Santa Catarina já tem seu Corredor Ecológico

Santa Catarina já tem seu Corredor Ecológico

Santa Catarina já tem seu Corredor Ecológico

O significado legal e prático do termo “Corredor Ecológico” ainda é pouco compreendido. Não raro, o mesmo é interpretado de forma indevida, gerando apreensões desnecessárias. Com a divulgação do Decreto Estadual 2.367/2022 (SC), reconhecendo o Corredor Ecológico Caminho das Nascentes, não foi diferente. O propósito deste breve texto é trazer algumas informações qualificadas que permitam ao cidadão uma interpretação precisa desse importante instrumento de gestão territorial. 

Corredores Ecológicos, segundo definição constante na lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC (Lei nº 9.985/2000), são porções de ecossistemas naturais ou seminaturais, ligando unidades de conservação, que possibilitam entre elas o fluxo de genes e o movimento da biota, facilitando a dispersão de espécies e a recolonização de áreas degradadas, bem como a manutenção de populações que demandam para sua sobrevivência áreas com extensão maior do que aquela das unidades individuais.

A lei do SNUC divide as Unidades de Conservação da natureza em dois grupos com características específicas: As Unidades de Proteção Integral e as Unidades de Uso Sustentável. Dentro de cada grupo são definidas as distintas categorias, como Parque, Estação Ecológica, Reserva de Desenvolvimento Sustentável dentre outras. Não se enquadra o Corredor Ecológico como uma categoria de Unidade de Conservação. 

Desse modo, o reconhecimento de um Corredor Ecológico não exige desapropriação de imóveis ou indenização de proprietários. As atividades desenvolvidas nas propriedades públicas ou privadas seguem, precisando respeitar as regras legais vigentes. Ou seja, o regramento para o uso dos recursos naturais numa propriedade inserida na área delimitada de um Corredor Ecológico é idêntico ao aplicado ao imóvel situado fora da mesma. 

O Corredor Ecológico é um instrumento de gestão e ordenamento territorial, buscando qualificar esse espaço com a adoção de boas práticas na utilização sustentável e racional dos recursos naturais. Essa gestão qualificada procura estimular e apoiar proprietários ou comunidades na adoção de medidas que agreguem valor aos bens produzidos, compatibilizando essa produção com a devida proteção dos recursos naturais. Em algumas dessas áreas o reconhecimento do Corredor Ecológico impulsiona uma certificação de origem, uma espécie de atestado de produção responsável e “amiga” da natureza. 

Santa Catarina já tem seu Corredor Ecológico

Corredores ecológicos são iniciativas para conservar a biodiversidade e incentivar o desenvolvimento sustentável. Fotos: Wigold B. Schäffer.

Para atingir tais objetivos, propriedades inseridas num Corredor Ecológico devem ser priorizadas em programas de assistência técnica, linhas de financiamento e mesmo remuneração pela manutenção de serviços ambientais essenciais para a coletividade. Ele serve também como elemento impulsionador de integração de políticas públicas e parcerias diversas, estimulando o trabalho cooperativo de prefeituras, sindicatos, indústrias, comércio, entidades da sociedade civil, governos do Estado e da União. O próprio decreto de reconhecimento do Corredor Ecológico Caminho das Nascentes específica que o Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) poderá firmar termo de cooperação técnica com organizações governamentais e não governamentais a fim de atingir os objetivos do mesmo.

A iniciativa do Corredor Ecológico da Serra Geral busca iniciar a implementação do Corredor Ecológico Caminho das Nascentes, já reconhecido pelo Decreto Estadual nº 2.367/2022. Não se trata de uma proposta de novo corredor, ele formalmente já está reconhecido pelo Governo do Estado de Santa Catarina. Desde então não houve qualquer ameaça ou risco à manutenção das atividades legalmente desenvolvidas nessa extensa área, que cobre cerca de 1.716,35 km2. 

Mapa da localização do Corredor Ecológico Caminho das Nascentes. Figura: Secretaria do Desenvolvimento Econômico Sustentável do Governo de Santa Catarina

O Corredor Ecológico da Serra Geral busca implementar ações de apoio e promoção da conservação e recuperação de nascentes e da vegetação nativa; qualificar e agregar valor à produção, ampliando a renda dos proprietários; bem como servir como um modelo de gestão para o restante da área do Corredor Ecológico Caminho das Nascentes. Figura: IMA SC.

O Corredor Ecológico Caminho das Nascentes traz expresso dentre seus objetivos o de conciliar a conservação da biodiversidade com o crescimento socioeconômico, incentivando a participação da sociedade em atividades compatíveis com a promoção da sustentabilidade. Assim, precisa o mesmo ser entendido como uma oportunidade, não ameaça ou risco. Bem ao contrário, com o elevado risco que hoje administramos em decorrência dos efeitos nefastos da emergência climática, avançar na efetiva implementação de instrumentos como os Corredores Ecológicos é alimentar a esperança de superação da crise e de construção de dias melhores.

> Saiba mais sobre o Corredor Ecológico Caminho das Nascentes


 

Autores: João de Deus Medeiros (Rede de ONGs da Mata Atlântica) e Christian Dobereiner (Reserva Araponga).
Montagem: Vitor Lauro Zanelatto.
Foto de capa: Wigold B. Schäffer.

Cenários extremos reforçam a inação do Estado sobre as mudanças climáticas

Cenários extremos reforçam a inação do Estado sobre as mudanças climáticas

Cenários extremos reforçam a inação do Estado sobre as mudanças climáticas

A tristeza em relação ao mais recente evento climático extremo no Rio Grande do Sul é amplificada pelo descaso dos governantes em se preparar para o enfrentamento da situação. A realidade do nosso tempo está posta: será de vulnerabilidade constante e cenas como as enfrentadas pelos gaúchos agora, os capixabas no início do ano e os catarinenses no final de 2023. Escolher ignorar os efeitos das mudanças no clima é condenar a vida. 

Os modelos científicos já estão misturados à realidade de eventos climáticos – cada vez mais – extremos. Lançado nesta semana, o relatório Estado do Clima na América Latina e no Caribe 2023 da Organização Meteorológica Mundial (OMM) confirmou que o ano passado foi de longe o mais quente registrado. O nível do mar continuou a subir a uma taxa mais alta do que a média global em grande parte da porção atlântica da região, ameaçando áreas costeiras e pequenos Estados insulares em desenvolvimento. A publicação registrou 12 eventos climáticos extremos no Brasil, sendo 9 deles considerados incomuns e 2 sem precedentes. 

O estudo evidencia o desequilíbrio em que a Terra se encontra e seus efeitos na vida das pessoas: a intensa seca de 2023 reduziu o Rio Negro, na Amazônia brasileira, para seu nível mais baixo em mais de 120 anos de observações, enquanto no município de São Sebastião (SP), 683mm de chuva se acumularam em 15 horas, desencadeando um deslizamento de terra que resultou em pelo menos 65 mortes. É preciso reforçar o que já está estabelecido: eventos dessa natureza não são casos isolados, tragédias ou desastres naturais. Afastar a responsabilidade dos que agravam a emergência climática ou são omissos às suas consequências significa agravar a crise e adiar a construção de soluções que já deveriam estar implantadas.

> Leia os destaques do relatório

Por isso, é preciso cobrar ações de adaptação e mitigação e para a resiliência de cidades e comunidades desde já, buscando atenuar os efeitos e promover assistência aos que serão afetados. Essa não é uma demanda nova, mas o aumento dos desastres socioambientais, como a tragédia em Petrópolis (RJ – 02/2022) onde pelo menos 178 pessoas perderam a vida; as últimas enchentes no Alto Vale do Itajaí (SC – 2022 e 2023) e mesmo as enchentes e ondas de calor no RS que ocorram no último ano (junho, setembro e novembro), deixando 80 mortos, mostra que estamos vivendo uma realidade para a qual não estamos preparados para agir, estamos apenas reagindo quando o caos se instaura.

Formular planos de contingência, investir em soluções baseadas na natureza para minimizar os impactos e executar obras de infraestrutura são ações primordiais para a proteção das cidades, mas tudo isso apenas reage às consequências, sem avançar sobre as causas do desequilíbrio climático e da paisagem. Ao mesmo passo que o Congresso Nacional discute agora como auxiliar financeiramente o estado do Rio Grande do Sul, estão em aprovação medidas para enfraquecer a legislação socioambiental e, dessa forma, tornar as pessoas ainda mais vulneráveis a enchentes, ondas de calor, ciclones extratropicais, deslizamentos e tantas outras consequências imensuráveis que estão no luto de quem enfrenta um evento climático extremo.

 

Eldorado do Sul (RS), 09/05/2024. Foto: Gustavo Mansur/ Palácio Piratini.


A incoerência entre discurso e ação também é observada no
Rio Grande do Sul: em 2020 o Código Ambiental do estado teve alterações em mais de 500 pontos. Entre as mudanças mais significativas está o “autolicenciamento ambiental”. Prevista como Licença Ambiental por Compromisso (LAC), a autorização para empreendimentos é concedida em até 48 horas pelo sistema online do órgão de licenciamento ambiental. Também foram promovidas flexibilizações nas normas de proteção das Unidades de Conservação estaduais.  

“A legislação ambiental foi feita para ser cumprida. Há um motivo para ela existir. Se existe uma Área de Preservação Permanente que precisa ser protegida ou restaurada é, principalmente, porque estas são áreas de risco… uma beira de rio é onde a água vai espraiar. Uma encosta de morro é APP porque existe risco de deslizamento.”
Miriam Prochnow, co-fundadora da Apremavi e coordenadora de projetos na ​​live beneficente em prol das vítimas do RS, realizada por Raony Rossetti em 08/05/2024.

A realidade do RS tem inspirado a solidariedade em todo o Brasil, e desde já deve motivar também a indignação e priorização da emergência climática nos debates e escolhas políticas. Não se trata de apontar culpados, mas de entender que pautar (ou não) os efeitos da mudança no clima é uma escolha política, e nessa escolha está a vida da população. 

Somos filhos da época
e a época é política.
(…)
O que você diz tem ressonância;
e o que silencia tem um eco
de um jeito ou de outro político.
Filhos da época – Wisława Szymborska

Autor: Vitor Lauro Zanelatto.
Revisão: Carolina Schäffer e Thamara Santos de Almeida.
Foto de capa: Eldorado do Sul (RS), 09/05/2024. Foto: Gustavo Mansur/ Palácio Piratini.

Conservador das Araucárias promove encontro de transparência e divulgação

Conservador das Araucárias promove encontro de transparência e divulgação

Conservador das Araucárias promove encontro de transparência e divulgação

Realizada em março, a primeira Reunião do Grupo de Transparência e Divulgação do projeto Conservador das Araucárias reuniu mais de 60 pessoas para debater o desenvolvimento da iniciativa e ações futuras na Mata Atlântica, com ênfase na Floresta com Araucárias. 

Restauração florestal com espécies nativas, atrelada à captura de carbono para mitigação das mudanças climáticas, adequação de propriedades rurais à legislação ambiental e conservação de mananciais hídricos, do solo e da biodiversidade, bem como melhoria da qualidade de vida da população. Esse é o objetivo central da parceria entre a Apremavi e a Tetra Pak, que pretende restaurar sete mil hectares de áreas alteradas e implantar um programa de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA).

Para a realização da meta ambiciosa, foi instituída uma governança compartilhada, diversa e representativa para a iniciativa; composta por três grupos: Grupo Executivo, Grupo de Acompanhamento e Grupo de Transparência e Divulgação. Essa estrutura de governança está alinhada com o formato de parceria adotado entre a Tetra Pak e a Apremavi. O Grupo de Transparência e Divulgação, tem como objetivo informar a sociedade sobre o andamento do projeto, dando oportunidades para troca de informações e experiências e também o recebimento de sugestões para o aprimoramento das atividades do projeto. As reuniões são anuais, organizadas pela Apremavi, tendo o apoio do Grupo Executivo

Infográfico da estrutura de governança do projeto. Figura: Arquivo Apremavi.

O primeiro encontro para debater as estratégias de transparência e divulgação aconteceu nos dias 19 e 20 de março de 2024, no Centro Ambiental Jardim das Florestas da Apremavi, em Atalanta (SC). Contou com a participação de 21 pessoas no formato on-line e 46 pessoas presencialmente, representando um número diversos de organizações da sociedade civil, governo, setor privado e academia. 

Parceiros de longa data e organizações que desenvolvem ações que têm sinergia com os objetivos do Conservador das Araucárias analisaram a atuação do projeto desde 2022, apresentaram sugestões para o desenvolvimento da iniciativa e compartilharam confluências possíveis na atuação territorial, que deve abranger três estados brasileiros – Santa Catarina, Paraná e São Paulo. Também foram realizadas apresentações sobre a execução de projetos de carbono e PSA e para a implantação do Código Florestal.

Registros da reunião, realizada no auditório da sede da Apremavi. Fotos: Carolina Schäffer.

Carolina Schaffer, vice-presidente da Apremavi e Coordenadora de Carbono e Biodiversidade do projeto, avalia como foi o primeiro encontro do grupo: Nossa intenção foi compartilhar esforços e experiências e discutir soluções para os desafios enfrentados pelo Conservador das Araucárias, mas conseguimos mais; juntos também estabelecemos um exemplo inspirador de colaboração e governança para a restauração da Floresta com Araucárias e isso é animador, sobretudo diante dos cenários de crise climática e de biodiversidade que a humanidade enfrenta.

No dia 19 os participantes também tiveram a oportunidade de conhecer um pouco mais sobre os trabalhos da Apremavi, através de uma visita ao Centro Ambiental e Viveiro Jardim das Florestas e à Trilha da Restauração. Durante a visita já foram iniciados debates importantes sobre projetos de conservação e restauração da Mata Atlântica. 

Os participantes demonstraram muito interesse no projeto, fizeram vários elogios, inclusive sobre a forma de governança e também declaram apoio para as próximas atividades. Algumas organizações solicitaram reuniões específicas para tratar de possíveis interações, a exemplo da Epagri, da Prefeitura Municipal de Agrolândia, do Ministério do Meio Ambiente e do Pacto Trinacional para Restauração da Mata Atlântica. Também entre as atividades sugeridas está a organização de uma reunião conjunta entre a Comissão de Agricultura e a Comissão de Turismo e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa, para abordar a questão da validação do CAR e a implantação do PRA em Santa Catarina.

Nossas metas são ambiciosas, mas a Apremavi sempre acreditou na força dos diálogos entre os setores e na construção de parcerias, por isso ter essa sinalização de apoio para a implementação do projeto por parte dos parceiros é fundamental e mostra o sucesso do evento”, comenta Miriam Prochnow, diretora da Apremavi e Coordenadora de Relacionamentos do projeto.

 

Os benefícios potenciais do projeto

Além da restauração de ecossistemas, outras iniciativas estão previstas no escopo do Conservador das Araucárias, buscando gerar importantes benefícios também para a sociedade, e por isso que a estratégia participativa de governança é tão relevante. Contribuir com a manutenção da biodiversidade da fauna e da flora, ajudar a proteger nascentes, manter a qualidade e a quantidade de água, proteger o solo, controlar o microclima e retirar da atmosfera gases de efeito estufa que provocam as mudanças climáticas demanda muito trabalho, estratégias de desenvolvimento sustentável e envolvimento das comunidades locais, possibilitando a geração de empregos em toda a sua cadeia produtiva e contribuir para a segurança alimentar.

Através do Conservador das Araucárias os benefícios potenciais são:
・Elaboração de projetos técnicos de restauração específicos para cada área, com indicações para adequação ambiental das propriedades.
・Apoio na implementação do projeto técnico de restauração e acompanhamento do processo de restauração por técnicos experientes.
・Plantio de árvores que possibilita a recuperação de água e fertilidade do solo em áreas alteradas, agregando valor às propriedades.
・Manutenção e recuperação de serviços ecossistêmicos nas áreas em restauração, garantindo a manutenção da biodiversidade associada e melhorando a qualidade de vida das pessoas envolvidas.
・Pagamento pelo carbono acumulado nas áreas de restauração, gerando renda extra às propriedades.
・Construção e fortalecimento de relações, gerando engajamento social de diversos atores – incluindo associações de produtores rurais, organizações locais e os poderes públicos municipais e estaduais.
・Incentivo à educação ambiental ao engajar comunidades e diferentes atores em prol da restauração ecológica e do combate às mudanças climáticas.
・Contribuição na capacitação e organização da cadeia da restauração, gerando novas oportunidades de emprego e renda.

Autores: Vitor Lauro Zanelatto e Miriam Prochnow
Revisão: Carolina Schäffer e Thamara Santos de Almeida
Foto de capa: Wigold B. Schäffer

Geração Restauração: a restinga que volta a crescer em Florianópolis

Geração Restauração: a restinga que volta a crescer em Florianópolis

Geração Restauração: a restinga que volta a crescer em Florianópolis

O sol extremo, ventos, salinidade e solo com poucos nutrientes formaram – uma fitofisionomia singular da Mata Atlântica. A evolução e adaptação das plantas ao ambiente formaram o que conhecemos hoje como Restinga, ameaçada constantemente pelo avanço da ocupação humana.

O Código Florestal determina que as restingas são Áreas de Preservação Permanente (APP). Na prática, isso não impede que este seja um dos ecossistemas mais ameaçados do Brasil.  No último Atlas da Mata Atlântica – estudo co-realizado pela Fundação SOS Mata Atlântica e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) – dois municípios catarinenses figuram na lista de maiores deflorestamentos em áreas de restinga: Itapoá e Araquari, com identificação de perda de 47 e 19 hectares entre 2021 e 2022, respectivamente. 

Na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), um grupo de pesquisadores do Laboratório de Ecologia de Invasões Biológicas, Manejo e Conservação (LEIMAC) se dedica a transformar a realidade local. A restauração ecológica nas praias de Florianópolis ocorre desde 2022, coletando sementes em áreas conservadas, produzindo mudas nativas e plantando espécies que nunca deveriam ter deixado de existir entre o mar e o fim da faixa de areia. As atividades do Restaura Restinga no Viveiro Municipal situado no Monumento Natural Municipal da Lagoa do Peri iniciaram em setembro de 2022.

A maior parte das sementes é proveniente do Parque Natural Municipal das Dunas da Lagoa da Conceição, Unidade de Conservação que protege diversos ecossistemas de restinga. A coleta de sementes é realizada em diferentes pontos, sempre tentando obtê-las de um número maior de indivíduos para manutenção da diversidade genética. As coletas propiciam a produção de mudas de espécies de dunas frontais, como Canavalia rosea, Sophora tomentosa, Ipomoea pes-caprae, Dalbergia ecastaphyllum, Guapira opposita; e da restinga arbustiva e arbórea, como Myrcia palustris, Myrcia splendens, Ocotea pulchaella, Guapira opposita, Ouratia salicifolia e Geonoma schottiana.

 

Coleta de sementes de Canavalia rosea. Foto: Lais Stein.

As atividades no viveiro ocorrem semanalmente, buscando efetivar a semeadura com maior prontidão possível para não perder a viabilidade das sementes. O processo de semeadura ocorre em bandejas preenchidas com areia da praia, buscando um ambiente próximo ao natural. Conforme as sementes germinam, as plântulas são transferidas para embalagens individuais, onde o crescimento ocorre até o momento ideal para o plantio. 

O trabalho é coordenado pela professora dr. Michele Dechoum e efetivado por duas bolsistas, Marina Tonial e Lais Stein, com auxílio de pessoas voluntárias. O resultado do trabalho coletivo é plantando em diferentes praias da Ilha de Santa Catarina. Inicialmente, o escopo do Restaura Restinga buscou a restauração de uma área no interior do Parque Natural Municipal das Dunas da Lagoa da Conceição, submetida à plantação de eucaliptos durante as décadas de 1960 e 1970, ilustrando a realidade de alteração do ambiente promovida pelos humanos. Em casos dessa natureza, o trabalho inicia antes do plantio, com a retirada e controle da espécie exótica introduzida.

Lais Stein, integrante do projeto, destaca os principais desafios do trabalho: “Percebemos escassez de referências sobre a germinação de espécies de restinga. Muitas espécies apresentam dormência cuja quebra é desconhecida, em alguns casos aguardamos alguns meses a germinação sem quebra forçada da dormência, em outros casos estamos fazendo testes de propagação por estaquia, como é o caso da Gaylussacia brasiliensis.” 

Registros das atividades para a produção das mudas nativas. Fotos: Vitor Lauro Zanelatto.

Desde o início do trabalho no viveiro, mais de 5.000 mudas foram produzidas, plantadas e zeladas pela equipe do projeto. O ambiente onde as mudas são plantadas e onde a restauração acontece torna-se então objeto de pesquisa, com o monitoramento mensal da área, buscando avaliar a sobrevivência e crescimento dos indivíduos. A coleta de dados permite a avaliação do efeito legado de eucalipto, isto é, as condições que a espécie exótica deixa no ambiente mesmo após ser retirada. 

O monitoramento também era efetivado numa área de duna frontal em processo de erosão principalmente devido ao pisoteamento. Neste local avaliava-se as influências do substrato de crescimento das mudas na sobrevivência e crescimento dos indivíduos. Essa área infelizmente teve grandes conflitos com a presença humana dada a maior acessibilidade do local, o experimento sofreu depredação diversas vezes, principalmente no período do ano novo, onde a circulação de pessoas na praia se intensifica.

Stein também destaca a importância da consciência das pessoas que frequentam as áreas de restinga para o sucesso das atividades de restauração: “Apesar de sempre indicarmos com placas as áreas submetidas ao plantio de mudas, muitas vezes as plantas sofrem pisoteamento, principalmente em áreas de dunas frontais que margeiam o ambiente praial, essa dificuldade se relaciona principalmente à época da alta temporada e à desinformação da população acerca da fragilidade da vegetação de restinga perante ao pisoteamento.”, destaca. 

Além do projeto de restauração, o LEIMAC também desenvolve atividades de extensão em parceria com o Instituto Hórus de Desenvolvimento e Conservação Ambiental. Fundado pela fellow Ashoka Sílvia R. Ziller, o instituto é referência em pesquisas sobre espécies exóticas invasoras no Brasil. Juntas, as organizações desenvolvem um programa para o controle de Pinus sp. e outras espécies invasoras em Florianópolis. Em 14 anos as ações comunitárias eliminaram cerca de 420 mil pinus do Parque das Dunas.

 

Atividades de restauração e controle de espécies invasoras em Florianópolis. Fotos: Lais Stein, Arquivo LEIMAC e Vitor Lauro Zanelatto. 

Sobre o Laboratório de Ecologia de Invasões Biológicas, Manejo e Conservação (LEIMAC)

Estabelecido em 2019, o laboratório tem como foco de estudo as invasões biológicas, que ocorrem em decorrência da introdução – intencional e acidental – de espécies associadas a atividades humanas. Não há um organismo ou um grupo de organismos que sejam o foco dos estudos desenvolvidos, mas sim a compreensão dos mecanismos envolvidos em processos de invasões biológicas, dos impactos provocados desde o nível de organismo até o nível de ecossistema, e as respostas das espécies exóticas invasoras e dos sistemas invadidos ao manejo.

Os principais objetivos são avaliar fatores-chave relacionados a processos de invasão biológicas por espécies exóticas em ecossistemas tropicais e subtropicais; Identificar impactos provocados por espécies exóticas invasoras nesses ecossistemas e; avaliar o efeito do manejo em comunidades invadidas e na restauração de funções e processos ecossistêmicos.

> Conheça os projetos desenvolvidos pelo laboratório

Autor: Vitor Lauro Zanelatto
Colaboração: Lais Stein
Revisão: Thamara Santos de Almeida
Foto de capa: Vitor Lauro Zanelatto

Conservar a Natureza, proteger a água: o Corredor Ecológico das Nascentes

Conservar a Natureza, proteger a água: o Corredor Ecológico das Nascentes

Conservar a Natureza, proteger a água: o Corredor Ecológico das Nascentes

Proteger as nascentes, conservar a biodiversidade e recuperar as áreas alteradas são grandes desafios do nosso tempo. No Dia da Água, a Apremavi apresenta uma das soluções: a instituição e implementação plena de corredores ecológicos. 

Desde 2007, o estado de Santa Catarina projetava a criação de um corredor ecológico no território. Na época, a iniciativa foi liderada pela então Fundação de Meio Ambiente do Estado (FATMA), atualmente Instituto de Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA). O trabalho se estendeu por anos, marcado por diálogos, parcerias para a realização de estudos técnicos e interrupções típicas dos processos governamentais. 

O desenho do Corredor Ecológico das Nascentes segue a linha de cumeada das serras mais expressivas no cenário ambiental do território catarinense, a Serra do Mar e Serra Geral; no sentido  Norte-Sul,  com  uma  largura  de  1000  metros para  cada  lado  do  eixo estabelecido pelo divisor d’água, incluindo as nascentes dos principais rios  formadores  das  bacias  contidas  em  cada  vertente e duas derivações ao longo do Corredor, uma ligando a Serra do Mar e a Estação Ecológica do Bracinho, localizada nos Municípios de Joinville e Schroeder, e outra ligando a Serra Geral até o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro.

Os avanços para a transformação da proposta em iniciativa concreta avançaram no decorrer dos anos de 2021 e 2022, por meio de um grupo de trabalho formado por representantes da Secretaria Executiva do Meio Ambiente (SEMA), do Instituto do Meio Ambiente (IMA), da Associação dos Proprietários de Reservas Particulares do Patrimônio Natural de Santa Catarina (RPPN Catarinense) e da Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA). Juntas, as organizações dedicaram-se a analisar, discutir e reformular a proposta inicial, trabalhando no levantamento de dados e coordenadas para a definição da área e da localização do corredor. O grupo também elaborou o  memorial descritivo e minuta de decreto, que veio a ser aprovado em dezembro de 2022 (Decreto Estadual 2.367/2022), protegendo mais de 1.716,351 km².

Previsto no Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) – Lei 9.985/2000 – os corredores ecológicos tem como principal objetivo garantir a manutenção dos processos ecológicos nas áreas de conexão entre Unidades de Conservação, permitindo a dispersão de espécies, a recolonização de áreas degradadas, o fluxo gênico e a viabilidade de populações que demandam mais do que o território de uma unidade de conservação para sobreviver.

Áreas protegidas com essa classificação também são instrumentos de gestão e ordenamento territorial. Por isso, os corredores ecológicos devem primar pelo uso sustentável dos recursos naturais contidos em sua área de abrangência, e por isso ações como desapropriação, desanexação e indenização não são previstas no processo de implantação de um corredor ecológico.

Paisagens do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, Unidade de Conservação conectada ao Corredor Ecológico. Fotos: IMA. 

Em destaque: localização do Corredor Ecológico das Nascentes. Galeria: mapas que embasaram os estudos para criação do Corredor Ecológico. Crédito: Luciano Augusto Henning.

A criação do corredor ecológico define as áreas pertencentes como prioritárias para a restauração e conservação, sem prejuízo algum para os proprietários rurais ou comunidade do entorno. Ao contrário, a área protegida tem potencial para estruturar projetos de desenvolvimento sustentável nos 46 municípios catarinenses que compõem o corredor” Comenta o geógrafo Eduardo Augusto Henning, que trabalhou ativamente para a criação do corredor ecológico. 

Além de proteger as nascentes dos principais rios catarinenses, o corredor ecológico conecta remanescentes do Bioma Mata Atlântica relevantes, viabiliza a conexão entre populações, a troca gênica e a integração entre a biota de diversas áreas protegidas e busca conciliar a conservação da biodiversidade com o crescimento socioeconômico, incentivando a participação da sociedade em atividades compatíveis com a promoção da sustentabilidade, conservando e recuperando as Áreas de Preservação Permanente (APP) localizadas na área do corredor.

Para a promoção das atividades de recuperação e conscientização sobre a conservação, é essencial que os trabalhos no território continuem acontecendo. Isso para que as comunidades entendam a importância da iniciativa e participem ativamente das ações de restauração ecológica e também para que pesquisas sobre a biodiversidade do corredor sejam realizadas.

Confira a entrevista com Eduardo Augusto Henning sobre a criação do Corredor Ecológico das Nascentes: 

Autor: Vitor Lauro Zanelatto
Colaboração: Luciano Augusto Henning
Revisão: Thamara Santos de Almeida e Carolina Schäffer
Foto de Capa: Wigold B. Schäffer

Enfrentando a Emergência Socioambiental com Esperança

Enfrentando a Emergência Socioambiental com Esperança

Enfrentando a Emergência Socioambiental com Esperança

O Seminário Nacional do Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental (FMCJS) realizado no início deste mês foi dedicado ao futuro, analisando os principais desafios da área socioambiental e os caminhos para a promoção do Bem Viver à todas as formas de vida. 

O trabalho para a preparação das propostas apresentadas no seminário foi iniciado em fevereiro, através de encontros preparatórios. Entre os dias 4 e 6 de março os representantes de comunidades tradicionais, organizações da sociedade civil, movimentos e coletivos estiveram em Brasília para a elaboração das ações nos próximos anos em âmbito nacional; buscando se manter presente nos biomas e territórios por meio das entidades membros e de outras entidades parceiras, promovendo a convivência com cada bioma e ecossistema por meio de práticas que anunciam e vão construindo sociedades de Bem Viver.

No Seminário ecoaram as vozes das comunidades ribeirinhas, rurais e quilombolas, através de seus representantes que ali estavam, buscando traduzir suas batalhas à favor da conservação e do uso sustentável das florestas, campo e da água, principalmente agravadas pela situação da seca que assola a região amazônica e pantanal, pelo fogo que invadiu Fortaleza, Roraima, pelas enchentes do sul.  Os participantes foram unânimes em considerar que somente a interrupção do desmatamento não é suficiente para garantir a proteção dos biomas do Brasil.

Tatiana Arruda Correia, que representou a Apremavi no encontro, compartilha a repetição necessária do consenso sobre as medidas que ainda estão longe de ocorrer para a mitigação da emergência climática: “Em um momento em que a emergência climática está causando ondas de calor e eventos extremos sem precedentes em todo o planeta, a prioridade deve ser a redução imediata da exploração irregular do solo e a queima de combustíveis fósseis que são os principais responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa.” 

Participantes do Seminário Nacional do FMCJS, que ocorreu em Brasília. Foto: Reprodução/FMCJS.

Durante o evento foi redigida a Carta “Alerta aos Povos do Brasil e seu Governo”, que expressa a preocupação do FMCJS em relação à falta de políticas públicas de enfrentamento das mudanças climáticas e as consequências disso na vida da população. O texto ainda defende que a COP 30 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas), que será realizada no próximo ano em Belém, será uma oportunidade de o Brasil convocar a humanidade a assumir as mudanças que tal conjuntura exige, a Carta alerta que isso só acontecerá com políticas coerentes e de mobilização de todos os povos.

“A Carta expressa a preocupação em relação a falta de políticas públicas de enfrentamento das mudanças climáticas e as consequências disso na vida da população. A COP 30, que será realizada no próximo ano em Belém, Pará, será uma oportunidade de o Brasil convocar a humanidade a assumir as mudanças que tal conjuntura exige, a Carta alerta que isso só acontecerá com políticas coerentes e de mobilização de todos os povos”, destacou Ivo Poletto, coordenador do seminário.

> Leia a carta na íntegra

Autora: Tatiana Arruda Correia
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto
Foto de Capa: Vitor Lauro Zanelatto

Apremavi participa da 44ª Reunião do FF PR e SC

Apremavi participa da 44ª Reunião do FF PR e SC

Apremavi participa da 44ª Reunião do FF PR e SC

Atuante desde 2008, o Fórum Florestal Paraná e Santa Catarina (FF PR e SC) dedica-se aos diálogos sobre a silvicultura e à conservação, buscando contribuir no incremento da qualidade de todas as formas de vida e no combate à crise climática.

Realizada em Curitiba,  a reunião de 12 de março foi facilitada por Renata Garrett Padilha e Mônica Gabira, do Mater Natura, organização hospedeira do Fórum Florestal. Os participantes dedicaram-se à realização de uma oficina para a elaboração da estratégia de advocacy do coletivo. Além disso, a reunião contou com a apresentação e recepção de novos membros, retrospectiva 2023 e dinâmica ambiental da Trilha do Tatu, na RPPNM Airumã.

Desde 2023 o desenvolvimento de uma estratégia de advocacy é a prioridade da iniciativa. A primeira ação foi a capacitação do grupo,  instruindo sobre como construir estratégias dessa natureza. A partir da oficina foi iniciada a construção da estratégia através de dez passos: Teoria da Mudança, prioridade e objetivo, processo decisório, público-alvo, parceiros e coalizões, mensagem, mensageiros, atividades, gerenciamento de riscos, monitoramento e avaliação.

Durante a reunião o grupo trabalhou no passo 1: Teoria da Mudança, com a definição do problema e impacto almejado pelo fórum. Os próximos meses serão dedicados aos passos seguintes, com previsão de conclusão em junho de 2024.

A Apremavi foi representada no encontro por Marluci Pozzan. No total a reunião teve 24 participantes de 20 diferentes instituições. “A atividade foi muito produtiva, pois reuniu instituições e empresas de diferentes setores que puderam contribuir na construção da estratégia. Os resultados obtidos são reflexo das diversas experiências dos participantes, bem como do diálogo e respeito entre os membros do fórum”, avalia Marluci.

> Conheça a publicação Paisagens Florestais e o Protagonismo das Mulheres, elaborada pelo FF PR e SC

Autora: Marluci Pozzan
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto
Foto de capa: Vitor Lauro Zanelatto

Ipê-branco, floração espetacular na Mata Atlântica

Ipê-branco, floração espetacular na Mata Atlântica

Ipê-branco, floração espetacular na Mata Atlântica

O ipê-branco (Tabebuia roseoalba) é uma espécie muito apreciada por sua beleza e floração. É indicada para o paisagismo e arborização em geral – inclusive em avenidas e sob fiação elétrica – tornando os espaços urbanos mais agradáveis e promovendo belas cenas na época da floração.

A árvore adulta pode variar entre 5 e 18 metros de altura, apresentando tronco reto e cilíndrico de até 60 centímetros de diâmetro. Possui uma casca externa grossa e fissurada, e casca interna fibrosa e amarelada. Os ramos jovens são pilosos e as folhas são compostas, trifolioladas (folha dividida em três subunidades). 

As flores brancas apresentam cálice acastanhado, corola campanulada de coloração branca ou levemente rosada e garganta de traços amarelados. A floração ocorre principalmente em setembro, com a frutificação podendo ocorrer entre outubro e janeiro. 

As sementes dos ipês perdem rapidamente o poder germinativo, que são obtidas dos frutos secos que as espécies Tabebuia spp. produzem. O belo e efêmero florescimento – que ocorre simultaneamente com a ausência de folhas na árvore – pode ocorrer precocemente, afetando drasticamente as chances de reprodução da espécie, porque as sementes morrem antes do início da estação chuvosa. 

A propagação da espécie ocorre por via anemocórica (realizada pela ação do vento). No Brasil, ocorre naturalmente do Pará até São Paulo, com maior frequência próximo ao Pantanal Mato-grossense, habitando as Florestas Estacionais Semideciduais. Também é esparsamente encontrada na Caatinga.

O ipê mantém uma significativa população no Brasil, justamente por seu uso amplo em projetos de paisagismo e nas iniciativas de restauração ecológica, principalmente na Mata Atlântica e no Cerrado. Além disso, é uma espécie resistente às adversidades do tempo: o nome ipê em tupi-guarani significa “árvore de casca grossa”. Em exceção, a  espécie apresenta pouca tolerância à geadas.

Ipê-branco

Registros das flores, frutos e árvore adulta de ipê-branco. Fotos: Arquivo Apremavi, (CC) Maurício Mercadante e (CC) Victor de Paiva.

Ipê-branco

Nome científico: Tabebuia roseoalba (Ridl.) Sandwith
Família: Bignoniaceae
Utilização: a madeira, moderadamente pesada, de boa resistência mecânica e longa durabilidade quando conservada em ambiente seco, foi utilizada no passado principalmente na construção, como assoalhos, vigamentos e acabamentos internos.
Coleta de sementes: logo após o início da abertura espontânea dos frutos. Após a coleta, é indicado deixar os frutos expostos ao sol para completar a abertura, a fim de facilitar a separação das sementes.
Época de coleta de sementes: outubro a dezembro.
Fruto: cápsulas verdes e compridas, contendo numerosas sementes membranáceas e aladas.
Flor: Branca.
Crescimento da muda: Rápido.
Germinação: Rápida, em até 30 dias.
Plantio: Mata ciliar, área aberta, sub-bosques, solo degradado.
Status de conservação: Não listada – Portaria MMA 148/2022; NT – quase ameaçada (IUCN).

Fontes consultadas

BRASIL. Embrapa Milho e Sorgo – MG. Ministério da Agricultura e Pecuária. Natureza vívida – A magia dos ipês. Elaborado por Daniel Pereira Guimarães. Disponível em: https://www.embrapa.br/en/busca-de-noticias/-/noticia/64586919/artigo-natureza-vivida–a-magia-dos-ipes. Acesso em: 28 fev. 2024.

BRASIL. Portaria nº 148, de 07 de junho de 2022. Portaria MMA Nº 148.Disponível em: https://www.icmbio.gov.br/cepsul/images/stories/legislacao/Portaria/2020/P_mma_148_2022_altera_anexos_P_mma_443_444_445_2014_atualiza_especies_ameacadas_extincao.pdf. Acesso em: 28 fev. 2024.

IUCN. IUCN Red List. 2022. Disponível em: https://www.iucnredlist.org/. Acesso em: 28 fev. 2024.

MIRIAM PROCHNOW (org.). No Jardim das Florestas. Rio do Sul: Apremavi, 2007. 188 p. Disponível em: https://apremavi.org.br/wp-content/uploads/2018/03/livro-jardim-das-florestas.pdf. Acesso em: 27 dez. 2023.

SAURESSIG, Daniel. Plantas do Brasil: árvores nativas. Irati: Plantas do Brasil, 2014. 432 p.

Autor: Vitor Lauro Zanelatto
Revisão: Carolina Schäffer
Foto de Capa: registro de ipê-branco em floração. Foto: ©️Cristina Brito/Embrapa Pecuária Sudeste

Protagonistas da Rede de Sementes visitam a Apremavi

Protagonistas da Rede de Sementes visitam a Apremavi

Protagonistas da Rede de Sementes visitam a Apremavi

Os coletores da Rede de Sementes de Abelardo Luz (SC) visitaram o Centro Ambiental e o Viveiro Jardim das Florestas nos dias 07 e 08 de fevereiro. Na mesma oportunidade, a Apremavi também recebeu representantes da Rede de Sementes do Vale do Ribeira, do estado de São Paulo.

O encontro buscou promover a troca de experiências entre os coletores e conhecimento do processo de produção de mudas no viveiro a partir das sementes coletadas. No primeiro dia do intercâmbio, os participantes conheceram a sede da Apremavi e a Trilha da Restauração, localizada no entorno do viveiro. Para finalizar o dia, percorreram a trilha do Parque Natural Municipal da Mata Atlântica.

Já no segundo dia, a programação iniciou com uma conversa com Maria Tereza Veiga e Zelia Pupo,  coletoras da Rede de Sementes Vale do Ribeira, além do Juliano Nascimento, engenheiro agrônomo do Instituto Socioambiental (ISA) e responsável técnico pela Rede de Sementes Vale do Ribeira. O trio contou a história da rede e a forma de organização do grupo. Além disso, as coletoras puderam contar suas experiências ao longo dos últimos anos como elos das suas comunidades. O elo é uma figura importante nas redes de sementes, responsável por organizar as entregas de sementes e orientar todos os integrantes sobre os acordos da rede.

Em 2022 técnicos da Apremavi fizeram uma visita à Rede de Sementes Vale do Ribeira – que integra o faz parte do Redário e é parceira da Apremavi – para conhecer a iniciativa e visitar a casa de sementes e viveiro no quilombo Nhunguara, bem como uma área em restauração por semeadura direta.

Juliano Nascimento comenta sobre a importância do encontro: “A troca de experiência entre coletores e coletoras de sementes nativas é essencial para o desenvolvimento de tecnologias sociais para a produção de sementes de base comunitária, possibilitando a partilha do conhecimento entre agricultores familiares, povos e comunidades tradicionais e assentados da reforma agrária, que sempre transmitiram seu conhecimento através da oralidade e do convívio com a floresta.”

Registros das atividades na sede da Apremavi. Fotos: Marluci Pozzan e Miriam Prochnow.

A segunda parte da manhã foi conduzida por Leandro Casanova, coordenador de projetos da Apremavi e Alex Sieves, viveirista da Apremavi. O grupo aprendeu sobre coleta, beneficiamento e armazenamento dos principais grupos de sementes nativas. Além disso, pôde conhecer melhor o processo de produção de mudas na Apremavi, desde a semeadura até a rustificação das mudas. 

Ivanir Oliveira, moradora de Abelardo Luz e integrante da Rede de Sementes do município, conta como é participar participar da rede e do intercâmbio: “É uma experiência e um conhecimento muito gratificante você saber que coletou a semente do chão, cuidou dela, e agora ela já está ali crescendo. É muito prazeroso saber que aquela sementinha vai ser plantada em outro lugar e daqui há alguns anos vai produzir frutos também. É uma rede de sementes, mas também é uma rede de trabalho entre várias pessoas.”

Autora: Marluci Pozzan
Revisão: Thamara Santos de Almeida e Vitor Lauro Zanelatto
Foto de capa: Marluci Pozzan

Tecendo, criando e plantando mudanças: redes e artivismo de Nara Guichon

Tecendo, criando e plantando mudanças: redes e artivismo de Nara Guichon

Tecendo, criando e plantando mudanças: redes e artivismo de Nara Guichon

“Não existe lixo, existe mau encaminhamento dos resíduos. Tudo provém de uma matéria-prima, da ação da Natureza, e nós estamos tratando como lixo” 

Mudar a condição de um material através do olhar, antes mesmo do toque, da dedicação e do trabalho. A artista e ativista Nara Guichon já enxerga nas redes de pesca descartadas possibilidades de expressão através do fazer artístico, percebe o que alguém julgou como inútil antes de realizar o descarte inadequado no oceano como possibilidades de criação. Faz tricô com o material e concebe peças que, mesmo sem palavras, expressam um manifesto de negação ao lixo e ao uso único dos materiais. 

Nara é gaúcha, mas mora há décadas no sul de Florianópolis. A vida cotidiana numa cidade onde a pesca e a maricultura são atividades econômicas significativas – em diferentes escalas – tornou inescapável o encontro da então artesã dedicada aos tecidos com as redes deixadas diretamente nas praias, ou que nelas chegaram após o abandono no oceano.

O descontentamento com a poluição por esse material e todos os impactos à fauna, flora e aos ecossistemas costeiros e marinhos provocou a artista à ação. Desde a década de 1990 Nara coleta, lava, tinge com pigmentos naturais e costura manualmente as redes, dando ao material sentido novo e provocando através de suas obras a conscientização sobre a poluição dos oceanos. A artista busca mudanças no mundo e nas formas de viver o mundo, tece para sensibilizar as pessoas sobre a finitude dos recursos naturais e demandar mudanças na forma com que sua espécie explora a Terra.

Do desejo de ver um futuro mais sustentável surgem obras esculturais que  superam o tamanho da artista. As redes também são utilizadas para criações em dimensões menores, proporcional às mãos, como as esponjas para lavar louças e sacolas para compras no hortifruti. Inspira com a arte, mantendo o compromisso com a realidade e com um dos seus grandes anseios: que os produtos sejam mais duráveis, acessíveis e distantes da lógica do uso único do material e envio ao aterro sanitário.

Seu tempo no ateliê é dividido com sua floresta, em contínua expansão e mutação. Em 1988, Nara Guichon tornou-se associada da Apremavi, colaborando de modo contínuo e ativo. Muitas das que agora são árvores na sua terra já foram mudas no Viveiro Jardim das Florestas, além das milhares que foram plantadas em Santa Catarina através da doação de uma parcela dos lucros auferidos com as vendas no seu ateliê. Caminhando entre florestas e restingas, Nara semeia o futuro.

Nara em sua casa, ateliê, jardim e floresta. Fotos: Vitor Lauro Zanelatto. 

Sementes de Futuro

Em busca de inspiração, a Apremavi apresenta nesta nova série de vídeos diversas formas de viver de forma ativista. Pessoas que se dedicam a contribuir com um mundo mais sustentável e biodiverso, criando soluções e buscando promover mudanças nos desafios locais e globais do nosso presente. 



 

Autor: Vitor L. Zanelatto
Revisão: Thamara Santos de Almeida
Foto de capa: Vitor L. Zanelatto

O Decênio Decisivo: chamado para enxergar as crises do mundo

O Decênio Decisivo: chamado para enxergar as crises do mundo

O Decênio Decisivo: chamado para enxergar as crises do mundo

Quanto tempo temos para salvar o futuro? O roteiro de destruição da Terra que está posto demanda uma mudança de direção nos modos de produção, consumo e exploração no nosso planeta. Este é o Decênio Decisivo. 

Quanto vale a vida humana? E a vida das outras espécies?
A natureza, intrincado e imensurável conjunto de interações entre o ambiente e as diferentes formas de vida que existem e que dependem uma das outras para existir está mais ameaçada a cada dia que passa, por conta dos rumos que a humanidade seguiu nos últimos séculos. Nem todos os humanos são responsáveis por isso, e alguns poucos são muito mais responsáveis que grande parte da população mundial. 

O valor imensurável da vida contrasta com a busca pelo acúmulo de riqueza a qualquer custo no tempo em que vivemos, gerando a maior ameaça à sobrevivência, das pessoas e de todos os seres os quais somos dependentes. No livro “O Decênio Decisivo”, Luiz Marques apresenta as diversas crises do antropoceno, um tempo de descalabros e crises múltiplas movidas pelo afastamento da nossa espécie da natureza, criando mudanças globais e locais capazes de extinguir espécies, aumentar a temperatura do planeta Terra e aumentar as desigualdades.

“É fato que o consumo de energias renováveis de baixo carbono está aumentando a taxas maiores que as de consumo dos combustíveis fósseis. Mas isso é irrelevante para a evolução do clima. O que importa para essa evolução é a quantidade de Gases de Efeito Estufa concentrada na atmosfera. Ao contrário dos humanos, o sistema climático não se impressiona com porcentagens”

O autor dedica-se em explicar de maneira acessível – ao mesmo passo que mantém um grande rigor científico – os principais catalisadores da emergência climática, desde os combustíveis fósseis até a conexão entre a crise na alimentação mundial, o uso desenfreado de agrotóxicos e a perda de insetos polinizadores nas áreas antropizadas. O estado da arte e as mudanças de paradigma necessárias para enfrentamento da emergência climática, como a transição energética, adaptação das formas de produzir e consumir e a mitigação dos efeitos da mudança no clima que já causam inúmeras consequências criam uma linha para conduzir o leitor para um diagnóstico inescapável de como as grandes sociedades contemporâneas estão ignorando a maior ameaça à vida já promovida pela sua própria espécie. 

“As emissões causadas pela pecuária somam 30% das emissões totais de metano, 27% provenientes da atividade entérica dos rebanhos. Trata-se de uma contribuição quatro vezes superior que a das emissões provenientes dos arrozais e substancialmente equivalente à das fontes de emissão de metano provenientes dos combustíveis fósseis e da mineração de carvão (33%)”

Também são apresentadas as problemáticas do consumo de carne na atualidade, produzida em escala industrial, a partir do uso de commodities para a alimentação dos animais. Amplamente danoso, o modelo produtivo de proteína animal vigente é danoso, sobretudo as áreas naturais – que são desmatadas para a produção em escala de commodities – e nas emissões de metano. Ainda nessa linha, há o crescente aumento do uso de agrotóxicos na produção de alimentos. O cenário é esmiuçado pelo autor, a leitura não é feita impunemente: busca-se promover uma reflexão de como as pessoas tem se alimentado e como ao longo do tempo os alimentos tornaram-se produtos produzidos em escala, sem levar em consideração a nutrição, o bem-estar animal ou a qualidade, mas apenas as possibilidades de lucro.

“A combinação do fator climático com todos os fatores típicos das atividades do agronegócio – desmatamento, intoxicação e morte dos organismos por agrotóxicos, aniquilação da biodiversidade, uso irresponsável de antibióticos e uso insustentável dos solos – explica por que (…) a taxa do aumento do ‘fator total de produtividade’ da agricultura começou a declinar” 

Segundo o autor, superar o capitalismo é medida-chave para frear a emergência climática. Em contraste, nem mesmo as democracias liberais do mundo se mostram ameaçadas e conflitos armados estão ocorrendo neste instante no mundo, um cenário desesperador para aqueles que acreditaram num cenário internacional globalizado, mais seguro e pacífico. A contínua perda de credibilidade da governança global climática e da eficiências das Conferências das Partes para o Clima (COPs), a ineficiência no cumprimento dos compromissos pelos países e a ausência de medidas efetivas para descarbonizar as economias e extirpar o uso de combustíveis fósseis mostram que metas oficiais estão longe da eficiência, e que a mobilização e demanda das sociedades por mudanças também precisam ser mais significativas.

“A questão não é mais, portanto, sobre quais são os limites nem sobre onde situá-los na escala de sustentabilidade. A questão é política, pois quem fala em limites deve afrontar dois problemas: (i) quem pode e deve estabelecê-los; e (ii) como garantir que sejam implantados e respeitados. Esses dois problemas nos conduzem a questão da democracia (…)”  

O Decênio Decisivo precisa de honestidade das pessoas para enxergar as crises do mundo. A mobilização, pressão e visibilidade para a urgência em que vivemos não busca promover o desespero, mas sim uma mudança no colapso indiscutível que se arranja em nosso futuro se a rota traçada no presente se manter a mesma. 

“Há um novo projeto de mundo que tem sido ofertado pelos povos originários, verdadeiros guardiões do planeta. É um projeto de descolonizar a vida e abrir caminho para a sociedade da felicidade e do amor, do bem-viver, do envolvimento. Um reencontro a partir de uma nova matriz energética, dos direitos da natureza em oposição à distopia de terra arrasada e do colapso climático”
– ‘Chamado pela Terra’, manifesto de Sônia Guajajara e outras lideranças indígenas para as eleições nacionais de 2022, destacado na abertura do capítulo ‘Propostas para uma política de sobrevivência’. 



Sobre o autor

Luiz Marques é professor livre-docente aposentado e colaborador do Departamento de História do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde foi co-fundador do curso de pós-graduação em História da Arte. Foi pesquisador convidado no Institut Français de Florence e é autor de ensaios, livros e catálogos sobre a tradição clássica, sobretudo no âmbito da história da arte da Itália dos séculos XIII ao XVI. Entre 1995 e 1997, foi curador-chefe do Museu de Arte de São Paulo (Masp). Nos últimos quinze anos, tem se dedicado à docência e a pesquisas sobre as crises socioambientais contemporâneas. 

Foi professor convidado na Universidade de Leiden, na Holanda, e publicou artigos e livros, entre os quais Capitalismo e colapso ambiental (Editora da Unicamp, 2015; publicado em inglês pela Springer, 2020), que em 2016 obteve o Prêmio Jabuti e o segundo lugar no Prêmio da Associação Brasileira de Editoras Universitárias (Abeu). Entre 2017 e 2021, contribuiu regularmente com artigos para o Jornal da Unicamp. É atualmente professor sênior da Ilum — Escola de Ciência, vinculada ao Centro Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais (CNPEM), e membro do Coletivo 660, nascido do Fórum Social Mundial. 

 

Livro "O Decênio Decisivo"

Autor: Vitor Lauro Zanelatto
Revisão: Thamara Santos de Almeida
Foto de capa: Vitor Lauro Zanelatto

Jovem usa a goiaba-serrana para desenvolver pomada fitoterápica

Jovem usa a goiaba-serrana para desenvolver pomada fitoterápica

Jovem usa a goiaba-serrana para desenvolver pomada fitoterápica

Em uma escola pública de Água Doce (SC), estudantes e professores encontraram na goiaba-serrana, espécie da Mata Atlântica, inspiração para produzir um projeto de pesquisa e desenvolver uma pomada anti-inflamatória. 

A iniciativa surgiu com a integração de alguns componentes curriculares da escola, como metodologia científica, química, matemática, sociologia e projeto de conservação ambiental. Dessa forma, a professora Janete Rodrigues e seus colegas buscam exercitar os princípios para a produção de ciência, ainda na escola pública.

O projeto “Uso sustentável de propriedades medicinais da goiaba-serrana (Acca sellowiana) na produção de uma tintura fitoterápica e pomada cicatrizante” iniciou com uma pesquisa bibliográfica da literatura sobre a espécie; seguida de pesquisa de campo nas áreas onde a espécie se desenvolve. Os estudantes puderam descobrir as várias propriedades medicinais importantes que a espécie apresenta, segundo dados da literatura, como propriedades anti-inflamatórias. Depois disso, experimentos foram desenvolvidos na escola para produzir os insumos e desenvolver a formulação ideal. 

A falta de estrutura para a pesquisa e desenvolvimento de experimentos foi o principal desafio para desenvolver o projeto, conforme explica Janete Rodrigues, professora orientadora do projeto: “Nós temos um laboratório na escola, mas faltam insumos e equipamentos. Utilizamos aparelhos de universidades da região, que também auxiliaram na realização dos testes com o protótipo da pomada. Produzir ciência na escola pública é uma prática de resistência”.  

Os principais conhecimentos que buscamos apresentar no projeto são as propriedades da goiabeira-serrana, que podem ter uso sustentável e serem utilizadas na área medicinal, de forma fitoterápica e em aplicações cicatrizantes, destaca Eloise Antunes de Lima, estudante autora da pesquisa.

 

Registro das apresentações de Eloise nas feiras em que participou

Registros das apresentações de Eloise nas feiras em que participou. Fotos: Divulgação/Janete Rodrigues. 

O resultado do projeto é uma pomada cicatrizante sustentável e natural, que tem como compostos principais a tintura obtida das folhas da goiabeira-serrana, óleo de coco, óleo de amêndoas, cera de abelha e goma xantana. As descobertas foram apresentadas na feira Infomatrix, em Blumenau (SC), onde conquistou uma vaga para participar da Mostra Internacional de Ciência e Tecnologia (MOSTRATEC), realizada em outubro de 2023 em Novo Hamburgo (RS). 

Nesse segundo evento, o projeto de Eloise foi um dos 12 selecionados entre mais de mil projetos de pesquisa para representar o Brasil na maior feira pré-universitária de ciência e engenharia do mundo, a  Regeneron ISEF (Regeneron International Science and Engineering Fair) que será realizada de 11 a 17 de maio de 2024, em Los Angeles, nos Estados Unidos.

A professora Janete compartilhou o que planejam para a participação no evento internacional:  “A expectativa em relação à Feira na Califórnia é mostrar a biodiversidade do nosso estado e os potenciais do uso sustentável, que respeita o meio ambiente e promove a ciência. É a primeira vez que uma estudante de Santa Catarina participa desse evento; e será uma grande honra representar o Brasil e a nossa região na maior feira pré-universitária de ciência e engenharia do mundo”. 

Conhecer a biodiversidade local é uma etapa fundamental para a proteção da natureza e para o uso sustentável dos recursos, por isso o tema é trabalhado com constância na escola Escola Estadual Ruth Lebarbechon. Em algumas dessas ocasiões, a pedido da escola, a Apremavi realizou a doação de mudas nativas da Mata Atlântica, como a goiaba-serrana, que são utilizadas em plantios na comunidade escolar e em atividades de educação ambiental.

Valorização da biodiversidade

A pesquisa também está conectada com a realidade do território da escola, e busca divulgar as possibilidades para promover o desenvolvimento sustentável, voltada à realidade dos pequenos proprietários rurais da região. Além das folhas e frutos de goiaba-serrana, outros insumos naturais são utilizados na composição da pomada, como a cera de abelha residual da apicultura, que também pode ser comercializada. 

Novos produtos para a áreas da saúde já estão no horizonte da equipe que desenvolveu o projeto premiado. Um deles é uma membrana curativa, que também tem como princípio ativo a goiaba-serrana; a ideia é utilizar a farinha do mesocarpo do fruto, resíduo produzido na extração do óleo essencial, para a composição de um curativo anti-inflamatório para aplicação em queimaduras. Essa nova ideia também já está em fase de testes de eficácia da composição, em parceria com universidades, como o Instituto Federal Catarinense e a Universidade Alto Vale do Rio do Peixe (UNIARP). 

A professora Janete destaca a importância de valorizar e de promover suporte a iniciativas como essa, para que as comunidades escolares tenham condições de avançar na educação científica: “Outro desafio é a cobertura de custos para o desenvolvimento da pesquisa e apresentação dos resultados, em feiras e mostras. Por isso, a estruturação de escolas públicas e a valorização de estudantes e professores empenhados em produzir ciência é essencial”

Para ajudar Eloise a participar da feira que acontecerá em maio na Califórnia e apresentar sua pesquisa, a escola está organizando uma vakinha online, com o objetivo de cobrir os custos da participação, como a emissão do visto de viagem e passagens aéreas. 

> Apoie o projeto


* Os dados sobre usos medicinais das espécies nativas são apenas para informação geral. O uso de medicamentos fitoterápicos deve ser seguido de orientações de profissionais habilitados.

Autor: Vitor Lauro Zanelatto
Revisão: Thamara Santos de Almeida e Carolina Schäffer
Foto de capa: Vitor Lauro Zanelatto

Incêndios no Parque do Tabuleiro dizimam 230 hectares em 2023

Incêndios no Parque do Tabuleiro dizimam 230 hectares em 2023

Incêndios no Parque do Tabuleiro dizimam 230 hectares em 2023

Em 2023 a maior Unidade de Conservação de Santa Catarina registrou pelo menos três grandes incêndios. Em tese protegida e criada para proteger a biodiversidade, repetidamente a área sofre ataques que buscam a ocupação ilegal das terras. 

O Parque da Serra do Tabuleiro protege 84.130 hectares de Mata Atlântica, abrangendo 8 municípios de Santa Catarina. As fitofisionomias de Manguezal, Restinga, Floresta Ombrófila Mista e Floresta Ombrófila Densa, as formações geográficas de cordões arenosos e vegetação com influência salina e a rica biodiversidade da região descrita pelos botânicos e ecologistas Pe. Raulino Reitz e Roberto Miguel Klein ainda na década de 1970 motivaram o estado a criar a Unidade de Conservação. No século XXI, essas paisagens naturais continuam sendo atacadas em detrimento do avanço da especulação imobiliária, principalmente nas áreas próximas às praias. 

A realidade do Parque Estadual do Tabuleiro (PAEST) sintetiza os problemas de grande parte das áreas protegidas do país: a destruição promovida pelos incêndios criminosos é vista da Floresta Amazônica até a restinga do sul da Mata Atlântica. Os principais motivadores para esses crimes ambientais buscam a mudança na área para a invasão e implementação de atividades econômicas, ou ainda em retaliação à criação da Unidade de Conservação e à legislação socioambiental, a linha é tênue. 

No Parque do Tabuleiro os incêndios geralmente ocorrem nas áreas de restinga, sobretudo na região da Baixada do Macambu. Há formações de restinga arbórea, herbácea e arbustiva, essas duas últimas onde os incêndios são mais frequentes. Outro problema da área é a presença de Pinus sp., árvore exótica invasora que produz biomassa altamente comburente através da queda das folhas secas, o que faz o fogo se alastrar com rapidez, sobretudo com os ventos constantes na área litorânea. Nessas condições, o êxito da ação criminosa é praticamente garantido.

A ação contra o fogo neste episódio foi coordenada pelo Corpo de Bombeiros, com apoio dos brigadistas do parque e da Polícia Militar. Luiz Henrique Fragoa Pimenta, que atua no PAEST, comenta que esse cenário de destruição tem se repetido: “Em 2023 houve pelo menos três incêndios na área do parque, um em abril e dois em dezembro”.  Apenas no último mês  cerca de 230 hectares atingidos, dizimando populações de espécies da fauna, flora e funga da restinga catarinense, muitas endêmicas e ameaçadas de extinção.

parque do tabuleiro

No último incêndio, que ocorreu no Natal de 2023, atingiu estradas, bloqueou acesso às praias e precisou mobilizar diversas instituições para ser controlado. Fotos: @restingas.do.sul/João de Deus Medeiros.

O Parque conta com um plano de contingência para incêndios ambientais, elaborado em conjunto com a defesa civil e órgãos de segurança, buscando não apenas extinguir os incêndios, mas também promover investigações sobre a origem e responsabilidade desses episódios, ação essencial para que de fato os autores sejam identificados e aplique-se à legislação ambiental ao caso. Outra atividade que está sendo realizada pela administração do PAEST é a sinalização das áreas críticas e cercamento de espaços nas áreas de borda da Unidade de Conservação. 

O colaborador na administração do PAEST relata que é muito difícil coletar provas e responsabilizar os autores dos crimes, mesmo com as investigações da Polícia Civil e trabalho da Polícia Científica. Isso porque há uma estratégia em promover os focos de incêndio à noite, horário de menor movimento nas estradas e quando os colaboradores do Parque não estão atuando. 

Pimenta destaca o esforço para buscar sensibilizar a população e promover na comunidade um movimento pela proteção do Parque do Tabuleiro: “Outra estratégia para mitigar episódios como os de dezembro é a educação ambiental, com oficinas de combate à incêndio, atividades de educação ambiental nas escolas e atividades de monitoramento“. Também há uma rede colaborativa com a comunidade da região limítrofe ao Parque, buscando comunicar  focos de incêndio rapidamente, através do WhatsApp. 

Com pouca comoção política e cobertura da mídia local sobre o assunto, é preciso manter a vigilância não apenas no Parque do Tabuleiro, mas em todas as Unidades de Conservação, patrimônios públicos para nós e chance de sobrevivência para muitas espécies. Valorizar as áreas protegidas, apoiar propostas legislativas sobre a temática e manter a vigilância, denunciando qualquer indício de ação criminosa é essencial para evitar a perda de áreas naturais. As áreas protegidas precisam da nossa proteção.

 

parque do tabuleiro

Área litorânea do PAEST. Foto: IMA SC.

Autor: Vitor Lauro Zanelatto
Colaboração: Luiz Henrique Fragoa Pimenta
Revisão: Thamara Santos de Almeida
Foto de capa: registro do incêndio no PAEST em 25/12/2023. Foto: @restingas.do.sul/João de Deus Medeiros

Nova publicação do OCF: desafios e soluções para a conservação

Nova publicação do OCF: desafios e soluções para a conservação

Nova publicação do OCF: desafios e soluções para a conservação

No último mês o Observatório do Código Florestal lançou a publicação “Código Florestal nos biomas, desafios e soluções” que aborda as complexidades e desafios de conservação enfrentados pelos seis biomas brasileiros sob a ótica do Código Florestal, a Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012.

O conteúdo busca informar a sociedade e guiar a atuação dos membros do observatório em cada um dos biomas para o avanço da implementação do Código Florestal e foi elaborado a partir de discussões de especialistas em cada um dos biomas.

No capítulo intitulado “O Código Florestal e os desafios para a conservação no bioma Mata Atlântica” são apontados alguns desafios e soluções: 

 
Desafio 1: Implementar e salvaguardar as legislações em vigor, em especial o Código Florestal e a Lei da Mata Atlântica.

É destacado que 50% dos alertas de desmatamento na Mata Atlântica desde 2018 ocorreram em Áreas de Preservação Permanente (APPs), sendo 90% desses alertas correspondem a desmatamentos ilegais. A urgência na implementação das leis de proteção, como o Código Florestal (CF) e a Lei da Mata Atlântica, é ressaltada devido à falta de efetividade na aplicação, atribuída à falta de vontade política e ataques às normas. 

O CF de 2012 anistiou parte do desmatamento em áreas rurais consolidadas em APPs até julho de 2008, enquanto a Lei da Mata Atlântica estabeleceu a proteção de vegetações primárias e secundárias. Recentemente, o Ministério do Meio Ambiente acolheu um parecer da Advocacia Geral da União (AGU) defendendo a aplicabilidade de artigos do CF nas áreas da LMA, gerando um conflito legal. 

A ação da AGU pode resultar na anistia de desmatamentos entre 1990 e 2008, enfraquecendo os mecanismos de proteção e aumentando o risco de desmatamento e degradação ambiental em áreas sensíveis da Mata Atlântica.

Solução 1.1: Resolver o conflito jurídico criado entre a Lei da Mata Atlântica e o Código Florestal 

・Defesa da prevalência da Lei da Mata Atlântica com base no próprio ordenamento jurídico, como defendido pelos Ministérios Públicos Federal e Estaduais e sociedade civil organizada.

・Produção de conhecimento científico sobre os impactos do reconhecimento de áreas consolidadas em APPs na Mata Atlântica para embasar decisões jurídicas e sensibilizar a população

・A mobilização social indo além e questionando junto às cortes os atos praticados pelo poder público ou atores privados que sejam prejudiciais ao direito fundamental ao ambiente ecologicamente equilibrado, citando como exemplo a mobilização que a Apremavi participou com outras ONGs

Desafio 2: Engajar os municípios na proteção e recuperação de áreas degradadas na Mata Atlântica. 

Os desafios para a conservação na Mata Atlântica são heterogeneamente distribuídos, com 23% dos municípios possuindo menos de 10% de habitat remanescente. Além disso, 100 municípios concentram 70% do desmatamento entre 2018 e 2019, evidenciando a necessidade de estratégias específicas para problemas locais na conservação do bioma.

Solução 2.1: Estimular o desenvolvimento dos Planos Municipais de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica (PMMA).

A Lei da Mata Atlântica (LMA) introduziu o Plano Municipal de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica (PMMA) como um instrumento pouco explorado, permitindo que os municípios personalizem a implementação da LMA de acordo com sua realidade. O PMMA abrange prioridades locais, incluindo conservação, licenciamento ambiental, restauração da vegetação, ações preventivas e envolvimento da comunidade, proporcionando uma oportunidade para parcerias público-privadas que se alinhem às agendas nacionais e globais de mudanças climáticas, conservação e restauração.

Desafio 3: Proteger os ecossistemas vulneráveis 

Os campos de altitude, restingas e manguezais da Mata Atlântica enfrentam maior vulnerabilidade devido à pressão antrópica, falta de monitoramento efetivo, inação política na proteção e ataques constantes às normativas específicas. A Mata Atlântica, rica em biodiversidade adaptada a campos naturais e de altitude, enfrenta uma conversão acelerada dessas áreas, atribuída à dificuldade de monitoramento, confusão entre campos nativos e pastagens, além da desvalorização social dessas áreas, facilitando seu uso irregular.

A perda de proteção legal dos campos naturais, com a redução em 90% da área de topos de morro protegidas pelo Código Florestal de 2012, amplia os desafios de conservação nesses ecossistemas cruciais.

Restingas e manguezais, essenciais para combater a erosão costeira e enfrentar os impactos das mudanças climáticas, estão sob intensa pressão de conversão pelo setor imobiliário. Apesar das proteções legais estabelecidas pelo Código Florestal, Lei da Mata Atlântica e Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, bem como resoluções do CONAMA que garantiam medidas protetoras foram recentemente revogadas – como a faixa protetora de 300 metros para as restingas – destacando a instabilidade jurídica enfrentada pelos instrumentos de proteção às vegetações costeiras.

 A mobilização social bem-sucedida, que reverteu a decisão no STF, destaca a importância da conscientização pública na defesa desses ecossistemas cruciais para a adaptação às mudanças climáticas e a preservação da costa, mas ilustra o regime de instabilidade jurídica a que os instrumentos de proteção às vegetações costeiras estão submetidos.

Solução 3.1: Aprimorar os instrumentos de proteção aos campos de altitude.  

・Capacitação dos agentes de fiscalização e aprimoramento dos sistemas de monitoramento

・Sociedade civil mobilizada, em parceria com a academia e Ministérios Públicos deve pressionar o poder público pelo cumprimento da LMA nas áreas de campos nativos remanescentes e pela restauração ecológica daqueles em uso irregular

Solução 3.2: Assegurar a implementação dos instrumentos de proteção aos ambientes de restingas e manguezais. 

・Salvaguarda de todos os instrumentos de proteção complementares ao CF, bem como a contínua mobilização social embasada na ciência e no interesse público.

・Implementação dos planos de gerenciamento costeiro estaduais e municipais também pode estabelecer áreas prioritárias de conservação das restingas.

Publicação OCF
O Observatório do Código Florestal

O Observatório do Código Florestal é uma rede criada em maio de 2013 para promover o controle social da implantação da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012 (Lei de Proteção da Vegetação Nativa do Brasil) e garantir integridade ambiental, social e econômica às florestas em áreas privadas. Em 2022, 43 organizações da sociedade civil fazem parte da rede e atuam em prol do objetivo comum de proteção, restauração e uso sustentável das florestas

Autora: Thamara Santos de Almeida, com informações do Observatório do Código Florestal
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto
Foto de capa: Parque Natural Municipal Mata Atlântica, localizado em Atalanta (SC),  ©️ Wigold Schäffer

Como lidar com um Planeta em ebulição?

Como lidar com um Planeta em ebulição?

Como lidar com um Planeta em ebulição?

Cinco dias após o início do verão os termômetros da Serra Catarinense registravam 5 graus e a paisagem amanhecia coberta com uma geada típica de outra estação. Em contraste, ainda em novembro, o relatório da Organização Meteorológica Mundial (OMM) já apontava 2023 como o ano mais quente da História. Nesse intervalo de tempo, as regiões Sudeste e Centro Oeste do país enfrentavam uma onda de calor nunca antes vista com recordes de temperatura; do Norte e do Centro Oeste as manchetes traziam imagens assustadoras dos maiores rios da Amazônia sem água, enquanto o Pantanal sucumbia numa nuvem de cinzas por conta das queimadas; e no Sul, com destaque para Santa Catarina, chuvas intensas e volumosas, enchentes com recordes históricos de proporção e duração, seis tornados e um novo alerta da Defesa Civil para um ciclone extratropical, colocavam o estado no centro das atenções por conta da constante situação de risco.

O apanhado de manchetes do parágrafo anterior é um retrato real de que o clima na Terra está mudando drasticamente e isso é resultado de um Planeta em ebulição, que já apresenta registros de aumento na temperatura global de 1,32°C em comparação aos índices da era pré-industrial (1850-1900). Diante destes números e, considerando que faltam apenas 7 anos para o prazo fatal proposto pelo Acordo de Paris para limitarmos o aumento da temperatura em 1,5°C, parece pouco provável que consigamos cumprir a meta sem fazer um reajuste de rota, implementando metas mais ambiciosas e compromissos efetivos.

É claro que não podemos deixar de mencionar que o fenômeno El Niño, que surge quando há o aquecimento das águas do Oceano Pacífico, agrava o cenário das mudanças climáticas, mas são as ações e omissões humanas que criaram este cenário de crise.

Aplicamos a palavra crise de forma equivocada, porque em certos dicionários ela quer dizer mudança súbita, já que as consequências que vemos hoje são causadas por décadas de negligência com o Planeta; que acúmula um excesso de gases de efeito estufa, liberados com a queima de combustíveis fósseis e a mudança de cobertura e uso do solo, e esquenta sem parar.

Além do fenômeno cíclico de nome latino, no caso de Santa Catarina, uma das ações que agrava o cenário de crise e tem colocado a população, sobretudo os mais vulneráveis, em risco, foi e continua sendo, a construção das cidades nas áreas contíguas aos rios, praticamente sobre os cursos d’água em muitos casos, e a ocupação desenfreada das áreas de preservação permanente (APPs), mesmo depois dos desastres de 1983 e 1984, que se repetiram em 2023, ter feito vários municípios do Vale do Itajaí enfrentassem as maiores enchentes da história da região.

Imagens da enchente de novembro de 2023 que devastou cidades do Alto Vale do Itajaí, deixando para trás um rastro de destruição imenso, com prejuízos ecológicos, econômicos, sociais e humanos. Fotos: Carolina Schäffer.

A pergunta que permeia a sociedade quando a enchente bate à porta infelizmente pouco tem a ver com a ocupação das áreas de risco. As populações nessas horas têm um único objetivo: sobreviver. Em algumas instâncias a crise no clima é citada, mas assim como se lava a lama que a enxurrada trouxe, parece que também são lavadas da memória da população as conversas sobre as ações que levaram todo mundo a viver aquilo.

Sabemos que as ações anti-ambientais e negacionistas trazem consequências climáticas extremas imediatas. Nesse cenário de emergência, que cidades do Vale do Itajaí viram em cinco ocasiões diferentes só em 2023, pouco se elabora sobre a omissão por parte dos governantes ao se absterem de atitudes resolutivas no longo prazo e ignorarem a legislação ambiental vigente e, para piorar, insistirem na tentativa de sanção de leis e decretos que ignoram, por exemplo nesse caso, as faixas de proteção mínima dos rios, conforme previsto pelo Código Florestal

Não é apenas investindo em grandes obras de infraestrutura, como nomenclaturas que emulam novas tecnologias eletrônicas ou baseadas no vício histórico de importar soluções estrangeiras para buscar soluções às problemáticas do Brasil – como parece ser o foco de muitos governos – que novos cenários de enchentes serão evitados; é preciso olhar para a paisagem e buscar soluções baseadas na natureza.

Essas soluções começam com a desocupação das margens dos rios e impedindo que novas construções e aterros sejam feitos nas APPs, com o planejamento de construções adaptadas para enchentes em áreas inundáveis fora das APPs e um direcionamento imediato do crescimento das cidades para áreas não sujeitas a inundações ou deslizamentos. Além disso, os especialistas têm repetido com exaustão, se soubermos manter nossas florestas bem conservadas, elas podem ser tão ou até mais importantes na minimização dos efeitos das cheias periódicas, em comparação comas barragens para a contenção de cheias, obras multimilionárias e defendidas por muitas lideranças políticas. Essas estruturas para a contenção de grandes volumes de água à jusante podem implicar em significativos impactos, como o descumprimento de direitos fundamentais e injustiças socioambientais, vistas à exaustão na região da Barragem Norte, em José Boiteux (SC).

O reajuste de rota é necessário e só assim vamos conseguir lidar com o Planeta em ebulição. É preciso garantir a conservação das florestas e trabalhar pelo envolvimento amplo da sociedade nos projetos de restauração dos ecossistemas; afinal, ambos ajudam a manter a biodiversidade e a boa formação de solos, amenizam os climas extremos, protegem as encostas contra deslizamentos de solos, conservam os mananciais, a qualidade e quantidade das águas, além de contribuírem para a harmonia paisagística e para o ecoturismo.

A realidade da emergência no clima, do nosso Planeta em ebulição e das calamidades pelos eventos climáticos extremos está posta, é inegável e cada vez mais intensa. Os seres humanos e não-humanos já estão sentindo e sofrendo graves consequências, encarando a perspectiva do ano mais quente até aqui ser também o ano mais fresco do resto das nossas vidas. Resistiremos e continuaremos buscando um futuro sustentável e equilibrado. O trabalho é árduo, mas é a única chance de proteger a vida, e essa é a missão da Apremavi. 

 

Autora: Carolina Schäffer
Revisão: Vitor Lauro Zanelatto
Foto de capa: Registro da última enchente no Alto Vale (nov/2023). ©️Carolina Schäffer

Água: restaurar para garantir o fluxo da vida ・Código Florestal na Prática

Água: restaurar para garantir o fluxo da vida ・Código Florestal na Prática

Água: restaurar para garantir o fluxo da vida ・Código Florestal na Prática

O Código Florestal é claro e eficiente nas determinações para a proteção dos recursos hídricos, ponto de partida para a restauração de áreas que passaram pela mudança de uso do solo ao longo das décadas. O exemplo vem das margens do rio Água Verde, no Planalto Norte Catarinense.

Pensar na proteção da água – em escala de uma comunidade ou de um país – é atividade prioritária para garantir a sustentabilidade do território, a vida e o equilíbrio ecossistêmico. Em meio a emergência climática do que enfrentamos no presente, promover a restauração e proteger os recursos hídricos também são medidas para a resiliência das cidades e comunidades, reduzindo assoreamento, arrastes de matéria orgânica e deslizamento do solo. 

O trabalho deve começar na Mata Ciliar, nome dado para as florestas e demais formas de vegetação nativa que protejam margens de rios ou nascentes. De acordo com o Novo Código Florestal, as áreas de preservação permanente – APPs (art. 4º), em zonas rurais ou urbanas, são as faixas marginais de qualquer curso d’água natural, perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de:

・ Nascentes: raio de 50 metros em forma de círculo;
・ Rios com até 10 metros de largura 30 metros em cada margem;
・ Rios de 10 a 50 metros de largura 50 metros em cada margem;
・ Rios de 50 a 200 metros de largura 100 metros em cada margem;
・ Rios de 200 a 600 metros de largura 200 metros em cada margem;
・ Rios acima de 600 metros de largura 500 metros em cada margem.

APPs Código Florestal

É importante ressaltar que o tamanho (largura) das faixas de APP nas margens dos rios, das nascentes, das lagoas e lagos não mudou com o Novo Código Florestal; o que mudou é o tamanho (largura) da faixa a recuperar naqueles imóveis onde existem áreas de APP com uso consolidado antes de 22 de julho de 2008, ocupadas com edificações, benfeitorias ou atividades agrossilvipastoris. Em todos os casos é obrigatório recuperar a faixa mínima estabelecida pela lei de acordo com o tamanho do imóvel.

Os critérios para definir uma pequena propriedade rural são apresentados na Lei nº 11.326/2006
I. Não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais
II. Utilize predominantemente mão de obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento;
III. Tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo;
IV. Dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família.

Módulo fiscal – De acordo com a Lei nº 6.746/1979, módulo fiscal é uma unidade de medida agrária, expressa em hectares, que corresponde à área mínima necessária a uma propriedade rural para que sua exploração seja economicamente viável.

> Saiba mais na cartilha Planejando Propriedades e Paisagens

 

#Na prática: O Código Florestal e a restauração de APPs na comunidade

Em Canoinhas, no Planalto Norte Catarinense, o fluxo das nascentes e riachos já não era o mesmo das lembranças dos proprietários rurais. Assim como a quantidade de água, a proteção das Áreas de Preservação Permanente foi reduzida continuamente ao longo das décadas, colocando em risco as atividades agrícolas no terreno e ameaçando o equilíbrio de toda a região.

O incômodo ao ver escasso esse recurso essencial a todas as formas de vida motivou os produtores a buscar auxílio junto ao escritório local da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (EPAGRI), que logo indicou a Apremavi como parceira para fazer a restauração ecológica acontecer. Na época, cerca de 28 proprietários de áreas rurais do rio Água Verde, que integra a microbacia da região, se mobilizaram para participar do projeto de restauração florestal promovido pela Apremavi. 

Nivaldo Dranka, um dos participantes do projeto, recebeu cerca de 300 mudas de espécies nativas através do projeto Restaura Alto Vale, executado pela Apremavi entre 2018 e 2022. Com essa atuação conjunta, mais de 12 hectares foram restaurados, protegendo nascentes e cursos d’água na comunidade. Além da restauração nas áreas indicadas pelo Código Florestal, uma faixa adicional nas APPs foi restaurada exclusivamente com erva-mate (Ilex paraguariensis), com a premissa de promover uma atividade econômica sustentável adicional, já que a extração e beneficiamento da planta é significativa na região do Planalto Norte. 

Confira a reportagem do Canal Rural sobre as atividades em Canoinhas:

O plantio de mudas de erva-mate pode ser uma estratégia para diversificar as atividades econômicas na propriedade. Mudas produzidas no viveiro da Apremavi. Fotos: Arquivo Apremavi.

Autor: Vitor Lauro Zanelatto
Revisão: Carolina Schäffer
Foto de capa:  Equipe Apremavi em um plantio do projeto Restaura Alto Vale, 2021. ©️ Arquivo Apremavi

Embiruçu, endêmica da Mata Atlântica e indicada para recuperação de APPs

Embiruçu, endêmica da Mata Atlântica e indicada para recuperação de APPs

Embiruçu, endêmica da Mata Atlântica e indicada para recuperação de APPs

O embiruçu (Pseudobombax grandiflorum) é uma espécie endêmica da Mata Atlântica que ocorre no Nordeste (Bahia, Maranhão, Sergipe), Sudeste (Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo) e Sul (Santa Catarina) do Brasil. As árvores maiores atingem dimensões próximas a 25 metros de altura e 90 centímetros de diâmetro na altura do peito (DAP).

É polinizada principalmente por morcegos da família Phyllostomidae – Anoura caudifer e A. geoffroyi, e abelhas silvestres, sobretudo as irapuá. A dispersão dos seus frutos e sementes é anemocórica, realizada pelo vento.

É uma espécie pioneira a secundária inicial, encontrada no interior da floresta primária e principalmente em formações secundárias (capoeiras e capoeirões). Do ponto de vista da restauração, pode ser plantada a pleno sol, em pequenos plantios puros ou em plantios mistos, associados com espécies pioneiras. É indicada para plantios em áreas de preservação permanente bem como para recuperação natural de voçorocas. 

O embiruçu também é importante para a fauna, pois o macaco-prego se alimenta das flores dessa espécie, que são ricas em néctar, é extremamente ornamental pela forma pouco comum de seus ramos quando em floração, cujas pontas terminam abruptamente. Também apresenta ótimas qualidades para paisagismo em geral. O embiruçu é uma das espécies nativas produzidas no Viveiro Jardim das Florestas e utilizada pela Apremavi em plantios de restauração florestal.

> Conheça o Viveiro e compre mudas nativas

Detalhes da flor, árvore e fruto do Embiruçu. Fotos: João Paulo de Maçaneiro CC BY-NC-SA 4.0 DEED , Artur403, CC BY-SA 3.0, Mauro Halpern CC BY 2.0 DEED, Mauricio Mercadante, CC BY-NC-SA 2.0 DEED.

Embiruçu

Nome científico: Pseudobombax grandiflorum (Cav.) A. Robyns
Família: Malvaceae.
Utilização: Madeira utilizada para fabricação de caixotes e miolos de compensado. Paisagismo em geral.
Coleta de sementes: Diretamente da árvores quando iniciar a abertura espontânea dos frutos.
Época de coleta de sementes: Setembro a novembro.
Fruto: Verde, deiscente.
Flor: Branca.
Crescimento da muda: Rápido.
Germinação: Rápida.
Plantio: Mata ciliar, área aberta, solo degradado
Status de conservação: pouco preocupante – LC (não ameaçada).

 

Aspectos do embiruçu: árvore e mudas produzidas pelo Viveiro Jardim das Florestas. Fotos: Wigold B. Schäffer. 

Fontes consultadas

CARVALHO-SOBRINHO, J.G; YOSHIKAWA, V.N. Pseudobombax, in Flora e Funga do Brasil. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em: <https://floradobrasil.jbrj.gov.br/FB9195>. Acesso em: 22 dez. 2023

BRASIL. Paulo Ernani Ramalho Carvalho. Embrapa. Embiruçu (Pseudobombax grandiflorum). Colombo: Embrapa Florestas, 2008. 9 p. Circular Técnica 155. Disponível em: https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/CNPF-2009-09/44068/1/circ-tec155.pdf. Acesso em: 27 dez. 2023.

MIRIAM PROCHNOW (org.). No Jardim das Florestas. Rio do Sul: Apremavi, 2007. 188 p. Disponível em: https://apremavi.org.br/wp-content/uploads/2018/03/livro-jardim-das-florestas.pdf. Acesso em: 27 dez. 2023.

Autora: Thamara Santos de Almeida
Revisão: Carolina Schäffer e Vitor Lauro Zanelatto
Foto de capa: ©️ Wigold B. Schäffer



Apremavi testa semeadura direta de espécies nativas para restauração

Apremavi testa semeadura direta de espécies nativas para restauração

Apremavi testa semeadura direta de espécies nativas para restauração

Buscando diversificar as metodologias e complementar a restauração através do plantio de mudas, sementes de espécies nativas da Mata Atlântica devem chegar ao solo de áreas demonstrativas em diferentes projetos executados pela Apremavi. 

A primeira atividade foi realizada na área piloto do projeto Conservador das Araucárias, em Urubici (SC). Uma área da Fazenda Santa Bárbara ocupada no passado por pastagem para o gado recebeu sementes de bracatinga (Mimosa scabrella), aroeira-vermelha (Schinus terebinthifolia), capororoca-branca (Myrsine coriacea) e araçá-vermelho (Psidium cattleyanum), espécies de crescimento rápido e com boa resistência ao frio da Serra Catarinense. A semeadura foi realizada à mão livre pelos técnicos da Apremavi. 

A metodologia de semeadura direta tem grande potencial na restauração de áreas degradadas. Sementes de espécies nativas de diferentes estágios sucessionais podem ser utilizadas, dependendo do diagnóstico da área e do objetivo da restauração, e pode ser uma metodologia vantajosa por conta da diminuição de custos de implantação e melhor adaptação e desenvolvimento das espécies às condições ambientais do local. Sendo assim, os técnicos da Apremavi estão com boas expectativas em relação ao experimento. Como a área tem cobertura majoritariamente de gramíneas nativas, sem a presença significativa de espécies invasoras, as condições para germinação e desenvolvimento das plântulas são boas, e devem melhorar com a chegada do verão. Visitas de monitoramento serão realizadas nos próximos meses para acompanhar a evolução da restauração na área e mensurar o sucesso da germinação.

Se exitosa, a experiência poderá ser replicada e auxiliar na execução da meta ambiciosa do projeto: restaurar 7.000 hectares da Mata Atlântica, com ênfase na Floresta com Araucárias. O território de atuação do projeto abriga 107 Unidades de Conservação, 23 Quilombos, 47 Terras Indígenas e 220 Assentamentos de Reforma Agrária. Além de acelerar a restauração em áreas onde o plantio não é viável – por dificuldades de acesso às mudas e insumos, por exemplo – essa metodologia pode reduzir custos e incentivar a cadeia de coleta de sementes, uma das formas de diversificação das atividades econômicas em pequenas propriedades e comunidades. 

 

Registros da semeadura direta em Urubici - SC
Equipe técnica da Apremavi realizando a semeadura na área piloto, em Urubici. Fotos: Gabriela Goebel e Thamara Santos de Almeida.
Em 2023 a Apremavi iniciou a articulação de uma rede para coleta de sementes no Oeste de Santa Catarina, através do projeto +Floresta, buscando apresentar orientações sobre a coleta e adquirir sementes de qualidades para serem utilizadas em muvucas de sementes e também na produção de mudas do Viveiro Jardim das Florestas. Espécies como Guabiroba (Campomanesia xanthocarpa), Araucária (Araucaria angustifolia), Chal-chal (Allophylus edulis) e Pessegueiro-bravo (Prunus myrtifolia) são algumas com ocorrência na região e que possuem bons índices de germinação após o armazenamento, condição essencial para a viabilidade do plantio direto.

 

Muvuca de sementes
Guia da Muvuca, com as principais orientações sobre o plantio direto de sementes nativas. Figura: Reprodução Caminhos da Semente.
A maior iniciativa sobre semeadura direta no Brasil é a coalizão Caminhos da Semente, que reúne  pessoas e organizações com objetivo de dar escala à restauração ecológica no Brasil com foco no método de semeadura direta. A organização atua em cinco pilares para promover a capacitação, acesso à informação, promover inclusão e definir boas práticas para a coleta:
Capacitação: O objetivo geral é aumentar o número de técnicos capacitados para recomendar, implantar ou autorizar a semeadura direta;

Novos plantios: Busca-se garantir a efetividade da semeadura direta por meio de assistência técnica e acompanhamento de novas áreas com o método;

Sementes: Visa disponibilizar sementes para atender a demanda crescente para restauração, conectando produção (coletores) e mercado (clientes);

Normas: Destravar os principais gargalos legais para alavancar a semeadura direta;

Difusão de conhecimento: Foco em apoiar demais pilares do plano de ação com divulgação de informações concisas e atrair novos parceiros e interessados.

> Saiba mais sobre semeadura direta no guia da Caminhos da Semente

 

Autores: Vitor Lauro Zanelatto e Gabriela Goebel
Revisão: Carolina Schäffer
Foto de capa: Gabriela Goebel

Dia de Plantar: contribua com a Apremavi no Dia de Doar 2023

Dia de Plantar: contribua com a Apremavi no Dia de Doar 2023

Dia de Plantar: contribua com a Apremavi no Dia de Doar 2023

O Dia de Doar é um movimento para promover a generosidade. É uma mobilização que promove um país mais solidário, por meio da conexão de pessoas com causas. Neste ano, a Apremavi propõe o Dia de Plantar, gerando conexões entre doadores e organizações pela restauração ecológica no Brasil. 

Hoje, 28 de novembro, terça-feira, o Brasil está mobilizado pelo Dia de Doar: milhares de organizações estarão preparadas para receber doações, e milhões de brasileiros vão demonstrar seu apoio, doando e tornando pública a doação compartilhando a hashtag #diadedoar nas mídias sociais. No Brasil, o Dia de Doar foi realizado pela primeira vez em 2013, um ano depois da primeira edição, nos Estados Unidos, em 2012. Lá fora, o Dia de Doar tem nome de #GivingTuesday, que significa “terça-feira da doação”.

Como é um movimento, não é centralizado: a marca, os materiais, manuais, etc, são todos disponibilizados para que cada um que queira participar possa se apropriar e criar sua própria iniciativa. A Apremavi participa do movimento há algumas edições, e neste ano divulga sua campanha com o mote “Dia de Plantar”, destacando seu propósito e causa, onde são investidas as doações recebidas pela instituição: a restauração e conservação da Mata Atlântica!

Na Década da Restauração de Ecossistemas da ONU, aproveitamos o Dia de Doar para convidar nossa comunidade a colocar a mão na terra e plantar suas mudas nativas, fazendo crescer um futuro mais solidário e acolhedor para todas as formas de vida. Vamos juntos?

Alguns dos produtos disponíveis na Ecoloja Apremavi. Fotos: Arquivo Apremavi. 

Autor: Vitor L. Zanelatto
Revisão: Carolina Schäffer
Foto de Capa: Kalyakan/Adobe Stock – montagem da Equipe de Comunicação da Apremavi

A Prática que queremos ver:  o Código Florestal e a prevenção de ocupação em áreas de risco・Código Florestal na Prática

A Prática que queremos ver: o Código Florestal e a prevenção de ocupação em áreas de risco・Código Florestal na Prática

A Prática que queremos ver: o Código Florestal e a prevenção de ocupação em áreas de risco・Código Florestal na Prática

Cerca de um mês divide duas grandes enchentes enfrentadas pelo Vale do Itajaí (SC). Entre os pedidos de ajuda da população, os discursos sem o compromisso com soluções concretas do governo estadual e a narrativa de tragédia compartilhada na mídia, causa estranhamento o silêncio sobre aquilo que deveria ser a prioridade para promover a resiliência das cidades: a recuperação das Áreas de Preservação Permanente (APPs). 

A ameaça de inundações nas cidades do Vale do Itajaí – de modo especial o Alto Vale – é constante na vida dos moradores; muitos já viram o rio Itajaí-Açu ou algum de seus afluentes tomarem ruas, invadirem casas e comércios. Em uma dimensão imensurável, vidas humanas e não humanas são encerradas em cada novo episódio dessa crise socioambiental, e a falsa narrativa de que esta é uma realidade sem solução à região é corroída pela água, que chega mais intensa, em frequência e intensidade. Na enchente da última semana, algumas cidades da região registraram mais de 330 milímetros em 72 horas, indicando o extremo desequilíbrio de um Planeta em emergência climática, com consequências imediatas acentuadas pelo fenômeno El Niño

Para além de contabilizar os prejuízos e oferecer os necessários auxílios para a redução dos danos e traumas do evento extremo, é preciso um projeto dedicado à mitigação dos efeitos das enchentes e enxurradas no Alto Vale, buscando elaborar um planejamento sensível à urbanização das cidades, com respeito ao regramento ambiental, promoção de planos diretores que não estimulem a ocupação em áreas vulneráveis, o oposto do que tem sido observado em muitas cidades do estado. O conjunto de ações necessárias é complexo e certamente oneroso, mas torna-se irrisório quando posto ao lado dos prejuízos quiçá bilionários na soma entre o prejuízo das famílias, comércios e indústrias.

Registros da enchente no Alto Vale em nov/2023. Código Florestal na Prática

Registros das consequências enchente do Alto Vale em novembro de 2023. Fotos: Carolina Schäffer. 

#Na prática: O Código Florestal e a prevenção de ocupação em áreas de risco

O Código Florestal estabelece parâmetros claros para evitar a ocupação humana em áreas ambientalmente sensíveis, sujeitas a riscos de enchentes ou deslizamentos. É papel do Poder Público (Federal, Estadual e Municipal) estabelecer outras restrições necessárias, caso seja necessário. Projetos de planejamento ambiental e urbanismo para as cidades devem estar no centro do debate para soluções efetivas às constantes enchentes, junto da preservação das APPs e de estratégias para a desocupação das áreas de maior vulnerabilidade. 

A função das APPs é voltada não apenas à dimensão ambiental, mas também para a proteção dos espaços de relevante importância para a conservação do território, como as condições geológicas e a proteção do solo, e assim assegurar o bem-estar das populações humanas. 

Entre outras, o regramento ambiental prevê a proteção das seguintes áreas vulneráveis: 

Margens de rios – APP, com proteção mínima de 30 metros em cada margem para rios com até 10 metros de largura, variando até 500 metros no caso de grandes rios. 

Topos de morros, montes, montanhas e serras – APP no terço superior da elevação. 

Encostas entre 25 e 45 graus – áreas de uso limitado, onde se permite apenas manejo florestal seletivo e sustentável.

A interferência humana nessas áreas por vezes promove retificações e canalizações de cursos d’água, dificultando o fluxo em caso de subida dos rios e formando verdadeiros barramentos temporários, forçando a água a procurar outros caminhos e, por consequência, atingindo áreas marginais maiores. Nessas situações a velocidade da água pode ser aumentada e o potencial de destruição ampliado. 

Após os eventos extremos com deslizamentos de terra na região serrana no Rio de Janeiro (2011), uma equipe do Ministério do Meio Ambiente estudou minuciosamente as condições das áreas afetadas. Wigold B. Schäffer, um dos autores, destaca a principal conclusão do relatório produzido: “92% dos deslizamentos que ocorreram naquela ocasião tinham alguma intervenção humana, seja pela construção de moradias, estradas e terraplanagem para construção, entre outras. Apenas 8% dos deslizamentos ocorreram em áreas com vegetação nativa bem conservada”.

Eventos similares foram registrados em cidades do RJ em 2015 e 2022 com um número de mortos que chega às centenas. 

Essa ligação entre ocupações irregulares em áreas de risco e Áreas de Preservação Permanente e a potencialização dos desastres foi constatada por uma pesquisa desenvolvida por Juarez Aumond, professor da Fundação Regional de Blumenau (FURB), por conta dos eventos extremos ocorridos no Vale do Itajaí em 2008: “as alterações promovidas pelo homem na natureza foram um dos fatores determinantes dos deslizamentos ocorridos na região do Vale do Itajaí. Dois estudos apontaram um índice médio de que 85% das áreas atingidas por deslizamentos tiveram o dedo da ação humana. Isso demonstra que a maioria das pessoas que perderam suas vidas e seus pertences, moravam em áreas de risco”, conforme consta na publicação de 2009 da Apremavi o Boletim Santa e Frágil Catarina.

> Confira a publicação Áreas de Preservação Permanente e Unidades de Conservação X Áreas de Risco

Santa e Frágil Catarina: em 2009 a Apremavi elaborou um levantamento sobre a degradação das Áreas de Preservação Permanente em SC e a relação com os eventos extremos que o estado frequentemente enfrenta. Fotos: Miriam Prochnow. 

Implantando o Código Florestal

É um projeto que tem como objetivo geral reverter e reduzir a perda de florestas no Brasil. É executado por um consórcio de organizações que integram o Observatório do Código Florestal, sob a coordenação dos Amigos da Terra Amazônia. A Apremavi é uma das organizações que compõem o consórcio, e está atuando para através da produção de conhecimentos, realização de articulação com governos locais e com agentes públicos para a implementação plena do Código Florestal.

> Conheça  o projeto Implantando o Código Florestal

Autores: Vitor Lauro Zanelatto e Miriam Prochnow
Revisão:
Carolina Schäffer e Thamara Santos de Almeida
Foto de capa:
Carolina Schäffer 

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