do controle social, entre outros aspectos”, relata Lisiane.

Segundo ela, o MIRA-SERRA, com base nas sugestões dos participantes, pretende oferecer um programa de capacitação gratuito e online, semelhante ao que foi idealizado e executado na Bacia Hidrográfica do Rio Caí (Planos Municipais e Regional de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica no âmbito da B.H. do Rio Caí), com o objetivo de suprir essa lacuna de capacitação.

Além disso, um dos principais resultados do debate promovido pelo seminário foi o questionamento sobre a competência original para intervenção na Mata Atlântica. Se considerarmos que a competência originária para intervenções no bioma é da União, surge a necessidade de discutir a regulamentação federal para a delegação de competência entre Estado e Município. A pesquisa realizada pelo Instituto MIRA-SERRA revelou grandes discrepâncias na delegação de competências aos municípios, que não parecem estar devidamente respaldadas pela Lei Complementar 140/2011. Os estados estariam repassando diversas atribuições federais e estaduais aos municípios sem padronização e sem a devida transparência, tornando inviável o controle social sobre essas decisões.

Apresentação de estudos de caso durante o evento.

Apresentação de estudos de caso durante o evento. Foto: Thamara Santos de Almeida.

Cuidando da Mata Atlântica: Articulação Região Sul da RMA

O seminário é fruto do projeto “Cuidando da Mata Atlântica” que busca contribuir com a conservação e restauração da Mata Atlântica através da articulação das organizações da RMA, na defesa do arcabouço legal que protege o bioma na Região Sul do país e o estímulo à criação e implantação de Unidades de Conservação.

É financiado pela Fundação Hempel e coordenado pelo Mater Natura, em parceria com a Fundação SOS Mata Atlântica, Apremavi, SPVS e Instituto MIRA-SERRA.

> Saiba mais

 

Autora: Thamara Santos de Almeida.
Revisão: João de Deus Medeiros e Miriam Prochnow.
Foto de capa: Wigold Schäffer.

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